A semana que começou com Michel Temer passando a mão na cabeça de Romero Jucá e demonstrando, de um lado, condescendência com acusações de corrupção contra aliados e, de outro, paúra da capacidade de mobilização de Lula e do PT, só poderia terminar com um episódio como o que contrapôs o ministro Geddel Vieira Lima e o agora ex Marcelo Calero.
Parafraseando Chico Buarque, o tempo passou na janela, e só Temer e seus principais aliados no Planalto e no Congresso não viram. No Brasil pós-Lava Jato, vai-se mostrando impossível conviver com tráfico de influência explícito como o praticado por Geddel, tentativas de moldar as leis às conveniências dos investigados, como as praticadas na Câmara e no Senado, e manobras para o tapetão, como a tentada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para buscar uma reeleição que não lhe é facultada.
EFEITO EDUCATIVO – O desassombro com que Calero deu uma entrevista para contar em detalhes algo que pré-Lava Jato ficaria restrito aos bastidores, mostra que grampos, delações e prisões de poderosos tiveram, sim, um efeito educativo sobre a política brasileira, e que há quem se importe em preservar honra e currículo de máculas que outros das antigas gerações tratam com desdém.
Temer parece alheio ao trem da história: mesmo no fim de semana, os assessores mais próximos do presidente garantiam que Geddel não fez nada demais, e fica onde está. Mais: o fato de a pressão não ter surtido resultado seria ponto a favor do governo. Vida que segue. A conferir.
PEC DO TETO – Mesmo admitindo desgaste na articulação política com as acusações desferidas por Calero sobre Geddel, o Planalto não acredita que o episódio tenha peso suficiente para impedir a aprovação da proposta de emenda constitucional que fixa o teto de gastos do setor público em primeiro turno. O placar estimado continua de ao menos 60 votos a favor da limitação. Mas, pelo sim, pelo não, a reforma da Previdência só vai para a Câmara depois que a primeira votação tiver acontecido.
ANISTIA AO CAIXA 2 – Diante da dificuldade de chegar a um texto que permita colocar a anistia ao caixa 2 no texto que tipifica o crime na lei penal, os deputados podem tentar outra abordagem: modificar a legislação eleitoral para permitir declarações de recebimento de “recursos não contabilizados”, para usar a definição eternizada por Delúbio Soares, por meio da abertura de novos prazos para retificação das prestações de contas.
24 de novembro de 2016
Vera Magalhães
Estadão
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