"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 10 de novembro de 2015

MARIANA, TRÊS DIAS DEPOIS: JÁ TEM ALGUÉM PRESO?} QUE MEDIDAS JUDICIAIS FORAM TOMADAS?



E a poluição segue pelo Rio Doce, atingindo outras cidades















Que quase toda a cidade de Mariana e outros distritos desapareceram do mapa, já sabemos. Que um gemido de dor, angústia, desesperança e tristeza bate forte no coração das vítimas e de todos nós, já sentimos. Que os bombeiros, a prefeitura, pessoal da área médica e voluntários estão agindo sem parar, os noticiários das televisões mostram. Que os desabrigados estão perdidos, sem rumo, sem casa e pertences, é notório e óbvio… E a Polícia? E a Justiça? Que medidas tomaram?
A pergunta se justifica, porque até agora, da parte destas referidas instituições, não se tem a menor notícia do que fizeram. E se tivessem feito, é evidente que seria notícia.  A manchete de hoje do O Globo é “Avalanche em Mariana: Lama ameaça captação de água para 500 mil pessoas. Cidades de Minas e Espírito Santo paralisam abastecimentos e escolas são fechadas”. São consequências da tragédia. Nada mais do que isso.
FLAGRANTE E PRISÃO
Por que ninguém ainda foi preso? Crime ambiental dá 5 anos de reclusão (Lei 9.605/98). Envenenamento de água potável, de uso comum ou particular, dá 15 anos também de reclusão (Código Penal, artigo 270). Corromper ou poluir água potável, de uso comum ou particular, tornando-a imprópria para o consumo ou nociva à saúde, dá 5 anos também de reclusão (Código Penal, artigo 271). Quando as penas são de reclusão significa dizer que os crimes não são afiançáveis.
Que houve crime(s), houve. Que persiste o estado de flagrância, persiste. Que a causa da tragédia foi o rompimento da barragem da mineradora, não há dúvida. Que a mineradora tem presidência e diretoria, é claro que tem. Está na lei. Está no seu contrato social ou em seus estatutos. Eles até dão entrevistas… mas em liberdade, quando deveriam estar presos.
A IMPORTÂNCIA DA IMEDIATA PRISÃO
As prisões imediatas de autores e/ou responsáveis por crime(s) é de suma utilidade e importância. Provisória, preventiva ou em flagrante, as prisões imediatas além de garantirem a aplicação da lei, possibilitam à Justiça obter, do autor ou responsável, a colheita de depoimento na sua mais autêntica originalidade, sem a intervenção de terceiros, sem prévia orientação para o encobrimento da verdade dos fatos, sem distorção, ocultação, tapeação…
Rara vez a pessoa imediatamente presa deixa de contar o que sabe, como tudo aconteceu e porque aconteceu. Mas para isso é preciso que a Justiça seja rápida. A demora só traz benefício para o culpado e prejuízo para a realização da própria Justiça e para as vítimas. Não apenas as prisões imediatas são necessárias para o descobrimento da verdade e para a aplicação da lei penal. As medidas judiciais de indisponibilidade de bens móveis e imóveis, bloqueio de contas bancárias e outras de igual peso e sentido, se tornam urgentes.
Se houver retardo da Justiça, o responsável aliena seu patrimônio. E para anular a alienação depois, qualquer ação revocatória ou pauliana (destina-se a anular alienação de bens em fraude a credores) tem prazo curto para ser proposta e leva muitos anos para terminar. Enquanto isso, as vítimas experimentam outros sofrimentos.
PRECEDENTE EXEMPLAR NO RIO
Aqui no Rio, em março de 1993, dois jovens morreram no interior do Maracanãzinho. Depois da apresentação de uma banda de rock, muitos deixaram a arquibancada e foram para a quadra. Marcelo e Fernando, ao pisarem no compensado que cobria a entrada de um dos túneis de acesso ao vestiário, a frágil madeira partiu e os dois amigos caíram no “fosso” de 3 metros de profundidade e que estava todo alagado. Marcelo morreu eletrocutado. Fernando, afogado.
Um ou dois dias depois a Juíza Maria Helena Salcedo da 24 Vara Criminal (hoje, desembargadora do TJ/RJ) decretou a prisão do administrador do Maracanãzinho, ao saber que o delegado titular da 18a. DP apenas havia instaurado inquérito com prazo de 30 dias. “Em 30 dias um homicídio pode transformar-se até em suicídio”, escreveu a juíza na decisão decretatória da prisão.
Da longa decisão, esta outra passagem: “Chega de impunidade. Todos nós temos sede de Justiça, e certas providências, se tardias, conduzem à injustiça, no máximo a uma meia justiça que mancha, induvidosamente, o Poder Judiciário”. E ainda decidiu a então Juíza Maria Helena Salcedo: “Urge que o administrador do Maracanãzinho seja afastado de suas funções prestando imediato esclarecimento à Justiça. O remédio legal é, na hipótese, a prisão preventiva para assegurar a aplicação da lei penal, conforme determina o artigo 312 do Código de Processo Penal. Expeça-se mandado de prisão para ser cumprido ainda hoje e ainda hoje, 18.3.93, a partir das 17 horas, que venha o preso à minha presença prestar esclarecimentos”.
PRECEDENTE DO EXTERIOR
Na França, o tragédia, em 5.5.1992, do Estádio Furiani (Ilha da Córsega) não ficou barata. Antes da partida entre Bastia e Marselha, parte da arquibancada veio ao chão: 18 mortos e 2357 feridos. O desastre ocorreu no início da tarde. E à noite a Justiça da França mandou prender Jean François Fellipe, presidente do Bastia, dono do Estádio Furiani. E também mandou imediatamente investigar a responsabilidade de outro presidente, Jean Fourne Fayard, da Federação Francesa de Futebol.
Por outro lado, o ministro dos Negócios Sociais da França, naquela mesma noite, deu ordem para que a Caixa Nacional de Seguros garantisse toda assistência às vítimas, com o imediato pagamento das indenizações e que depois deveriam ser cobradas do Bastia e de seu presidente Jean François.
E A JUSTIÇA DE MARIANA?
E a Justiça de Mariana o que até agora já fez? Que decisão (ou decisões) tomou para garantir que a verdadeira causa (ou causas) da tragédia seja descoberta? Que medidas assinou para garantir o pagamento das indenizações às vítimas? Já determinou o bloqueio das contas das mineradoras, de sua diretoria-responsável, e a indisponibilidade de bens de todos eles, mineradora e dirigentes? Alguém já foi preso e ouvido pelo juiz da comarca?
Espero estar completamente errado do que estou indagando – e se tanto estiver, que informe –, porque se as medidas aqui reclamadas ainda não foram tomadas, a cada dia de espera a aplicação das leis, penal e civil, ficará mais difícil de ocorrer. Os vitimados sofrerão outro duro golpe, desta vez pela inoperância do Judiciário. Tomara que eu esteja errado.

10 de novembro de 2015
Jorge Béja

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