LÍDER OPOSICIONISTA DA VENEZUELA PRESO. PROCURADOR DENUNCIA A FARSA.
Manuela López, filha mais velha do líder opositor Leopoldo López (ao fundo) foi quem desencadeou a crise de consciência do procurador venezuelano (Reprodução/Twitter)
|
O procurador federal venezuelano Franklin Nieves - que fugiu da Venezuela no dia 19 de outubro depois de, segundo ele, viver uma crise de consciência - revela os detalhes da perseguição política que levou o opositor Leopoldo López para cadeia em fevereiro de 2014. Nievez revela como o governo da Venezuela atuou para forjar provas que levaram López a ser condenado a mais de treze anos de prisão. Por telefone, ele concedeu a VEJA.com a entrevista a seguir:
Dilma recebeu recentemente no Palácio do Planalto o chefete comunista da Venezuela, Diosdado Cabello, que articulou a prisão do líder oposicionista Leopoldo Lopez. Cabello é amigo íntimo de Lula, Dilma e seus áulicos. Abaixo López em sua cela solitária na prisão militar de Ramo Verde em fotograma de vídeo da CNN que pode ser visto aqui. |
O senhor afirma que Leopoldo López foi condenado com provas falsas. Como elas foram forjadas? Quatro dias antes dos distúrbios que foram atribuídos a Leopoldo López, eu fui enviado para o estado de Táchira (em 8 e 10 de fevereiro de 2013). Tínhamos a informação de que López estaria lá. A ordem que me deram era de prendê-lo e apresentá-lo à Justiça. Mas ele não apareceu. Oito dias depois, quando fui chamado em minha casa para me dirigir ao Serviço Bolivariano de Inteligência (Sebin), ficou claro que não havia sequer uma ordem formal de captura contra Leopoldo López. Somente depois que alertei sobre isso, um agente da Sebin, conhecido como Elefante, redigiu uma peça de ficção que foi a ordem de apreensão. E o relatório da prisão foi escrito pelo próprio Diosdado Cabello. Desde o início tudo foi construído, forjado.
Franklin Nieves, o procurador venezuelano que denunciou a montagem do esquema que levou Leopoldo Lopez ser condenado a 13 anos de cadeia. |
Como o senhor recebeu a notícia de que atuaria neste caso? Foi o pior castigo que me deram na vida. Eu estava prestes a ser aposentado, mas acabei escravizado por este caso. Muitas vezes eu disse ao meu chefe que me tirasse e me enviasse para o outro estado. Mas meu diretor, Nelson Mejía, disse que eu considerasse o trabalho como um prêmio. Se eu recusasse a causa, me transformaria em inimigo do regime. Mesmo se evocasse o direito que me era reservado por lei de renunciar à causa, não seria atendido. Eles sabiam que eu sabia demais e poderia me converter em opositor do estado. O simples fato de querer ficar fora levantaria suspeitas e eu passaria a ser perseguido.
Se o senhor tivesse fugido e revelado antes essas fraudes, acredita que a história poderia ter tomado um rumo diferente? De forma alguma. Porque se eu me retirasse, um outro procurador teria sido designado para fazer o mesmo serviço. Alguém teria cumprido a ordem.
O que o levou a mudar de ideia? Era um peso que eu trazia em minha consciência. Todos os dias, eu podia levar a minha filha para escola. Ia com minha esposa. Mas Leopoldo e sua esposa não podiam. Quem acompanhava a filha do casal era sempre uma pessoa estranha. Um empregado. Não queria mais ver essa situação se prolongar. Eu havia colaborado para que o seu pai estivesse preso. A mãe, por sua vez, viajava o tempo todo em busca de apoio para libertar o marido e reverter a terrível situação da qual fiz parte.
O senhor tem convocado os juízes e demais procuradores a se rebelar. Acredita nisso? Na Venezuela não se pode falar. Não há liberdade. Se alguém abre a boca, vai preso. Não fiz nada antes por medo. Mas espero que meus colegas possam se libertar.
Como o senhor saiu da Venezuela? Foi como uma viagem pessoal. Fui a uma agência de viagens e comprei as passagens para minha família. Custaram 121 000 bolívares (cerca de 300 dólares) para mim, minha esposa e nossas duas filhas. Não é nada. Fui de Caracas para Aruba. Depois segui para Miami e agora estou na casa de amigos.
Desde que a sua fuga se tornou pública muitas histórias foram difundidas. Entre ela, a de que antes de sair da Venezuela o senhor estava em negociação com agências americanas como a DEA e o FBI. Procede? Não é verdade. Algumas autoridades já me procuraram, mas só nos Estados Unidos. Eu não mantive nenhum contato prévio antes de sair de meu país. Também é mentirosa a história de que eu desviei documentos. Falaram que havia trazido comigo algo como 80% dos expedientes de minha procuradoria. Isso é totalmente falso. Uma invenção do governo para me colocar sob suspeita e iniciar uma investigação. Certamente montarão algo falso para me acusar.
O senhor sofreu alguma ameaça? Claro. Eu sabia que iriam me desprestigiar depois de minhas revelações. E houve ameaças. Invadiram minha casa, já reviraram meu escritório, invadiram o apartamento de minha esposa em Forte Tuna e o escritório dela. Até as companheiras de trabalho foram ameaçadas em interrogatórios arbitrários em busca de informações contra nós. Meu pai, minha mãe e irmão, que vivem na Venezuela, já foram procurados por agentes do governo. Eu me mantenho firme nesta situação, apesar de intimidarem meus familiares. Decidi contar a verdade e é isso que vou fazer aqui.
O senhor se considera culpado? Se fizerem uma investigação, certamente eu serei responsabilizado. Estou disposto a isso a passar por um processo imparcial. Se for para a Venezuela agora, serei preso e condenado assim que desembarcar. Nos Estados Unidos, sei que a justiça poderá ser feita de forma isenta. Mas já tenho a prisão perpétua, que é minha consciência.
10 de novembro de 2015
Nenhum comentário:
Postar um comentário