DIVULGAÇÃO DO BALANÇO DA PETROBRAS MAIS PARECEU MISSA DE RÉQUIEM EM MEMÓRIA DA EX-GRANDE EMPRESA
Foi melancólica a entrevista coletiva da alta cúpula da Petrobras que reuniu, ontem, a imprensa nacional e internacional para divulgar o Balanço Final da estatal do ano de 2014. A TV GloboNews até que chegou a transmitir ao vivo. Mas não demorou muito, tanta era a lengalenga, que e a emissora dividiu a tela: à esquerda, a imagem sem som da exposição feita na sede da empresa e à direita, a apresentadora Leilane Neubarth entrevistando no estúdio um convidado economista. Foi triste.
No palco e sentados à mesa ladeando Bendine (atual presidente), 7 diretores da empresa. Semblantes fechados e contraídos. Um não olhava para o outro. Vez ou outra algum deles se mexia na cadeira ou fazia leve movimento com a cabeça. Todos estavam estáticos. Todos cabisbaixos. Todos abatidos. Intencionalmente ou não, foi fúnebre.
MILAGRE, VALORES E CRIME
Mas não era para ser diferente.Contritos e envergonhados, preconcebidamente ou não, eles estavam lá para explicar o rombo de R$ 21,6 bilhões que a estatal sofreu em 2014. Coube a Bendine abrir a exposição. Garantiu que desde ontem o milagre da moralidade e da lisura se operou na empresa. É garantia difícil, impossível mesmo, de merecer crédito, vez que a administração pública federal continua com o mesmo PT que dilacerou a empresa.
“A partir daqui a Petrobras volta a garantir a credibilidade de seu relacionamento com credores e investidores na apresentação dos valores da companhia”, disse Bendine. O substantivo “valor”, que o atual presidente empregou no plural (“valores da companhia”), é óbvio que não se refere ao símbolo, à importância histórica da Petrobras, para o Brasil e para o mundo. Nem muito menos ao tentos e feitos alcançados pela empresa ao longo da sua existência, que são valores sim, mas imateriais.
Aquela locução “valores da companhia” referiu-se a dinheiro, cifra, balanço-contábil, que a empresa havia apresentado antes, mentirosamente, e que, por causa disso – e sem levar em conta a corrupção – também destruiu a credibilidade da Petrobras perante credores e investidores. Essa é a tradução lógica. É uma confissão de culpa e da assunção de responsabilidades. E também da prática do crime, da administração passada, de falsidade ideológica previsto no artigo 299 do Código Penal,que pune com reclusão de 1 a 5 anos e multa quem “omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante”.
CAPITALIZAÇÃO DO DESFALQUE
Tanto é verdade que a alta cúpula da Petrobras reconheceu ontem que o prejuízo global de R$ 21,6 bilhões também decorreu “da baixa de gastos adicionais capitalizados indevidamente no âmbito da Operação Lava Jato (R$ 6,2 bilhões)”. E foi dito mais: “Que o 3º trimestre de 2014 foi apurado prejuízo de R$ 5,3 bilhões. A diferença em relação ao lucro líquido divulgado em 27.1.2015 de R$ 3,1 bilhões reflete a baixa de gastos adicionais capitalizados indevidamente no âmbito da Operação Lava Jato (R$6,2 bilhões)”. Ora, capitalizar é juntar e somar dinheiro. Então o volumoso desfalque foi contabilizado como se não tivesse ocorrido?
DIREITO DOS ACIONISTAS
Está previsto na Lei das Sociedades Por Ações (§§ 3º e 4º, artigo 159, Lei 6404/76) que o pressuposto para a propositura de ação de responsabilidade civil contra os administradores de sociedade anônima, quer pela própria sociedade, quer por acionista, é a deliberação prévia em assembleia, o que até o momento não se tem notícia ter ocorrido. Mas a dependência assemblear não é absoluta e impeditiva para que acionistas, individual ou coletivamente, entrem com ações reparatórias de danos contra seus ex-administradores, com o fim de obter o ressarcimento do prejuízo causado ao patrimônio social, seja por terem agido com culpa ou dolo, seja por terem violado a lei ou o estatuto, conforme decidiu a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao julgar o Recurso Especial nº 279.019, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, em 13.3.2001 e publicado no Diário de Justiça da União em 28.5.2001.
No caso da Lava Jato, os dirigentes, já identificados, processados, presos e sentenciados, agiram com dolo intenso e violaram a lei e o estatuto da Petrobras. Tudo isso, somado ao reconhecimento, público e oficial da responsabilização da empresa, tal como ocorreu na exposição de ontem no auditório da sua sede, é o suficiente e o bastante para que os acionistas prejudicados, no Brasil, nos Estados Unidos e em outro qualquer país, vençam suas ações reparatórias do dano. Não é preciso aguardar a convocação e realização de assembleia para este específico fim. Cada um deve agir por conta própria.
23 de abril de 2015
Jorge Béja
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