Teimosa, Madame é, sabendo-se que essa qualidade às vezes favorece e às vezes prejudica. Com o governo no fundo do poço, não faltam conselhos para ela ampliar o leque, convidar adversários e indiferentes, além de aliados, ouvindo mais do que falando e tirando dos diálogos as lições necessárias. Só que ela é dura na queda. Divide o mundo em duas metades, a dos mocinhos e a dos bandidos. Os que não estão com Dilma estão contra Dilma, parece esse o pensamento.
Tome-se ontem. Pela manhã, a presidente reuniu presidentes dos partidos de sua base, com os respectivos líderes parlamentares. O tema era premente, no caso, a importância de ser aprovado o ajuste fiscal, sem o qual, dizem, o país se desagregará. Mesmo tendo presente a reação de muitos de seus adeptos ao elenco de maldades preparado pelo ministro da Fazenda, tratou-se de uma reunião do óbvio. Nenhum presidente de partido ou líder de bancada ousaria, como ninguém ousou, criticar ou contrapor argumentos desfavoráveis às sugestões de Joaquim Levy, melhor dizendo, da Dilma.
A primeira pergunta que fica é por que não foram convidados, também, dirigentes de partidos desvinculados de seu governo, até oposicionistas? Só teria a ganhar, recebendo ponderações contrárias a seus pontos de vista, ainda que não se dispusesse a segui-las. Costuma ser improdutivo fazer do palácio do Planalto um Clube da Luluzinha, onde a anfitriã fala e os comensais elogiam a refeição.
GOVERNO AUTORITÁRIO
Mas tem mais, nessa demonstração de um governo autoritário e absolutista, que caminha para o precipício por nem querer escutar e até desprezar opiniões diferentes e divergentes.
A Constituição fornece remédios para se alargar a pauta de decisões monárquicas. Na Seção V do Capítulo II do Título IV, nos artigos de 89 a 91, foram criados o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional.
No primeiro, estabelecendo-se como um órgão superior de consulta do presidente da República, dele participam o vice-presidente, os presidentes da Câmara e do Senado, os líderes da maioria e da minoria na Câmara e no Senado, o ministro da Justiça e mais seis cidadãos natos, maiores de 35 anos, sendo dois indicados pelo presidente da República, dois eleitos pela Câmara e dois pelo Senado, todos com mandato de três anos, vedada a recondução.
Alguém tem notícia de a presidente Dilma haver sequer indicado ou solicitado a indicação desses ilustres cidadãos? Não será por falta de gente ilustre, capaz e acima de tudo experiente, em condições de assessorá-la e repartir com ela opiniões de alto valor. Certamente que não para pronunciar-se sobre a intervenção federal, o estado de defesa e o estado de sitio, opções que citadas, felizmente não se colocam. Mas para definir-se sobre “questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas”, por que não?
Vale o mesmo para o Conselho de Defesa Nacional, com a composição do Conselho da República acrescida dos ministros da Defesa, das Relações Exteriores, do Planejamento e dos comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica. São múltiplas suas competências ligadas à guerra, à decretação de estados emergenciais e à utilização de áreas indispensáveis à segurança do território nacional, como também a missão de estudar, propor e acompanhar o desenvolvimento de iniciativas necessárias a garantir a independência nacional e a defesa do estado democrático.
Não poderiam, as personalidades referidas, entender que o país atravessa situações onde a independência nacional e a defesa do estado democrático precisam de cuidados, encontrando-se sob risco? Certamente os integrantes do Conselho de Defesa Nacional contribuiriam para encontrar roteiros que nos livrariam da crise econômica, da inflação desmedida e do caos social já à vista de todos. Mas será preciso que Madame pare de continuar se imaginando detentora única de todas as verdades absolutas.
08 de abril de 2015
Carlos Chagas
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