TCU acusa Eletrobras de desviar recursos de fundo do setor elétrico para cobrir rombo de subsidiárias
De acordo com o Tribunal de Conta da União (TCU), a Eletrobras tem usado uma manobra considerada ilegal, usando recursos de um fundo do setor elétrico para bancar dívidas contraídas por suas distribuidoras e tapar rombos financeiros dessas estatais.Ainda segundo o TCU, a manobra foi constatada na gestão dos recursos da Reserva Global de Reversão (RGR) da companhia.
Criado em 1971, a RGR é um encargo do setor elétrico que tem como finalidade financiar projetos de expansão e de melhoria dos serviços à população, além de pagar indenizações a empresas e programas sociais de universalização, como o ‘Luz Para Todos’.
Empresas do setor elétrico recolhem anualmente uma taxa de até 2,5% do valor dos seus investimentos, limitada a 3% da receita anual. Essa cota é depositada numa conta corrente da Eletrobras, a quem cabe administrar os recursos. Em 2014, segundo o balanço financeiro da estatal, os valores da RGR somaram R$ 3,866 bilhões.
Após analisar o gerenciamento do fundo, o TCU concluiu que o encargo tem sido utilizado para a “renegociação de dívidas das empresas do grupo”, com a finalidade de “descaracterizar a inadimplência, de fato, das empresas de distribuição do sistema Eletrobras”. Os recursos seriam usados para bancar dívidas das seis distribuidoras da estatal, localizadas no Piauí, Rondônia, Acre, Amazonas, Alagoas e Roraima.
Ainda segundo o tribunal, ao pagar as contas com o dinheiro da RGR e repactuar dívidas antigas, a estatal consegue evitar a aplicação das sanções contratuais às suas distribuidoras e permite a continuidade do acesso aos recursos da RGR e da própria controladora. É flagrante o “desvio da finalidade original dos recursos” do fundo e “burla” ao que está estabelecido em lei, afirmam os auditores.
“O que vemos é que se trata de um fundo bilionário que tem sido usado sem os devidos critérios legais e sem atender à sua finalidade, o que resultou nesses problemas”, afirmou o ministro do TCU Raimundo Carreiro, relator do processo. “São empréstimos feitos para renegociação de dívidas de empresas falidas do grupo, apenas para dar sobrevida a elas e para permitir que acessem novos financiamentos.”
O uso da RGR é investigado desde 2012, quando o TCU determinou que todos os ex-dirigentes da Eletrobras prestassem esclarecimentos sobre a gestão do fundo. As audiências estão em andamento.
Segundo Carreiro, os recursos desviados seriam usados para bancar dívidas das seis distribuidoras da estatal, localizadas no Piauí, Rondônia, Acre, Amazonas, Alagoas e Roraima.
A aplicação dos recursos bilionários do fundo pela Eletrobrás também é alvo de fiscalizações da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que apontou irregularidades e impôs punição à estatal.
Em 2014, a Aneel abriu um processo administrativo contra a Eletrobrás, cobrando o ressarcimento de mais de R$ 2 bilhões ao caixa da RGR, por conta de “amortizações do saldo devedor de financiamentos não restituídos à RGR e a apropriação dos encargos financeiros do referido fundo durante o período de 1998 a 2011”, conforme está registrado no próprio balanço da Eletrobrás. Esse valor teria ainda de ser corrigido para valores atuais.
A Eletrobras entrou com recurso, alegando a “prescrição da pretensão de ressarcimento” e a “inexistência de prática de ato ilícito por ela própria e a boa-fé objetiva da administração dos recursos”. O processo está em andamento. Perguntada sobre as ilegalidades apontadas pelo TCU no uso do fundo, a estatal não se manifestou.
O TCU decidiu abrir, então, um novo processo para aprofundar as análises dos casos de inadimplência nos financiamentos concedidos pela empresa com os recursos da RGR. A Eletrobras terá de explicar prejuízos contabilizados em outros empréstimos ligados ao fundo, como o que fez à empresa Global Energia, que resultou em um prejuízo de R$ 85,3 milhões.
Vale ressaltar que os recursos bilionários do fundo foram fundamentais para o governo levar adiante o plano de renovação das concessões do setor elétrico, a partir de 2013. Por meio da Lei 12.783 (antiga Medida Provisória 579), foi estabelecido que os recursos da RGR poderiam ser usados para indenização total ou parcial dos investimentos ligados aos bens reversíveis e ainda não amortizados das concessionárias.
A lei isentou boa parte do setor elétrico do recolhimento anual das cotas da RGR. Desde 2013, as empresas de distribuição estão liberadas do pagamento. Concessionárias de geração e transmissão que concordaram com a proposta de renovação de contrato feita pelo governo também se livraram da conta, além de concessões de transmissão de energia feitas a partir de setembro de 2012. (Por Danielle Cabral Távora)
08 de abril de 2015
Danielle Cabral Távora
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