FV
21 de agosto de 2014
Vote certo, mas com cuidado
Nas eleições gerais de 2010, qualificaram-se 135 milhões de homens e mulheres com direito ao voto. No segundo turno da eleição presidencial, Dilma Rousseff foi a candidata vencedora com 54% dos votos válidos. O oposicionista José Serra ficou com 44% dos votos válidos. Chama a atenção o fato de 36% dos qualificados a votar optaram pela abstenção ou voto nulo e branco. Numero elevadíssivo. Resta indagar: seria desencanto, protesto ou renúncia à cidadania por descrença nos atores políticos.
Para as eleições de 2014, diferentes pesquisas vem mostrando que o fenômeno do voto nulo, branco e abstenção pode se repetir. Chama a atenção ser majoritariamente uma opção dos segmentos da população de maior renda e nível educacional médio e superior. Opera como determinante aglutinadora, a chamada antipolítica. De acordo com os seus pregadores seria uma intervenção cívica contra o poder, objetivando limitar o raio de ação governamental pela pressão ética dos cidadãos, enfrentando o mandonismo político partidário. A pregação da antipolítica e antipartidos vem alargando as suas fronteiras no Brasil.
Infelizmente a quase totalidade dos partidos brasileiros não abriga correntes de pensamento político. São instrumentos de barganha patrimonial, negociando a adesão sem pudor aos governos de plantão em nome da governabilidade. Ante essa realidade, a sociedade civil comete equívoco mortal, do se considerar baluarte da virtude diante de um Estado corrupto e clientelista. Ao enquadrar unilateralmente a corrupção estatal, ignoram que a sua causa determinante são os corruptores, na sua totalidade figuras preeminentes da chamada sociedade civil.
No Brasil dos dias atuais o voto nulo, branco o abstenção representa um formidável aliado dos governos de plantão. Com a agravante de ser uma plataforma política dos segmentos mais esclarecidos e bem informados. Exatamente aqueles que aos olhos da nação integram a opinião pública independente e crítica. Ao fazer a escolha de anular o voto expressam forte convicção de discordar das políticas públicas executadas pelos governos. Paradoxalmente pela atitude assumida, tornam-se aliados de quem exerce a administração pública em todos os níveis. No caso da República, a administração Dilma Rousseff deveria incluir no seu programa de governo forte apoio aos defensores do voto nulo, branco e abstenção. Em 2010 foi fundamenta para a sua eleição.
Por fim, quando parte da opinião pública esclarecida passa a acreditar que não precisa da política, relembremos Aristóteles. Na antiga Grécia, ele conceituava o homem como animal político, onde a ética pública não pode ser diferente da ética pessoal. A falta de espírito republicano no Brasil vem sendo o principal foco alimentador do desencanto de parcelas respeitáveis da opinião pública. Republicanizar a política será um caminho longo a se perseguir, prestigiando homens públicos íntegros e decentes, que são muitos, na imperativa missão de aperfeiçoamento do nosso futuro democrático.
No seu livro clássico “Origens do Totalitarismo”, Hannah Arendt, das maiores pensadoras do século XX, ensina: “A política, assim aprendemos, é algo como uma necessidade imperiosa para a vida humana e, na verdade, tanto para a vida do indivíduo, maior para a sociedade. Tarefa e objetivo da política é a garantia da vida no sentido mais amplo”. Vale dizer, mesmo deteriorada entre nós, a participação política é fundamental na vida da população.
Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de vários livros sobre a economia brasileira.
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