O mais provável é que o poder público pague mais caro que o correto
São unânimes dentro do poder público brasileiro as críticas à Lei Geral de Licitações. A 8666/93 é a “Geni” dos governantes, feita para apanhar por “engessar” a máquina administrativa com procedimentos ultrapassados, não abranger serviços inexistentes há duas décadas e se mostrar inócua no combate às práticas ilícitas.
Corroborando a visão do jurista Márcio Pestana quanto à “inapetência legislativa” do Brasil sobre contratações públicas, só agora entra na reta final a revisão da lei, com a inclusão do projeto de lei 559/2013 na pauta da sessão do Senado de 5 de agosto.
O projeto, porém, erra ao prever a perpetuação da “contratação integrada” de obras públicas. Nessa modalidade, o poder público — União, estados, Distrito Federal e municípios — licita uma obra apenas com um anteprojeto de arquitetura ou urbanismo. A empreiteira contratada fica com a responsabilidade de elaborar e desenvolver os projetos completo e executivo, as obras em si, os testes e demais operações necessárias para a conclusão do empreendimento.
No marco legislativo atual, a “contratação integrada” só pode ser usada em obras licitadas sob o polêmico Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), criado para as contratações de obras e serviços relacionados da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos, depois utilizado nos empreendimentos do PAC e vários outros.
Os dispositivos gerais do PLS 559/2013 revogam a lei que implantou o RDC, mas, paradoxalmente, institucionalizam de vez e ampliam o uso da ferramenta instituída justamente para viabilizar o regime. Em outras palavras, o fim do RDC é um sofisma.
Sem um projeto completo elaborado de forma antecipada e independente da contratação da obra, a administração não tem parâmetros para especificar orçamentos justos, determinar a qualidade do empreendimento, controlar prazos e saber o quanto gastará em sua manutenção.
Os defensores do projeto 559/2013 argumentam que também o construtor assumirá riscos, esquecendo-se que ele naturalmente irá embutir isso na matriz de custos de sua proposta. E, como o poder público não sabe qual é orçamento justo, o mais provável é que pague mais caro que o correto. E sem que se exclua de vez qualquer possibilidade de aditivos no decorrer da obra.
Uma das hipóteses é outro sofisma. Permitem-se reajustes “por necessidade de alteração de projeto ou das especificações para melhor adequação técnica aos objetivos da contratação”. Ora, como quem faz o projeto é o próprio construtor, será ele o maior interessado em propor mudanças, que o poder público terá que engolir a seco.
Não se trata apenas de discutir a ampliação do potencial de corrupção. O principal aspecto a ser enfatizado é que, com a “contratação integrada”, o poder público abdica de seu papel de planejador da infraestrutura do país, dos espaços e das edificações públicas das cidades, delegando para as empreiteiras a definição da qualidade do meio ambiente construído brasileiro. Será o reconhecimento da “inapetência do Estado” pelo planejamento. É isso que a sociedade quer?
São unânimes dentro do poder público brasileiro as críticas à Lei Geral de Licitações. A 8666/93 é a “Geni” dos governantes, feita para apanhar por “engessar” a máquina administrativa com procedimentos ultrapassados, não abranger serviços inexistentes há duas décadas e se mostrar inócua no combate às práticas ilícitas.
Corroborando a visão do jurista Márcio Pestana quanto à “inapetência legislativa” do Brasil sobre contratações públicas, só agora entra na reta final a revisão da lei, com a inclusão do projeto de lei 559/2013 na pauta da sessão do Senado de 5 de agosto.
O projeto, porém, erra ao prever a perpetuação da “contratação integrada” de obras públicas. Nessa modalidade, o poder público — União, estados, Distrito Federal e municípios — licita uma obra apenas com um anteprojeto de arquitetura ou urbanismo. A empreiteira contratada fica com a responsabilidade de elaborar e desenvolver os projetos completo e executivo, as obras em si, os testes e demais operações necessárias para a conclusão do empreendimento.
No marco legislativo atual, a “contratação integrada” só pode ser usada em obras licitadas sob o polêmico Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), criado para as contratações de obras e serviços relacionados da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos, depois utilizado nos empreendimentos do PAC e vários outros.
Os dispositivos gerais do PLS 559/2013 revogam a lei que implantou o RDC, mas, paradoxalmente, institucionalizam de vez e ampliam o uso da ferramenta instituída justamente para viabilizar o regime. Em outras palavras, o fim do RDC é um sofisma.
Sem um projeto completo elaborado de forma antecipada e independente da contratação da obra, a administração não tem parâmetros para especificar orçamentos justos, determinar a qualidade do empreendimento, controlar prazos e saber o quanto gastará em sua manutenção.
Os defensores do projeto 559/2013 argumentam que também o construtor assumirá riscos, esquecendo-se que ele naturalmente irá embutir isso na matriz de custos de sua proposta. E, como o poder público não sabe qual é orçamento justo, o mais provável é que pague mais caro que o correto. E sem que se exclua de vez qualquer possibilidade de aditivos no decorrer da obra.
Uma das hipóteses é outro sofisma. Permitem-se reajustes “por necessidade de alteração de projeto ou das especificações para melhor adequação técnica aos objetivos da contratação”. Ora, como quem faz o projeto é o próprio construtor, será ele o maior interessado em propor mudanças, que o poder público terá que engolir a seco.
Não se trata apenas de discutir a ampliação do potencial de corrupção. O principal aspecto a ser enfatizado é que, com a “contratação integrada”, o poder público abdica de seu papel de planejador da infraestrutura do país, dos espaços e das edificações públicas das cidades, delegando para as empreiteiras a definição da qualidade do meio ambiente construído brasileiro. Será o reconhecimento da “inapetência do Estado” pelo planejamento. É isso que a sociedade quer?
04 de agosto de 2014
Haroldo Pinheiro, O Globo
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