A disputa pelo Palácio do Planalto rolará como um grande espetáculo cênico. Um espetáculo teatral, circense, midiático. As personagens já são mais ou menos conhecidas, cujos atributos mostram que o que vem por aí é um espetáculo meramente cômico.
A protagonista, claro, é Dilma Rousseff. Do alto de um sorriso que faz a delícia dos caricaturistas, a presidente lembra a Mônica das revistinhas de Mauricio de Sousa. Dilma é a Mônica que cresceu, virou gente grande e manteve os dentinhos. Quando fica brava, empunha seu coelhinho pelas orelhas e ameaça atirá-lo no interlocutor. O coelhinho é Guido Mantega, Mercadante ou quem estiver à mão.
Os antagonistas são dois. Aécio Neves, com seu sorriso eleitoreiro, tão branco quanto uma porta de geladeira, ainda não levou nenhuma coelhada contundente. É o ex-menino do Rio que gosta de usar gravata. Quando fica bravo, ninguém acha que fala sério - no caso de Aécio, uma grande vantagem. Quanto a Eduardo Campos, seu sorriso é um par de olhos azuis. Como em terra de cego quem tem olho azul é governador de alta popularidade, Campos tem passado incólume aos coelhos que voam. A toda hora, irrita a protagonista, mas sabe desconcertá-la. Quando fica bravo, amansa bem rápido - não brigará com possíveis aliados de segundo turno, que podem ser uns quaisquer ou qualquer uma.
Se a campanha eleitoral for mesmo uma encenação picaresca, ganhará quem souber trafegar no meio do circo sem exagerar na palhaçada. No picadeiro, o palhaço é indispensável, mas nunca é o herói. Sairá vencedor aquele que conviver bem com as piadas sem sucumbir a elas. O vitorioso poderá ser qualquer um dos três, embora a protagonista comece o espetáculo desfrutando indiscutível favoritismo.
A corrida presidencial também poderá rolar como espetáculo trágico. Aí, ganhará no final aquele que não morrer no meio, quer dizer, aquele que não se estatelar no ridículo ou no descrédito total, aquele (ou aquela) que não se queimar completamente.
Elementos que prenunciam a tragédia não faltam. Se o Brasil perder a Copa, teremos a possibilidade de enredo menos picaresco. Se os canarinhos forem mal, a narrativa política ganhará doses pesadas de frustração, mágoa, ressentimento, raiva e, quem sabe, revolta. É bom ficar atento a isso (os marqueteiros não pensam em outra coisa).
Em 2014, o palanque eleitoral será o desdobramento dos estádios de futebol. Mais ainda: será o prolongamento das ruas ocupadas pelos torcedores que não têm dinheiro para comprar ingressos. As eleições, portanto, devem vibrar na mesma frequência do final da Copa. O humor nacional estará nessa frequência.
A Copa e as eleições serão apresentadas na linguagem do entretenimento. Na mesma TV que mostrará os jogos, os candidatos aparecerão pedindo votos, embalados por musiquinhas melosas, com pose de gente boazinha, patriótica, abnegada. A mesma exaltação ufanista que embalará o show futebolístico estará presente no horário eleitoral, inteiramente moldado pela escola da melhor e da pior publicidade. Os chavões de Brasil grande, Brasil acolhedor, Brasil ecumênico, Brasil pacífico e Brasil feliz abarrotarão os pronunciamentos iniciais dos partidos. Agora, se a Seleção fracassar, se der vexame, bem, o roteiro terá de ser outro. Principalmente para quem é da situação. Vai ser interessante.
Não é só. Uma derrota no gramado será fichinha perto de um horizonte ainda mais tenso: o crescimento dos protestos de rua. Se as manifestações ficarem mais volumosas do que estão agora (elas estão voltando às praças públicas), aí, sim, poderemos nos despedir das esperanças de uma reles comédia eleitoral. Se a campanha presidencial tiver de conviver com multidões nas ruas, não apenas para bater palmas para a protagonista e seus dois antagonistas, mas para protestar contra a gastança de dinheiro público nos estádios, contra as mazelas da educação, contra a selva-geria da tropa de choque, contra o descalabro da saúde pública e contra a roubalheira generalizada, o bicho vai pegar. O debate nacional terá menos efeitos especiais, menos musiquinhas idiotinhas e mais gosto de tragédia. Terá, talvez, um pouco mais de autenticidade.
Não que alguém aqui esteja torcendo para o Brasil perder a Copa. Essa torcida virá depois, talvez. Por ora, basta torcer por uma campanha eleitoral menos maquiada. Às vezes um destino trágico é o destino de quem tem um encontro marcado com sua verdade, sem esconder nada. Pense bem: esse encontro não faria mal ao Brasil.
A protagonista, claro, é Dilma Rousseff. Do alto de um sorriso que faz a delícia dos caricaturistas, a presidente lembra a Mônica das revistinhas de Mauricio de Sousa. Dilma é a Mônica que cresceu, virou gente grande e manteve os dentinhos. Quando fica brava, empunha seu coelhinho pelas orelhas e ameaça atirá-lo no interlocutor. O coelhinho é Guido Mantega, Mercadante ou quem estiver à mão.
Os antagonistas são dois. Aécio Neves, com seu sorriso eleitoreiro, tão branco quanto uma porta de geladeira, ainda não levou nenhuma coelhada contundente. É o ex-menino do Rio que gosta de usar gravata. Quando fica bravo, ninguém acha que fala sério - no caso de Aécio, uma grande vantagem. Quanto a Eduardo Campos, seu sorriso é um par de olhos azuis. Como em terra de cego quem tem olho azul é governador de alta popularidade, Campos tem passado incólume aos coelhos que voam. A toda hora, irrita a protagonista, mas sabe desconcertá-la. Quando fica bravo, amansa bem rápido - não brigará com possíveis aliados de segundo turno, que podem ser uns quaisquer ou qualquer uma.
Se a campanha eleitoral for mesmo uma encenação picaresca, ganhará quem souber trafegar no meio do circo sem exagerar na palhaçada. No picadeiro, o palhaço é indispensável, mas nunca é o herói. Sairá vencedor aquele que conviver bem com as piadas sem sucumbir a elas. O vitorioso poderá ser qualquer um dos três, embora a protagonista comece o espetáculo desfrutando indiscutível favoritismo.
A corrida presidencial também poderá rolar como espetáculo trágico. Aí, ganhará no final aquele que não morrer no meio, quer dizer, aquele que não se estatelar no ridículo ou no descrédito total, aquele (ou aquela) que não se queimar completamente.
Elementos que prenunciam a tragédia não faltam. Se o Brasil perder a Copa, teremos a possibilidade de enredo menos picaresco. Se os canarinhos forem mal, a narrativa política ganhará doses pesadas de frustração, mágoa, ressentimento, raiva e, quem sabe, revolta. É bom ficar atento a isso (os marqueteiros não pensam em outra coisa).
Em 2014, o palanque eleitoral será o desdobramento dos estádios de futebol. Mais ainda: será o prolongamento das ruas ocupadas pelos torcedores que não têm dinheiro para comprar ingressos. As eleições, portanto, devem vibrar na mesma frequência do final da Copa. O humor nacional estará nessa frequência.
A Copa e as eleições serão apresentadas na linguagem do entretenimento. Na mesma TV que mostrará os jogos, os candidatos aparecerão pedindo votos, embalados por musiquinhas melosas, com pose de gente boazinha, patriótica, abnegada. A mesma exaltação ufanista que embalará o show futebolístico estará presente no horário eleitoral, inteiramente moldado pela escola da melhor e da pior publicidade. Os chavões de Brasil grande, Brasil acolhedor, Brasil ecumênico, Brasil pacífico e Brasil feliz abarrotarão os pronunciamentos iniciais dos partidos. Agora, se a Seleção fracassar, se der vexame, bem, o roteiro terá de ser outro. Principalmente para quem é da situação. Vai ser interessante.
Não é só. Uma derrota no gramado será fichinha perto de um horizonte ainda mais tenso: o crescimento dos protestos de rua. Se as manifestações ficarem mais volumosas do que estão agora (elas estão voltando às praças públicas), aí, sim, poderemos nos despedir das esperanças de uma reles comédia eleitoral. Se a campanha presidencial tiver de conviver com multidões nas ruas, não apenas para bater palmas para a protagonista e seus dois antagonistas, mas para protestar contra a gastança de dinheiro público nos estádios, contra as mazelas da educação, contra a selva-geria da tropa de choque, contra o descalabro da saúde pública e contra a roubalheira generalizada, o bicho vai pegar. O debate nacional terá menos efeitos especiais, menos musiquinhas idiotinhas e mais gosto de tragédia. Terá, talvez, um pouco mais de autenticidade.
Não que alguém aqui esteja torcendo para o Brasil perder a Copa. Essa torcida virá depois, talvez. Por ora, basta torcer por uma campanha eleitoral menos maquiada. Às vezes um destino trágico é o destino de quem tem um encontro marcado com sua verdade, sem esconder nada. Pense bem: esse encontro não faria mal ao Brasil.
03 de fevereiro de 2014
Eugenio Bucci, Revista Época
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