"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 1 de dezembro de 2013

UUUUUUUU...


Vovó, você se lembra da sua

primeira vez?

- Primeira vez o que, minha filha?

- Que fez sexo.

- Uuuuuuuu...

- Faz tanto tempo assim?

- Espera que eu ainda não terminei. Uuuuuuuuuu...

- Foi com quem?

- Um cadete. Ele ia ser mandado para o front no dia seguinte e disse que queria levar com ele a lembrança da nossa última noite juntos. Não pude recusar. Dali a duas semanas recebi a notícia de que ele tinha morrido.

- Que front era esse, vovó?

- O front. Da guerra. Não me lembro qual delas. Fiquei chocada com a notícia e me internei num convento, onde fiquei pelo resto da vida.

- Vovó, você viveu num convento?

- Não vivi? Espera um pouquinho. Acho que estou misturando as coisas. Isso foi um romance que eu li. Ó cabeça.

- Então, quem foi o primeiro?

- O primeiro o quê?

- Com quem você fez sexo, vovó.

- Uuuuuuuuu... Deixa ver. Como era o nome dele... Gilbert qualquer coisa. Gilbert Roland!

- Acho que esse era um ator.

- Não, não, não. Era nosso vizinho. Nos encontrávamos no fundo do quintal, sob a goiabeira. Até hoje não posso sentir cheiro de goiaba que me lembro do Gilbert Roland. Foi o primeiro e o único. Nunca mais amei ninguém.

- Vovó. Você casou com o vovô. Teve cinco filhos com o vovô. Você amava o vovô.

- Tudo fingimento.

- E há quanto tempo você não faz sexo?

- Uuuuuuuuuuu...

- Com quem foi a última vez?

- Eu já era viúva. Um dia bateram na porta. Era o Juan Carlos da Espanha. Na época ele ainda era príncipe. Tinha errado de porta, estava procurando não sei quem. Mandei entrar e começamos a conversar. Assuntos gerais. Ele pediu para ver o meu quarto... E aconteceu. Nunca mais nos vimos. Mas ele não deixa de me escrever.

- Vovó, você tem cartas do rei Juan Carlos da Espanha?

- Estão por aí, em algum lugar.

- E são cartas amorosas?

- Uuuuuuuuuuuu...

 
01 de dezembro de 2013
Luís Fernando Veríssimo, O Estado de S Paulo

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