Esses brasileiros são como filhos de novela, do tipo que rejeita a mãe. Embora o tempo presente os condene, veem-se como corregedores do passado. Incapazes perante o futuro, dedicam-se a amaldiçoar os que vieram antes.
Obviamente, serão sucedidos por aqueles que os amaldiçoarão.
O século 20, leitor amigo, jogou o Brasil num torvelinho de lamúrias e malquerenças, num imprescritível ajuste de infinitas contas.
Há alguns anos, conversando aqui em Porto Alegre com destacado empresário mexicano, num evento da ADCE, perguntei a ele sobre a situação dos astecas na contemporânea sociedade de seu país. Meu interlocutor era um homem alto, desempenado.
Com sua tez avermelhada faria bom papel representando um índio do oeste norte-americano em filmes da década de 50. Olhou-me surpreso e respondeu com outra pergunta: “E eu tenho cara de espanhol?”. Não, ele não tinha cara de espanhol, nem eu tinha mais perguntas a fazer. Fui. Serviu-me a lição e a tenho sempre em mente quando se fala sobre a questão do índio e do negro no Brasil.
Estimam os estudiosos, sabe-se lá como, que havia cerca de 3 milhões de índios por estas bandas, no ano do Descobrimento. Hoje restam 896 mil “puros”, contados e recontados. Isso é bom ou ruim? O Brasil é um país por todos os motivos destinado à miscigenação.
E o pequeno número de índios puros é, ainda assim, certamente maior do que o número de portugueses da gema.
Percorre-se o Brasil e é visível, onde se vá, a existência de dezenas e dezenas de milhões de caboclos, cafuzos, mulatos.
São empresários, acadêmicos, jornalistas, artistas, operários, agricultores, integrados à nação e expressando sua realidade social. Numa sessão do Congresso Nacional, em dia de votação importante, a câmera da tevê passeia sobre um plenário onde os pardos talvez formem a bancada majoritária, notadamente quando das regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste.
O governo da União, dominado por corregedores do passado, acaba de enviar ao Congresso uma lei determinando que todos os concursos públicos para provimento de cargos federais reservem 20% das vagas para negros e pardos. Com isso – suponho que pensem assim – está feita justiça.
Um tipo de “justiça” sempre proposta para viger contra o direito alheio. Nunca com renúncia a qualquer direito de quem decide. Já tramita na Câmara, por exemplo, projeto que pretende criar cotas raciais nas eleições parlamentares.
Não o aprovarão porque isso afeta as próprias reeleições. Será que o STF ou o CNJ aprovariam cotas nos concursos para a magistratura? E o governo? O governo, que propõe a lei, tem uma única e solitária ministra negra entre 40 pastas e secretarias com status de ministério.
O grande Chesterton dedica um capítulo de Os Hereges à questão das raças. Lá pelas tantas, escreve: “Todos os mais autênticos ingleses se aborreceriam ou escarneceriam abertamente se começássemos a falar sobre anglo-saxões. (…) A verdade disso tudo é muito simples. A nacionalidade existe, e nada neste mundo a relaciona a raça”. E cita Timothy Healey: “Nacionalidade é algo pelo que as pessoas morrem”.
O Brasil, porém, vai deixando de ser a nação pela qual morreram tantos antepassados nossos para se tornar um amontoado de corpos sociais em conflito, sob a fraudulenta reengenharia social dos corregedores do passado. Está se oficializando como um país racista, onde a identidade fundamental passa a ser a cor da pele.
02 de dezembro de 2013
Percival Puggina é arquiteto, empresário, escritor
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