"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

"O FIM, O INÍCIO E O MEIO"

Somos amigos há muitos anos, e um dia ela me disse em tom de piada gentil: ‘Quando eu crescer quero ser você.’ Nanda querida, a sério, quando envelhecer quero ser você
Como diria Nelson Rodrigues, fiquei besta. O primeiro livro de Fernanda Torres, “Fim”, é o início brilhante de uma carreira de escritora e já a coloca entre os melhores da sua geração literária. Sim, ela mesma, que há tanto tempo brilha nos palcos e nas telas, que corta cana toda semana no Projac para divertir o público de “Tapas e beijos”, a Nanda que alegra os amigos com sua inteligência e seu humor.
 
Atriz consagrada em 35 anos de carreira, Nanda começou a dar pinta de outros talentos em suas crônicas na “Folha de S.Paulo” e na “Veja Rio”, conquistando leitores, exercitando seus instrumentos de expressão e se fortalecendo para o voo mais alto e arriscado de um romance.
E que romance! Tão audacioso que seu tema é a morte de cinco velhos de Copacabana que formavam uma turma na juventude, mas narrada na primeira pessoa por cada personagem, formando um tecido de suas memórias, sentimentos e delírios, em que várias verdades se entrelaçam para contar o mais importante da vida de cada um: seu fim.
 
O tema seria pesado e indigesto, os velhos chatos, ranzinzas, neuróticos, doentes, devassos, vulgares e banais, mas nas mãos de Nanda se transformam em personagens ricos e fascinantes em sua grandeza e pequenez, que nos fazem rir e chorar com suas memórias de vida e, sim, de morte.
Numa sucessão vertiginosa de dramas e comédias sem fronteiras, uma história puxa outra num fluxo narrativo em que os velhos e suas mulheres e amantes se alternam como narradores e personagens, como afetos e desafetos, como jovens e velhos.
 
Nelson aconselhava os jovens a envelhecerem rapidamente. Mas de onde Nanda tirou tanta sabedoria, experiência e velhice para escrever essas histórias? E com um estilo tão seco e elegante, tão econômico e contundente, de frases curtas e precisas, sem gastar uma palavra em vão, com um timing de comédia e um ritmo que hipnotiza o leitor. É o melhor livro brasileiro que li desde “Pornopopeia”, de Reinaldo Moraes.
 
Somos amigos há muitos anos, e um dia ela me disse em tom de piada gentil: quando eu crescer quero ser você. Nanda querida, a sério, quando eu envelhecer quero ser você.

22 de novembro de 2013
Nelson Motta, O Globo

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