MAIOR AMEAÇA À DEMOCRACIA É A LENTIDÃO DA JUSTIÇA, QUE RESULTA EM IMPUNIDADE
Ao enviar a nova lista ao Supremo, o procurador-geral Rodrigo Janot fez questão de redigir um comunicado interno aos membros do Ministério Público Federal, em que afirmou que os fatos relatados à Justiça mostram “uma democracia sob ataque e, em grande medida, conspurcada na sua essência pela corrupção e pelo abuso do poder econômico e político”. Trata-se de uma conclusão inquestionável, porque é exatamente isso que está acontecendo.
AUTOCENSURA – O procurador Janot fez uma bela frase de efeito, mas ninguém deu muita atenção, nenhum jornal publicou em manchete, porque foi uma manifestação corporativista.
Por força do cargo que ocupa, o procurador-geral exerceu a autocensura ao se comunicar com o público interno. Não teve a coragem necessária para dizer a verdade por completo. Deixou de afirmar, por exemplo, que a maior ameaça à democracia brasileira é justamente a ineficiência da Justiça em todos os níveis e setores, incluindo o próprio Ministério Público Federal, excluídas as exceções que sempre existem e são evidenciada pela extraordinária atuação do juiz Sérgio Moro e da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, que têm conseguido apoio decisivo da Receita Federal.
LETARGIA HABITUAL – A respeito da crise do Judiciário, o jornalista José Casado publicou nesta quinta-feira um extraordinário artigo em O Globo. Sob o título “Esperando Janot”, exibiu às escâncaras a letargia que caracteriza inquéritos, denúncias e processos contra parlamentares e governantes beneficiados pelo foro privilegiado no Supremo.
A análise mostra que se passam 738 dias (dois anos), em média, para a Procuradoria-Geral da República pedir a abertura de inquérito, apresentar a denúncia e ela ser aceita pelo Supremo, que leva o tempo médio de 1.825 dias (cinco anos) para fazer o julgamento de ações criminais de acusados com foro privilegiado.
Mas a letargia não acaba por aí. Depois de realizado o julgamento, é preciso publicar o acórdão no Diário da Justiça, para que a decisão seja cumprida. Pesquisa realizada pela Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas, abrangendo de 1988 a 2013, mostra que o decano Celso de Mello demorava 679 dias para publicar os acórdãos que relatava, Marco Aurélio Mello, 173 dias, Gilmar Mendes e Cármen Lúcia, 82 dias, e a média geral era de 128 dias para publicação do acórdão, vejam a que ponto se chegou.
PRESCRIÇÃO GARANTIDA – Outro importante levantamento, feito pela Folha, revela que um terço das ações penais concluídas no Supremo sobre congressistas com foro especial foi arquivado nos últimos dez anos por causa da prescrição dos crimes. Entre os processos extintos estão três acusações contra o senador Jader Barbalho (PMDB-PA), duas contra a senadora Marta Suplicy (PMDB-SP) e uma contra o deputado Paulo Maluf (PP-SP).
Com base nessas pesquisas de O Globo, da FGV-Rio e da Folha, fica evidente que será inviabilizada grande parte do gigantesco trabalho que tem sido feito pela Lava Jato, pela Procuradoria-Geral da República e pelo Supremo.
Já acostumado com as prescrições, o senador Jader Barbalho chega a ironizar as acusações que lhe fazem e diz que vai consultar uma cartomante para saber qual será a próxima decisão do Supremo.
CRIME DE LESA-PÁTRIA – Se a Justiça atuasse a contento, não haveria impunidade das elites e toda a estrutura do país funcionaria melhor, porque não teria se consolidado essa corrupção institucionalizada.
Mas acontece que, salvo as honrosas exceções, magistrados e procuradores não estão nem aí para o interesse público, só se preocupam com seus grotescos penduricalhos salariais, os carros de chapa-branca, as viagens de intercâmbio etc. e tal. Esta é a realidade.
Todos sabem que o Supremo precisa ter agilidade, este é o ponto-chave. São onze ministros, mas apenas um, Luís Roberto Barroso, tem denunciado essa situação. Os outros dez se mantêm em silêncio, incorrendo em omissão funcional, que na prática configura um verdadeiro crime de lesa-pátria. Mas quem se interessa.
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PS – Ao invés de cerrar fileiras com Barroso e lutar para aperfeiçoar o funcionamento do Supremo, o ministro Gilmar Mendes prefere dedicar sua capacidade e seu entusiasmo à tarefa inglória e impatriótica de criar brechas na lei e inviabilizar a Lava Jato. E os demais ministros se omitem. Ficam constrangidos, mas não têm coragem de enfrentar Gilmar Mendes e fazê-lo respeitar a dignidade exigida pela função. E assim la nave va, cada vez mais descontroladamente. (C.N.)
17 de março de 2017
Carlos Newton
Comentário esclarecedor, EXCELENTE! VALE A PENA "LER E RELER' para os Leigos!
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