"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 29 de outubro de 2016

PONTO DE PARTIDA

Encerrada a tramitação na Câmara, a proposta de emenda à Constituição que limita o crescimento dos gastos públicos segue para o Senado. A crer no cronograma definido pelas lideranças partidárias, a votação será finalizada até meados de dezembro.

A PEC estabelece que as despesas crescerão em linha com a inflação por 20 anos, com possibilidade de a regra ser ajustada a partir da metade desse período. Trata-se de mudança notável em relação ao padrão das últimas duas décadas, quando os dispêndios aumentaram bem acima da inflação, exigindo maior carga tributária.

Para evitar a retirada de recursos de educação e saúde, criou-se um piso para essas rubricas. No caso específico da saúde, fixou-se o mínimo em 15% da receita líquida de 2017, valor a ser corrigido pela inflação a partir de 2018. O dispositivo garante um ponto de partida acima do que seria obtido hoje.

A despeito do intenso debate em torno da emenda constitucional, ainda persistem algumas dúvidas e muitos mitos em relação a seu funcionamento. A oposição insiste em afirmar que o limite para as despesas necessariamente levará o país à recessão e inviabilizará as funções básicas do Estado.

Ocorre que a proposta, em si mesma, não autoriza esse raciocínio. A recessão decorre de dinâmica oposta —o gasto desenfreado e maquiado da gestão Dilma Rousseff (PT). Reduzir o risco de insolvência é condição básica para que qualquer política pública possa ser sustentada.

A PEC apenas determina um nível máximo de desembolsos agregados e confere ao Congresso a tarefa de definir prioridades —algo benéfico para a democracia.

O ajuste, além do mais, é lento. Com estimativas realistas, o gasto público em relação ao PIB (hoje em torno de 20%) voltaria para a média do primeiro mandato de Dilma somente em 2021.

Há, todavia, problemas. O principal deles envolve o ritmo de crescimento das despesas com a Previdência. Se não for contido, essa rubrica achatará as demais.

A tramitação no Senado representará mais uma oportunidade para o país perceber o que está em jogo. Longe de ser linha de chegada, o teto de gastos constitui ponto de partida para outras reformas.

Além de efetuar mudanças na Previdência, o país precisará redimensionar custeio da máquina (o que implica, entre outras medidas, rever salários e benefícios do funcionalismo nos três Poderes), bem como acesso a subsídios.

É uma batalha incessante e diária. Basta ver o poder das corporações, bem-sucedidas em vender suas demandas como agenda popular. A aprovação na Câmara de aumentos de até 37% para algumas carreiras poucas horas depois da votação da PEC demonstra o tamanho do desafio.

29 de outubro de 2016
Editorial Folha de SP

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