"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 22 de junho de 2016

UM ACORDO DE ARRUMAÇÃO

Ao propor a revisão da meta fiscal, com espaço para déficit primário de até R$ 170,5 bilhões, a nova equipe econômica embutiu nas contas o custo provável, neste ano, da negociação com os governadores. A decretação do estado de calamidade pelo governo do Rio de Janeiro poderia ter complicado as discussões. Mas os demais governadores concordaram com o auxílio diferenciado para o Rio, sem cobrar atenções especiais.

Livres do custo da dívida até o fim do ano, os Tesouros estaduais só retomarão os pagamentos a partir de janeiro, com descontos decrescentes até julho de 2018. Depois disso as prestações voltam ao nível normal. O custo para a União ficará em R$ 20 bilhões em 2016 e em R$ 15 bilhões em cada um dos dois anos seguintes. Além disso, os prazos ficarão 20 anos mais longos. Mas os juros compostos – como aqueles pagos pela União quando toma um empréstimo – serão mantidos e com isso se evitará uma aberração financeira. Os Estados autorizados pelo Supremo Tribunal Federal a pagar juros simples terão um tempo para repor a diferença devida ao Tesouro Nacional.

O acordo possibilita a volta à disciplina fiscal negociada com os governos no fim dos anos 1990, quando a União refinanciou e assumiu as dívidas estaduais e se tornou credora desses valores. O limite planejado para a expansão dos gastos federais será estendido também às despesas dos Estados. O aumento nominal dessas despesas poderá corresponder no máximo à inflação do ano anterior. Para atender a essa restrição, e também para retornar aos padrões impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal, os governos terão de restabelecer critérios de austeridade perdidos nos últimos anos. Uma das façanhas da política petista foi o relaxamento das normas fiscais dos Estados, com maior espaço para endividamento e para despesas.

O efeito mais visível do afrouxamento foi a expansão dos gastos com pessoal. Segundo nota divulgada pelo Ministério da Fazenda no fim de abril, entre 2009 e 2015 esses gastos cresceram de 4,95% do Produto Interno Bruto (PIB) para 5,3%. Nesse período as despesas com a dívida chegaram a diminuir, passando de 0,95% do PIB para 0,91%.

Ainda segundo a nota, o Rio de Janeiro foi o Estado campeão no aumento da folha de pessoal, com variação média anual de 16,2%. Santa Catarina ficou em segundo lugar, com expansão de 15,67% ao ano. Em anos recentes, vários Estados passaram o limite prudencial da relação entre a folha e a receita corrente líquida.

No caso do Rio de Janeiro, a crise fiscal tornou-se escancarada neste ano, quando faltou dinheiro para salários e para a manutenção de serviços básicos, como a medicina de emergência. Histórias de pessoas desesperadas em busca de assistência tornaram-se frequentes na televisão.

A explicação oficial – redução da receita derivada da exploração do petróleo – apenas confirmou a baixa qualidade da administração. Em qualquer Estado brasileiro, o governo só deveria usar a receita proporcionada pelo petróleo como complemento, jamais como fonte de cobertura de funções essenciais. A aberração fica mais evidente quando se pensa no esforço de governos do Oriente Médio para reduzir a dependência da atividade petrolífera. Calamidade, mesmo, é a soma de incompetência com irresponsabilidade, como prova ainda mais amplamente a recessão brasileira.


22 junho de 2016
Editorial O Estadão

Nenhum comentário:

Postar um comentário