Cabral em Paris, de olho grande na propina dos empreiteiros |
O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (PMDB) foi acusado por dois ex-executivos da construtora Andrade Gutierrez, em depoimentos de delação premiada a procuradores da Lava-Jato, de ter cobrado propina nas obras do Maracanã, do Comperj, do Arco Metropolitano, do Conjunto de Favelas de Manguinhos e até de contratos nos quais não havia dinheiro do estado. Em seus depoimentos, divulgados pelo “Jornal Nacional”, nesta sexta-feira, Rogério Nora de Sá e Clóvis Peixoto Primo disseram que Cabral teria recebido R$ 300 mil mensais, entre 2010 e 2011, referentes a 5% do contrato da reforma do Maracanã para a Copa do Mundo.
Os delatores afirmaram ainda que a Andrade pagou outros R$ 350 mil por mês, sem informar a duração do pagamento, após pedido do ex-governador, em 2011, como um adiantamento. Na ocasião, Cabral teria cobrado da empresa o pagamento referente a contratos futuros, justificando que não tinha obras nem projetos porque estava no início do segundo mandato.
ACERTO NO PALÁCIO
Os ex-executivos afirmaram, em depoimento no fim de abril, que se reuniram com Cabral no Palácio Laranjeiras, residência oficial do governador do Rio, onde Cabral morava à época, para tratar de propina. O percentual cobrado pelo ex-governador era de 5% dos valores dos contratos, segundo os ex-executivos.
As delações incluem também o ex-secretário de Governo do estado Wilson Carlos, o dono da construtora Delta, Fernando Cavendish, e Carlos Miranda, apontado como operador de Cabral nas obras do Maracanã. Segundo os depoimentos, o acerto dos pagamentos era feito com Wilson Carlos, que falaria em nome de Cabral.
Aos procuradores, Rogério de Sá e Clóvis Primo disseram que o ex-governador cobrou pagamento de 5% do valor total do contrato para reforma do Maracanã. A informação foi publicada pela revista “Época”.
SUPERPROPINA
Com pagamentos mensais, a propina teria permitido que a Andrade Gutierrez se associasse à Odebrecht e à Delta, outras construtoras que formaram o consórcio que disputou a reforma do estádio, em 2009, para a Copa do Mundo. Segundo os delatores, os vencedores já estariam definidos antes mesmo da licitação. Orçadas inicialmente em R$ 600 milhões, a obra custou R$ 1,266 bilhão. O montante recebido por Cabral seria de cerca de R$ 60 milhões.
Os pagamentos teriam sido feitos por Alberto Quintaes, superintendente comercial da Andrade Gutierrez no Rio, usando caixa dois. Segundo a delação, o dinheiro era entregue a Carlos Miranda.
“CONTRIBUIÇÃO”
Segundo a revista “Época”, Rogério de Sá afirmou que se reuniu com Cabral para tratar da inclusão da Andrade Gutierrez no consórcio. O ex-governador teria concordado e determinado que a empresa combinasse o percentual com a Odebrecht. A Delta teria direito a 30%, o que não poderia ser modificado. A Andrade Gutierrez ficou com 21% de participação, e a Odebrecht, 49%. Nesta reunião, segundo os delatores, Cabral usou a palavra “contribuição” para se referir ao pagamento de propina em troca da “bondade”.
A Delta pertencia a Cavendish, amigo de Cabral. Rogério de Sá disse que questionou o ex-governador sobre uma eventual exclusão da Delta do consórcio, já que a empresa não teria competência técnica. Cabral não teria concordado porque “tinha consideração pela empresa e gostava dela”.
ATÉ NA PETROBRAS
O ex-governador teria cobrado, também, pagamento referente a contratos em que não havia dinheiro do estado. Rogério de Sá disse que Cabral pediu propina de 1% referente às obras de terraplanagem do Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro (Comperj), em Itaboraí, Região Metropolitana do Rio. Cabral teria dito aos ex-executivos que já tinha acertado a negociação com o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, hoje condenado na Lava-Jato. Rogério de Sá disse que procurou Costa na estatal e questionou o pagamento, mas ouviu uma confirmação como resposta: “Tem que honrar”. No depoimento, ele afirmou que a Andrade Gutierrez pagou R$ 2,7 milhões a Cabral em seguida.
Os delatores afirmaram, ainda, que a propina referente ao contrato do Arco Metropolitano não foi paga porque a Andrade desistiu da obra depois de ganhar a licitação.
CABRAL E CAVENDISH
A proximidade entre Cabral e Fernando Cavendish, dono da Delta, foi exposta em abril de 2012, depois que vídeos e fotos de uma viagem do ex-governador a Paris, três anos antes, foram divulgados. As imagens mostraram Cabral e sua mulher, Adriana Ancelmo, em jantar de comemoração do aniversário da então primeira-dama em restaurante onde estavam Cavendish, a então noiva do empresário, Jordana Kfouri, o secretário estadual de Saúde, Sergio Côrtes, sua mulher e Wilson Carlos. Nas fotos, Cabral e Cavendish apareceram com guardanapos enrolados na cabeça. Na ocasião, a empresa era uma das principais prestadoras de serviço do estado. Um inquérito aberto para investigar a viagem foi arquivado pelo Conselho Superior do Ministério Público estadual em novembro de 2013, sob alegação de que não havia provas de que a ida a Paris fora custeada com recursos públicos.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Era só questão de tempo. Um político corrupto como Cabral iria acabar sendo apanhado pela Lava Jato. Na importante matéria faltou um dado social: a proximidade de Cabral com Cavendish, da Delta, aumentou ainda mais quando se tornaram concunhados. Cabral estava abandonando a mulher para viver com a cunhada de Cavendish. Ia passar o fim de semana com ela e a família de Cavendish quando o helicóptero caiu em Porto Seguro, matando sua amante e o filho pequeno dela. Para fugir do escândalo, Cabral voltou para a mulher, que se tornara dona de um próspero escritório de advocacia abastecido com clientes indicados por Cabral. O ex-governador se tornou um homem riquíssimo com as propinas, mas alega ser hoje sustentado pela mulher. Como dizia Ibrahim Sued, em sociedade tudo se sabe. (C.N.)
15 de maio de 2016
Deu em O Globo
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