Enquanto há gente dando como favas contadas a assinatura do acordo de livre comércio entre a União Européia e o Mercosul, há setores, na própria Europa, que não querem ouvir falar do assunto.
Enquanto técnicos do Mercosul estão se reunindo para fechar a proposta dos países do bloco sul-americano a ser apresentada à União Européia, a imprensa divulga que diversas associações de agricultores e pecuaristas europeus se manifestam, mais uma vez, contra a assinatura de qualquer tratado que afete os seus interesses.
A Copa-Cogeca, que reúne mais de 100 associações de agricultores e de cooperativas agrícolas da União Européia e de países como a Turquia, Islândia, Noruega e Suíça, enviou documento às autoridades responsáveis pela agricultura na União Européia, lembrando que 70% das carnes importadas pela região já provêm do Mercosul.
Na carta, as organizações afirmam que a aprovação do tratado traria bilhões de euros em prejuízo para os agricultores e pecuaristas europeus. A alegação é a de que o Mercosul não pode oferecer os mesmos padrões sanitários e de “rastreabilidade” cobrados dos agricultores do velho continente, e de que existem barreiras à entrada de produtos agrícolas europeus nos países do Mercosul.
SEM GARANTIAS
Mesmo que não houvesse a mobilização clara dos agricultores europeus por seus interesses – mobilização que tem que ser levada em conta na avaliação da proposta europeia para o Mercosul – ainda assim, não teríamos nenhuma garantia para nosso setor agrícola, tradicionalmente prejudicado pelos subsídios da Europa e dos Estados Unidos à sua agricultura.
Novas leis em processo de aprovação pelos EUA e a U.E, no lugar de acabar com os subsídios, estão substituindo-os por mecanismos de apoio, como seguros, que na prática representam mais dinheiro vivo para os agricultores.
E a própria Copa-Cocega continua fazendo pressão para ter apoio e entrar em novos mercados, como fez, em recente manifesto, pedindo que se mantenham subsídios, no setor leiteiro, afim de que se possa “aproveitar” as oportunidades, abertas pelo aumento do consumo de leite na índia e na China, que deverá ser de 30% nos próximos dois anos.
Esse tipo de mobilização é mais que suficiente para mostrar que, por mais que nos abaixemos, e abramos célere e irresponsavelmente nossos mercados para os europeus e norte-americanos, nunca seremos tratados como iguais.
ENTREGUISMO
E se não é para sermos tratados como iguais, mas para entregar a América do Sul, único mercado para os manufaturados feitos no Brasil, então para que assinar esse tratado, principalmente quando estamos tendo crescentes déficits no comércio com a Europa e os EUA nos últimos anos?
Achar que esses déficits vão se transformar em superávits se abrirmos nossas fronteiras para os europeus beira a insensatez e a ingenuidade, já que nem sequer na agricultura, onde somos reconhecidamente competitivos, eles querem ceder afim de levar vantagem em outras áreas, como as de serviços e manufaturas, por exemplo.
Sem se preocupar em mostrar suas verdadeiras intenções, a União Europeia entrou, semana passada, com denúncias contra o Plano Safra brasileiro 2013/2014 na OMC – Organização Mundial do Comércio, menos de 15 dias depois do seu anúncio pela Presidente Dilma.
A intenção é pressionar o Brasil – aproveitando o ano eleitoral – até o limite, obrigando o governo a aceitar condições danosas para o nosso país, no futuro.
O ministro Mauro Borges, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, afirmou, recentemente, que o Mercosul “não aceitará um acordo de livre comércio, sem uma proposta agrícola que for “para valer”, e contou aos repórteres que a Presidente Dilma Roussef teria perguntado o que a União Européia tem a oferecer para o Brasil.
O ministro poderia ter sido sincero, e respondido que a U.E está oferecendo ao nosso país o que costuma oferecer sempre que há esse tipo de negociações de araque, como ocorreu, pela última vez, em 2004: rigorosamente, nada.
16 de junho de 2014
Mauro Santayana
(Jornal do Brasil)
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