Ela conseguiu. Cristina Kirchner suprimiu a pobreza da Argentina. Não existe mais, acabou - os pobres simplesmente desapareceram das estatísticas oficiais.
A ordem foi transmitida na noite de quarta-feira pelo ministro da Economia, Axel Kicillof, à diretoria do INDEC, o equivalente local do IBGE: não haverá divulgação de estatísticas sobre a evolução da indigência e da pobreza na Argentina no segundo semestre de 2013, ao contrário do que previa o calendário governamental.
Pelas estimativas oficiais, 2013 deveria terminar com 1,6 milhão de pessoas pobres e indigentes, sobrevivendo com um dólar por dia. Assim, os pobres corresponderiam a 4% da população economicamente ativa e os indigentes 1%. A referência para o cálculo é o valor atribuído pelo governo à cesta de alimentos básicos (US$ 120 em dezembro).
O problema é que, além de Cristina e do seu ministro da Economia, não há argentino que acredite nesses dados oficiais.
A Central Geral de Trabalhadores (CGT), por exemplo, pôs seus analistas para trabalhar, usando como referência o valor atribuído pelo governo (US$ 329) em 1º de abril para a cesta básica de alimentos.
Eles concluíram o óbvio: ou os preços dos alimentos controlados dispararam, aumentando mais de 170% nos primeiros três meses deste ano, ou os dados governamentais sobre a cesta básica de 2013 são absolutamente falsos.
Pelo valor oficial da cesta básica de abril, o contingente de pobres e indigentes corresponderia, hoje, a 33% da população.
Abriu-se um abismo entre a pobreza reconhecida pelo governo e a calculada por entidades independentes, da CGT às empresas privadas de consultoria econômica - todos usando a mesma referência, o valor oficial da cesta básica.
Na Argentina imaginária de Cristina existiriam 1,6 milhão de pobres e indigentes. No outro país, onde a realidade prevalece na boca do caixa dos supermercados, eles somariam 13 milhões, numa população de 41 milhões.
Sobram 11,4 milhões entre os cálculos. Não é mera estatística, são pessoas cuja sobrevivência está em jogo.
Acossada pela realidade, Cristina eliminou os pobres da estatística oficial, acabando com o problema. Agora poderá passar os 20 meses que lhe restam no poder anunciando um "aumento da renda individual" na Argentina.
É um clássico do humor negro na política: para aumentar a renda per capita, basta cortar as "capita".
27 de abril de 2014
José Casado, O Globo
A ordem foi transmitida na noite de quarta-feira pelo ministro da Economia, Axel Kicillof, à diretoria do INDEC, o equivalente local do IBGE: não haverá divulgação de estatísticas sobre a evolução da indigência e da pobreza na Argentina no segundo semestre de 2013, ao contrário do que previa o calendário governamental.
Pelas estimativas oficiais, 2013 deveria terminar com 1,6 milhão de pessoas pobres e indigentes, sobrevivendo com um dólar por dia. Assim, os pobres corresponderiam a 4% da população economicamente ativa e os indigentes 1%. A referência para o cálculo é o valor atribuído pelo governo à cesta de alimentos básicos (US$ 120 em dezembro).
O problema é que, além de Cristina e do seu ministro da Economia, não há argentino que acredite nesses dados oficiais.
A Central Geral de Trabalhadores (CGT), por exemplo, pôs seus analistas para trabalhar, usando como referência o valor atribuído pelo governo (US$ 329) em 1º de abril para a cesta básica de alimentos.
Eles concluíram o óbvio: ou os preços dos alimentos controlados dispararam, aumentando mais de 170% nos primeiros três meses deste ano, ou os dados governamentais sobre a cesta básica de 2013 são absolutamente falsos.
Pelo valor oficial da cesta básica de abril, o contingente de pobres e indigentes corresponderia, hoje, a 33% da população.
Abriu-se um abismo entre a pobreza reconhecida pelo governo e a calculada por entidades independentes, da CGT às empresas privadas de consultoria econômica - todos usando a mesma referência, o valor oficial da cesta básica.
Na Argentina imaginária de Cristina existiriam 1,6 milhão de pobres e indigentes. No outro país, onde a realidade prevalece na boca do caixa dos supermercados, eles somariam 13 milhões, numa população de 41 milhões.
Sobram 11,4 milhões entre os cálculos. Não é mera estatística, são pessoas cuja sobrevivência está em jogo.
Acossada pela realidade, Cristina eliminou os pobres da estatística oficial, acabando com o problema. Agora poderá passar os 20 meses que lhe restam no poder anunciando um "aumento da renda individual" na Argentina.
É um clássico do humor negro na política: para aumentar a renda per capita, basta cortar as "capita".
27 de abril de 2014
José Casado, O Globo
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