Pesquisa nacional sobre o comportamento dos jovens mostra que eles estão enviando um desesperado pedido de socorro. Como estamos respondendo?
Gerações de brasileiros cresceram debaixo de um poderoso bordão: “Somos um país de jovens”. De modo que políticas voltadas para a juventude sempre pareceram um desperdício de saliva. Todas as políticas, em tese, acabariam por cair no colo dos mais moços já que faziam parte da maioria. Mas esse raciocínio beira a falta de juízo. Nem o Brasil é tão jovem, como foi um dia. Nem as políticas são mecanismos tão inteligentes, a ponto de se distribuírem pelas faixas etárias com a instantaneidade com que traquitanas tecnológicas espalham mensagens.
O preço pago por esse autoengano é que o Brasil acredita que faz o que não faz. E o que não faz (pelos jovens) deixa a nação dançando quadrilha em cima das cinzas. Há políticas de distribuição de renda – implementados na última década –, há mecanismos para a juventude desvalida. O Pro-Jovem mostrou que amparar esse grupo custa muito pouco. O mesmo se diga das políticas de inclusão no curso superior. Deram-se de forma rápida e mudaram a geografia do ensino no país. Mas basta?
O recém-publicado 2.º Levantamento Nacional de Álcool e Drogas, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), sobre comportamento juvenil, dá a medida dos nossos tropeços nos cuidados a quem devemos. O estudo é amplo. São 800 perguntas, com entrevistas em profundidade, questionários junto a 1.742 brasileiros entre 14 e 25 anos, em 149 municípios. Um primor. Quem quer que precise se debruçar sobre o perfil juvenil do país há de encontrar munição nesses números. A pesquisa, afinal, quantifica questões tão díspares como a depressão e o uso do tempo.
Chamaram a atenção da imprensa dois números em especial: o dado de que 34,1% dos consultados faz sexo sem preservativo, e de que 33% dos entrevistados declararam usar semanalmente álcool ou drogas. Mas, lida no conjunto, a pesquisa da Unifesp indica o estágio de abandono dos jovens. Os pesquisadores da universidade descobriram que 21% deles têm “indicadores de depressão” – só entre as meninas, o porcentual sobre para 28%; além disso, um em cada dez jovens já pensou em se matar, e 5% já tentaram o suicídio.
Os jovens estão enviando um desesperado pedido de socorro, e o que fazemos com eles? Atiramos instrumentos para que eles possam fazer tudo “com segurança”. É a isso que se propõem tantas políticas de redução de danos. E deixamos esses moços, pobres moços, respondendo ao que a sociedade lhes oferece – consumo e individualismo desmedidos. Não é de estranhar que a afetividade seja mecânica, seguindo a melodia que se está cantando por aí. É grave.
Pior: tratamos os jovens como números, como “problemas de saúde pública”. Uma menina de 17 anos contaminada pelo HIV é uma questão de sanitarismo, não se discute. “Quanto ela custaria para os cofres públicos?”, perguntamos. O que incomoda é ser a saúde a única voz, como se não houvesse mais nada a dizer nem mais agentes a tomarem a palavra nessa peleja. A verdade é que nossos jovens estão órfãos de palavras.
Os jovens não querem a “segurança” oferecida pelas políticas de redução de danos. Herdeiros – filhos, netos, alunos – da geração de 68, do “é proibido proibir”, eles aprenderam a liberdade sem responsabilidade. Mas seu desespero mostra que os jovens estão à procura de quem os tire da zona de conforto. De quem lhes diga que há uma excelência a buscar, que existem modelos nobres a seguir, que a família tem de ser seu porto seguro, que a felicidade está na prática das virtudes e não na mera satisfação dos instintos, que há um amor nobre que sabe respeitar o outro. Insulta o jovem quem acha que a maneira de lidar seus problemas é aceitar o hedonismo como o “jeito jovem de ser” e se contentar em impedir que o prazer desenfreado faça vítimas por aí.
Ainda ecoam os dizeres do papa Francisco no Brasil, pedindo que se acredite no jovem. O verbo é esse mesmo: “acreditar”, o que implica fazer depósitos. Em valores. São questões que parecem não caber numa tabela. Resistem às estatísticas. Mas é difícil sustentar que cada item doído da Unifesp não tenha razões práticas e teóricas na nossa indolência para com “eles” – nós sabemos quem.
Gerações de brasileiros cresceram debaixo de um poderoso bordão: “Somos um país de jovens”. De modo que políticas voltadas para a juventude sempre pareceram um desperdício de saliva. Todas as políticas, em tese, acabariam por cair no colo dos mais moços já que faziam parte da maioria. Mas esse raciocínio beira a falta de juízo. Nem o Brasil é tão jovem, como foi um dia. Nem as políticas são mecanismos tão inteligentes, a ponto de se distribuírem pelas faixas etárias com a instantaneidade com que traquitanas tecnológicas espalham mensagens.
O preço pago por esse autoengano é que o Brasil acredita que faz o que não faz. E o que não faz (pelos jovens) deixa a nação dançando quadrilha em cima das cinzas. Há políticas de distribuição de renda – implementados na última década –, há mecanismos para a juventude desvalida. O Pro-Jovem mostrou que amparar esse grupo custa muito pouco. O mesmo se diga das políticas de inclusão no curso superior. Deram-se de forma rápida e mudaram a geografia do ensino no país. Mas basta?
O recém-publicado 2.º Levantamento Nacional de Álcool e Drogas, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), sobre comportamento juvenil, dá a medida dos nossos tropeços nos cuidados a quem devemos. O estudo é amplo. São 800 perguntas, com entrevistas em profundidade, questionários junto a 1.742 brasileiros entre 14 e 25 anos, em 149 municípios. Um primor. Quem quer que precise se debruçar sobre o perfil juvenil do país há de encontrar munição nesses números. A pesquisa, afinal, quantifica questões tão díspares como a depressão e o uso do tempo.
Chamaram a atenção da imprensa dois números em especial: o dado de que 34,1% dos consultados faz sexo sem preservativo, e de que 33% dos entrevistados declararam usar semanalmente álcool ou drogas. Mas, lida no conjunto, a pesquisa da Unifesp indica o estágio de abandono dos jovens. Os pesquisadores da universidade descobriram que 21% deles têm “indicadores de depressão” – só entre as meninas, o porcentual sobre para 28%; além disso, um em cada dez jovens já pensou em se matar, e 5% já tentaram o suicídio.
Os jovens estão enviando um desesperado pedido de socorro, e o que fazemos com eles? Atiramos instrumentos para que eles possam fazer tudo “com segurança”. É a isso que se propõem tantas políticas de redução de danos. E deixamos esses moços, pobres moços, respondendo ao que a sociedade lhes oferece – consumo e individualismo desmedidos. Não é de estranhar que a afetividade seja mecânica, seguindo a melodia que se está cantando por aí. É grave.
Pior: tratamos os jovens como números, como “problemas de saúde pública”. Uma menina de 17 anos contaminada pelo HIV é uma questão de sanitarismo, não se discute. “Quanto ela custaria para os cofres públicos?”, perguntamos. O que incomoda é ser a saúde a única voz, como se não houvesse mais nada a dizer nem mais agentes a tomarem a palavra nessa peleja. A verdade é que nossos jovens estão órfãos de palavras.
Os jovens não querem a “segurança” oferecida pelas políticas de redução de danos. Herdeiros – filhos, netos, alunos – da geração de 68, do “é proibido proibir”, eles aprenderam a liberdade sem responsabilidade. Mas seu desespero mostra que os jovens estão à procura de quem os tire da zona de conforto. De quem lhes diga que há uma excelência a buscar, que existem modelos nobres a seguir, que a família tem de ser seu porto seguro, que a felicidade está na prática das virtudes e não na mera satisfação dos instintos, que há um amor nobre que sabe respeitar o outro. Insulta o jovem quem acha que a maneira de lidar seus problemas é aceitar o hedonismo como o “jeito jovem de ser” e se contentar em impedir que o prazer desenfreado faça vítimas por aí.
Ainda ecoam os dizeres do papa Francisco no Brasil, pedindo que se acredite no jovem. O verbo é esse mesmo: “acreditar”, o que implica fazer depósitos. Em valores. São questões que parecem não caber numa tabela. Resistem às estatísticas. Mas é difícil sustentar que cada item doído da Unifesp não tenha razões práticas e teóricas na nossa indolência para com “eles” – nós sabemos quem.
14 de abril de 2014
Editorial Gazeta do Povo, PR
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