"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 16 de novembro de 2013

PROCESSO FOI MARCADO PELA LEGITIMIDADE EM TODA A SUA DISCUSSÃO - DIZ AYRES BRITTO

Personalidades contam ao GLOBO como encararam a decisão do julgamento do Mensalão

Ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Ayres Britto
Foto: André Coelho / O Globo
Ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Ayres Britto André Coelho / O Globo
 
No dia em que os condenados no processo do mensalão começaram a ir para a cadeia, cientistas políticos, artistas, um ex-ministro do Supremo e uma ativista no combate à corrupção contaram ao GLOBO como veem esse momento do país. Para o ex-ministro Ayres Britto, o “processo foi marcado pela legitimidade em toda a sua discussão”. Líder do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, Jovita Rosa diz que espera que a moda pegue. Mas há também quem diga que condenações por indício “ferem o Estado de Direito”.
 
 
Carlos Ayres Britto - Ex-ministro do Supremo
 
“Eu não tenho falado desse caso. Fiz o que tinha que fazer. Coloquei o processo para julgamento, presidi 50 das 53 sessões, montando a espinha dorsal do processo, nos seus núcleos financeiro, político, publicitário. O Supremo se dispôs a formatar o processo com começo, meio e fim. Essa decisão comprova esse propósito do Supremo.
 
O dia de hoje confirma que a história processual se desenvolveu com tecnicalidade, isenção, sem perseguição ou favorecimento, como tem que ser julgado. Foi um processo marcado pela legitimidade em toda a sua discussão, como era de se esperar.
 
Essa decisão do Supremo corresponde àquilo que está na Constituição, no Código Penal e Processual Penal, atuando dentro dos marcos institucionais. Como todo o processo foi impessoal, minha opinião é rigorosamente técnica.”
 
 
Tiago Bottino - Coordenador da graduação da FGV Direito/Rio
 
“Acho importante ter esse exemplo de que não são só pobres que são condenados e cumprem pena. Agora, o mais importante é não acreditar que porque funcionou (a condenação dos mensaleiros) as coisas mudaram. Acredito que mais importante agora seria acompanhar a Meta 18, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que estabeleceu julgar até o fim de 2013 os processos de corrupção ajuizados até 2011. As pessoas não podem achar que o país mudou. É um caso e o país não é um caso. Tem muitos outros ainda não julgados. Espero que a partir desse julgamento que sejam colocados em pauta outros casos de corrupção na política, que esses crimes que não são visíveis sejam priorizados. É preciso que haja mobilização para outros casos. também.”
 
 
Zuenir Ventura - Escritor e colunista do GLOBO
 
“Eu acho que o Brasil tem uma coisa curiosa. Ele é meio ciclotímico. Tem momentos de altos e baixos. Esse é um dos grandes momentos de alta. Mas para ele se completar teria que agora ver também o caso mensalão mineiro. De qualquer modo, é um acontecimento exemplar. Para quem acreditava que não iria acabar em nada, foi uma agradável surpresa. Mas ainda não sei se algo vai mudar na política. Mas ao menos muda a imagem do Supremo Tribunal Federal na sociedade. Aquela sensação de que nada vai acontecer foi interrompida bem como a crença de que não adianta denunciar porque a justiça só condena a negros e pobres. Isso é uma coisa nova na história do país.”
 
 
Antonio Corrêa de Lacerda - Professor de Economia da PUC-SP
 
“A decisão mostra uma grande incoerência do Supremo, uma vez que aceitou os embargos infringentes, questionando a necessidade de condenação dos réus. O processo não está com trânsito em julgado. Seguindo o rito do Judiciário, a lógica é que julgasse os embargos primeiro. Foi uma atitude precipitada. Ou então não deveria aceitar os embargos, se tinha certeza da necessidade de prisão.”
 
 
Claudio Botelho- Diretor de teatro
 
“Acho histórico. A gente não podia ter perdido a chance de mostrar para o Brasil que as consequências são iguais para quem está lá em cima, para quem rouba um pão ou assalta pessoas na Avenida Copacabana.”
 

David Fleischer - Cientista político
 
“É um sinal forte para a classe política e para a população de que o Judiciário vai colocar corrupto na prisão. É um bom sinal, mas o país tem muito para andar. Vamos ver, por exemplo, como será o rigor da Justiça Eleitoral com os fichas-sujas. Agora, a partir desse julgamento, pode ser que aconteçam os julgamentos do mensalão do PSDB, do DEM e que seja investigada a propina em São Paulo. Acredito que os políticos fiquem mais cautelosos, mas é necessário ficar atento para saber se vão criar mecanismos mais sofisticados de corrupção.”
 
 
Paulo Betti - Ator
 
“Para mim, esse julgamento foi muito mais midiático. Não estou achando essa maravilha, não. Enquanto não me explicarem por que não julgaram o mensalão de Minas, que existiu e aconteceu antes, vou achar que esse é um julgamento absolutamente político e conveniente.”
 
 
Geraldo Tadeu Monteiro - Cientista Político do Iuperj
 
“As prisões simbolizam uma vitória inquestionável do Estado Democrático de Direito. O processo do mensalão foi uma espécie de grande teste para as instituições jurídicas e políticas do país. Demonstra que todo o cidadão tem que ser tratado com a isonomia das leis inclusive se forem pessoas influentes. A decisão é inquestionável. Para a política nacional é uma evolução muito importante. Eu diria que esse episódio para as instituições é até mesmo mais importante que o impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello. Tem importância no mesmo nível da lei da Ficha Limpa.”
 
 
Luiz Carlos Barreto - Produtor de cinema
 
“Dizem que esse julgamento é um momento histórico, mas não no sentido que querem dar, de que estão prendendo pessoas importantes, mas um momento histórico do casuísmo. Nunca vi um julgamento tão político. O fato de a primeira lista de ordens de prisão incluir o José Dirceu e o José Genoino significa que é um ato político, e não jurídico. Não sou especialista em Direito mas, como já disseram autoridades na área, como o jurista Ives Gandra Martins, que declarou em entrevista que não há como fazer uma condenação sem provas materiais e testemunhas, isso prova mais uma vez que o Supremo, uma instituição altamente respeitável, está enveredando por um caminho perigoso. Eu, como cidadão brasileiro, me sinto ameaçado de ser condenado por indícios e suposições. Isso fere o Estado de Direito. É um momento muito triste da História brasileira.”
 
 
Luiz Werneck Vianna - Cientista social
 
“Acredito que um capítulo foi virado na história republicana brasileira. O poder político não está acima de tudo. Se existem mandatos de prisão meu único comentário é: cumpram-se.”
 
 
Jovita Rosa - Líder do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral
 
“A gente espera que a moda pegue. Temos outros processos que o STF precisa colocar em pauta. Não dá mais para tolerar que quem desvia verba pública fique impune.”

16 de novembro de 2013
 O Globo

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