Em declarações à jornalista Mônica Bérgamo, Folha de São Paulo de quinta-feira 26, o ministro Celso de Mello, autor do voto que aceitou os embargos infringentes de doze condenados pelo STF, afirmou que a mídia (jornais, revistas, emissoras de televisão) nunca foi tão ostensiva para pressionar um juiz. Acentuou: eu imaginava que a pressão pudesse ocorrer para que votasse contra o pedido dos réus e não me senti tolhido. Mas foi insólito esse comportamento. Nada impede que você critique ou expresse seu pensamento. O que não tem sentido é pressionar o juiz – acrescentou. E destacou também: o juiz não é um ser isolado do mundo, ele vive as pulsações da sociedade, tem capacidade de ouvir. Porém precisa ser racional e não pode ser constrangido a se submeter a opiniões externas.
Compreende-se o desabafo do ministro Celso de Mello, mas ele se esquece de grandes julgamentos da história e as pressões que causaram a juízes e tribunais. Sem recuar muito no tempo da história, pode-se citar, como exemplo de pressões da imprensa, o Tribunal de Nuremberg, que julgou os crimes contra a humanidade praticados pelos nazistas durante a segunda guerra mundial; o sequestro em Buenos Aires do nazista Adolf Eichman, condenado à morte pelo Estado de Israel; o julgamento de outra nazista, Klaus Altman, condenado pela justiça francesa à prisão perpétua no final da década de 70. Ele vivia oculto na Bolívia e foi o torturador e assassino de Jean Moulin, herói da resistência francesa durante a ocupação alemã.
OUTROS CRIMES
Pode-se acrescentar à série de exemplos de pressão da opinião pública o julgamento dos responsáveis pelos crimes da ditadura argentina, a condenação do general Pinochet, ditador do Chile pela Justiça Internacional. No Brasil, exemplo de pressão dos meios de comunicação foi o julgamento do tenente da Aeronáutica Jorge Alberto Bandeira, apontado como autor do crime do Sacopã, praticado em 52 e julgado em 54. Todos esses processos emocionaram a opinião pública e, portanto, foram expostos a pressões intensas da imprensa em particular, e da mídia, em geral, como se chama hoje.
As pressões que envolveram o ministro Celso de Mello foram normais e proporcionais ao caráter excepcional do escândalo do mensalão, sem dúvida alguma o maior da história republicana do Brasil. Um esquema gigantesco de corrupção foi montado e, em consequência dele, ao contrário do que sustentou o jurista Ives Gandra Martins em recente entrevista à Folha de São Paulo, José Dirceu foi demitido pelo presidente Lula da chefia da Casa Civil e teve o mandato parlamentar cassado pela maioria absoluta da Câmara Federal. Jogou fora a sucessão presidencial de 2010. Houve participação direta de empresários, de publicitários, de banqueiros (Banco Rural que deixou de existir), de parlamentares e de lobistas.
A dimensão do escândalo, produto de um delírio estúpido de poder, teve intensa repercussão nacional. Como a população brasileira é descrente da Justiça, (esta é que é a verdade) a esperança da população voltava-se para a decisão da Suprema Corte, impulsionada pela atuação exemplar do ministro Joaquim Barbosa. O povo não sabe o que são embargos infringentes, tampouco os embargos declaratórios. Depois da rejeição destes, por oito votos a três, a tensão aumentou naturalmente pelo destino dos embargos infringentes. Daí as pressões naturais sobre Celso de Mello na expectativa de que ele encerrasse a novela com seu voto de desempate. O que acabou não acontecendo. Sob o ponto de vista da opinião pública, como demonstrou pesquisa do Datafolha, os principais criminosos ainda permanecem impunes e em liberdade. Que fazer?
01 de outubro de 2013
Pedro do Coutto
Nenhum comentário:
Postar um comentário