O juiz Bruno Macacari, da Vara de Execuções Penais do Distrito Federal, negou nesta quarta-feira, dia 17, o pedido de prisão domiciliar para o deputado Paulo Maluf (PP-SP), recolhido na Papuda, em Brasília, desde 22 de dezembro. Maluf, de 86 anos, foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em maio do ano passado por crimes de lavagem de dinheiro cometidos no período em que foi prefeito de São Paulo (1993-1996). Desde que o Supremo determinou o cumprimento da pena em regime fechado, a defesa do deputado vinha pedindo à Justiça a prisão domiciliar, sob a alegação de que ele tem idade avançada e saúde muito debilitada.
O juiz disse que Maluf não é o único doente na Papuda – há “485 hipertensos, quatro cardiopatas e sete cadeirantes”, entre outros. Sobre a idade avançada, Macacari considerou que esse fator, “por si só, não autoriza maior elasticidade das previsões legais […], tanto assim que o sistema carcerário do Distrito Federal conta, hoje, com cerca de 144 internos idosos”.
SEM DISTINÇÃO – “E não poderia ser diferente, aliás, sob pena de se admitir a existência de verdadeiro salvo-conduto para que pessoas idosas acima de 70 anos […] persistam ou se iniciem na atividade criminosa, firmes na crença de que, se condenadas, não serão penalizadas com nenhuma outra medida que o recolhimento em seu próprio lar”, escreveu o juiz.
“No que se refere às restrições de movimento do reeducando e aos cuidados necessários em virtude de problemas que tem na coluna lombar, tenho, com supedâneo na substanciosa prova técnica [produzida pelos médicos legistas], que não se vê ele [Maluf] no estado de tamanha debilidade que busca ostensivamente demonstrar.”
No final de dezembro, um laudo de médicos legistas do Instituto de Medicina LegaL (IML) indicou que, apesar de sofrer de doença grave e permanente, Maluf poderia cumprir a pena na Papuda, contanto que tivesse acompanhamento médico adequado.
40 QUESITOS – Na ocasião, a defesa argumentou que os médicos analisaram apenas o câncer de próstata e a doença na coluna que acometem o deputado, ignorando o mais grave, a doença cardíaca. Com anuência do juiz, os advogados enviaram 40 quesitos para serem respondidos pelos médicos legistas, que tratavam do problema cardíaco e das condições da unidade prisional para prestar socorro em uma eventualidade.
As respostas chegaram à Vara de Execuções Penais no último dia 8. O juiz Macacari deu, então, mais 24 horas para o Centro de Detenção Provisória (CDP), onde Maluf está preso, complementar as informações sobre a estrutura do local. Após o Ministério Público do Distrito Federal e a defesa se manifestarem, o juiz de Execuções Penais decidiu manter Maluf em regime fechado.
PROGRAMA DE TV – Na decisão, o juiz citou uma entrevista que Maluf concedeu ao jornalista Roberto Cabrini, do SBT, no programa “Conexão Repórter” de 15 de outubro passado.
“Àquela ocasião, o reeducando se movimentou com aparente destreza, apesar da idade avançada, jamais se apoiando, durante a entrevista, na bengala de que passou a se servir desde que emanada a ordem de prisão do STF”, disse o juiz. “Isso não bastasse […], quando perguntado acerca do segredo de sua juventude, [Maluf] afirmou: ‘Eu ando, no mínimo, todo dia, três quilômetros’.”
Entre outras perguntas, a defesa do deputado quis saber dos médicos legistas se há, na unidade prisional, médicos de plantão 24 horas, cuidadores e desfibriladores. “É certo que o sistema carcerário local não conta com médico em regime de plantão nas 24 horas do dia. E não poderia ser diferente. Afinal, repito, estamos falando de um presídio, e não de um hospital ou de uma UTI”, considerou o juiz.
“Não há nos autos qualquer informação de que, no tempo que precedeu a prisão, o sentenciado contasse, em sua residência, com médico plantonista, ou mesmo enfermeiro ou cuidador. Não se aventou, por exemplo, em momento algum, que teria, em seu lar, desfibrilador automático externo (AED) ou outro equipamento que servisse à mesma finalidade, ou, ainda, que em seu lar permanecesse pessoa habilitada a utilizá-lo, se tal uso se mostrasse necessário em uma situação de urgência.”
RECUSA DE MALUF – Macacari destacou na sentença que, além de receber as informações dos médicos legistas e da direção da unidade, ele vistoriou o local e foi informado de que Maluf se recusa a receber tratamento médico e odontológico ali. “Por cautela, então, os administradores do presídio colheram declaração subscrita pelo reeducando, cuja cópia segue, vertida nos seguintes termos: ‘Eu, Paulo Maluf, declaro, para os devidos fins, que me recuso a receber atendimento médico e a me submeter a quaisquer procedimentos relativos a saúde, realizados pela equipe de saúde desta unidade prisional'”, registrou o juiz.
Em resposta ao argumento da defesa de que, recentemente, morreram dois homens na Papuda devido a problemas cardíacos, Macacari afirmou que “durante todo o ano de 2017, num universo que girou sempre em torno de quase 16 mil presos, seis foram os óbitos ocorridos no sistema carcerário local, de indivíduos que tinham 24, 26, 29, 32 e 38 anos”. “A finitude da vida é inerente à existência humana. Não fosse isso verdade, jamais haveria qualquer óbito entre aqueles indivíduos que, internados em hospital, sofrem eventos que põem fim às suas vidas, entre eles paradas cardiorrespiratórias irreversíveis, a despeito de todos os recursos ali existentes”, diz a decisão.
PRESO RICO – Macacari ressaltou que a cela de Maluf comporta seis presos, mas hoje abriga quatro, “além de contar com portas mais alargadas e plenas condições de acessibilidade, o que em muito facilita o ingresso das equipes médicas em caso de urgência”. Afirmou também que são servidas refeições especiais para presos doentes –as quais o deputado tem recusado.
“Se o sentenciado tem passado os dias à base de minipizza, refrigerante, café e água, como salientado pelo parecerista contratado pela defesa, tal fato decorreu exclusivamente de ação voluntária dele. Isso porque os dois primeiros itens, vale dizer, minipizza e refrigerante, jamais compuseram os cardápios dos internos, e foram livremente adquiridos e consumidos pelo próprio reeducando”, afirmou o juiz. O juiz de Execuções Penais escreveu ainda que “não se pode permitir a construção – ou a perpetuação, caso ela já exista– da ideia censitária de que o sentenciado rico não deve permanecer preso porque o Estado não é capaz de lhe assegurar a mesma qualidade de vida que ele teria em liberdade, enquanto o pobre, porque já acostumado à precariedade, […] estaria suficientemente amparado por aquilo que o Estado pode oferecer em termos de sistema prisional”.
“Não pode ser diferente, aliás, sob pena de se admitir que, se o exercício do altruísmo for genuíno e suficiente para abrandar os rigores da lei penal, então a mesma cortesia deveria ser estendida aos demais 1.034 portadores de doenças graves recolhidos no sistema carcerário desta Capital Federal.”
OUTRO LADO – O advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, disse em nota que o juiz reconheceu que o sistema carcerário não tem condições de prestar todo o auxílio necessário a Maluf, mas mesmo assim decidiu mantê-lo preso. O advogado disse que vai recorrer ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal.
“A defesa, perplexa, registra que os laudos apresentados, a nosso ver, evidenciam a absoluta impossibilidade da manutenção, com segurança, do dr. Paulo Maluf no sistema carcerário. A prisão domiciliar neste caso é mais do que uma decisão humanitária, é uma questão de direito e justiça”, afirmou Kakay.
“A defesa, que não entende de medicina, viu atônita a decisão citar um programa de televisão do qual o dr. Paulo participou tempos atrás como fundamento da sua manutenção na prisão. Acreditamos que o Tribunal de Justiça de Brasilia tenha uma visão mais humana e mais condizente com o direito”, finzalizou.
18 de janeiro de 2018
Reynaldo Turollo Jr
Folha
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