No caso do “crime da mala”, o presidente Michel Temer ganhou o primeiro assalto, mas está correndo risco de perder a luta nos rounds finais. O recurso apresentado pela defesa do ex-assessor presidencial Rocha Loures é altamente prejudicial a Temer, porque levanta a tese de que não se pode dividir a denúncia feita ao Supremo Tribunal Federal pela Procuradoria-Geral da República, que incriminou os dois como réus de corrupção passiva praticada em conjunto.
Nesta quinta-feira (dia 10), em respeito à decisão da Câmara, que impediu a abertura do processo contra Temer, o ministro-relator Edson Fachin decidiu desmembrar a denúncia, suspendendo o prosseguimento do inquérito contra o chefe do governo e transferindo à primeira instância da Justiça Federal de Brasília a função de abrir processo contra o ex-assessor Rocha Loures.
RÉU CONFESSO – A situação é delicadíssima, porque Loures foi gravado e filmado pela Polícia Federal ao receber uma mala com a propina de R$ 500 mil. Ele poderia se defender e alegar que a mala não continha dinheiro, mas preferiu devolvê-la com R$ 465 mil e depois fez o depósito judicial dos R$ 35 mil restantes, complementando os R$ 500 mil.
Ao tomar essa iniciativa de devolver a propina, automaticamente Loures se tornou “réu confesso”. É nesta condição que será enquadrado, sem possibilidade de absolvição, porque não há mais dúvidas da autoria do crime.
A dúvida que resta é saber se o dinheiro seria repassado ao presidente Temer ou se o próprio Loures era o destinatário final, conforme tem afirmado o chefe de governo, ao alegar que nada tem a ver com o assunto.
RELAÇÃO UMBILICAL – No recurso já apresentado ao Supremo, a defesa argumenta que há “relação umbilical” entre as acusações contra Loures e Temer, porque a denúncia deixa claro que o então assessor estaria atuando em nome do presidente. Nessa linha de raciocínio, os advogados salientam que não é possível dividir as denúncias de Temer e de Loures, porque as suspeitas são juridicamente “conexas”.
“No presente caso, a impossibilidade do desmembramento está relacionada à imbricação absoluta entre as condutas supostamente perpetradas pelos dois acusados, segundo a denúncia. A inicial acusatória trata de um único fato, o qual teria sido perpetrado em conjunto pelos dois denunciados. Ou seja, não estamos diante de fatos diversos e conexos, os quais podem ser individualizados e separados uns dos outros, com exceção da conexão instrumental”, diz a peça dos advogados.
“Há uma relação umbilical entre a narrativa das condutas de Rodrigo Santos da Rocha Loures e as do presidente Michel Temer, uma vez que a denúncia sempre faz referência ao primeiro como um mensageiro do segundo, atuando em seu nome e seguindo suas instruções”, argumentaram.
HORA DA DELAÇÃO – Embora o objetivo da defesa seja manter Loures sob a proteção do foro privilegiado do presidente da República, a maneira como os argumentos foram apresentados demonstra que os advogados incluem Temer na autoria do crime, pois Loures já é réu confesso, sem a menor possibilidade de absolvição.
Em tradução simultânea, está subentendido que, se o Supremo autorizar a abertura do processo em separado contra Loures, o ex-assessor presidencial se verá constrangido a fazer delação premiada e contar o que realmente aconteceu.
Diante dessa clara ameaça, será implacável a pressão do Planalto sobre o Supremo, na tentativa de evitar que Loures seja processado na primeira instância. E ninguém sabe o que pode acontecer, porque a Justiça brasileira é realmente imprevisível.
13 de agosto de 2017
Carlos Newton
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