Uma pesquisa da Fundação Perseu Abramo, ligada ao PT, com ex-eleitores do partido aponta um descolamento entre o discurso da legenda e o que pensam moradores da periferia de São Paulo. O levantamento qualitativo, feito entre novembro do ano passado e janeiro deste ano, revela que, para a população de favelas e de bairros afastados do Centro, o Estado é o grande adversário do cidadão. Também, ao contrário do que tem apregoado o PT, não existe disputa entre ricos e pobres. O embate entre esquerda e direita, tão propagado pelos dirigentes petistas, é considerado inexistente.
“É visível que há uma desconexão muito forte entre o discurso petista e a periferia” — avalia o cientista político Marco Antonio Teixeira, da FGV.
CORRUPÇÃO – A pesquisa ouviu eleitores que votaram no PT no passado, mas não optaram nem por Dilma Rousseff na disputa presidencial de 2014, tampouco por Fernando Haddad na eleição municipal de 2016. Os entrevistados tinham renda familiar de até cinco salários mínimos, e 30% deles eram beneficiários de algum programa social (Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida ou Prouni).
Os entrevistados indicaram a corrupção como o principal problema do país. A política é considerada “suja”. “A inclusão social da era Lula foi colocada em xeque muito rapidamente. E emerge desse período uma visão disseminada de um Estado corrupto” — afirma Teixeira.
IMPOSTOS – As queixas contra o Estado têm como alvo principal a cobrança de impostos. As irmãs Beth Pereira, de 42 anos, e Marisete Pereira da Silva, de 39 anos, se juntam aos descontentes com o valor das taxas. Os tributos são apontados por elas como obstáculo para formalizarem a loja de venda de doces na Favela de Paraisópolis, a segunda maior de São Paulo.
“São muito impostos. Se pagarmos tudo, não sobra nada para gente. E o pior é que não sabemos para onde vai o dinheiro que eles arrecadam” — reclama Beth, que começou a trabalhar aos 14 anos como doméstica e, há cinco anos, abriu o seu negócio próprio ao lado da irmã. “Foi muita decepção depois” — diz Marisete, também ex-doméstica, referindo-se às investigações da Lava-Jato.
Beth e Marisete contam que a situação delas e dos outros quatro irmãos hoje é muito melhor do que a de quando a família delas se estabeleceu na favela, em 1988, vinda de Vitória da Conquista, na Bahia. “Conquistamos bastante coisa. Foi muito esforço e dedicação” — afirma Beth.
“FALTOU PROJETO” – Presidente da Fundação Perseu Abramo, Marcio Pochmann diz que o objetivo da pesquisa foi conhecer melhor o segmento social que ascendeu socialmente com o PT no poder:
“A pesquisa consolida essa visão de que faltou um projeto de cidadania (durante os anos Lula e Dilma) mais do que um projeto de inclusão pelo consumo”, assinala.
O sentimento de que o esforço pessoal possibilita uma melhora na condição de vida é retratado na pesquisa. “Apresentam discurso consistente de que não existem barreiras intransponíveis —‘com esforço tudo é superado’”, diz o relatório da pesquisa. É esse mais um ponto, na visão de especialistas, que distancia o PT.
FORA DE ÉPOCA – “Aparentemente os representantes do PT continuam insistindo numa linha político-ideológica que é muito mais apropriada para a primeira metade do século 20, com uma perspectiva de luta de classes e coletivista que se sobrepõe ao indivíduo. Os entrevistados têm uma visão de valorização do papel do indivíduo” — avalia o cientista político José Álvaro Moisés, professor da USP.
As citações a Lula entre os entrevistados acontecem mais em relação ao seu exemplo de ascensão social do que pelas políticas que implementou no governo. “Há uma busca por identificação com histórias de superação e sucesso, é nessa medida que figuras tão díspares como Lula, Silvio Santos e João Doria aparecem como exemplos”. Doria, aliás, é citado como “beneficiário do cenário de descrédito” por ser “um não político, gestor trabalhador que ascendeu e, por isso, não vai roubar”.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Este sentimento colhido pela pesquisa do PT existe no Brasil e em muitos outros países. Foi a aversão aos políticos profissionais que elegeu personagens como Trump e Doria. Se deixar a prefeitura em abril de 2018 e se candidatar, Doria será um concorrente fortíssimo, com muito mais chances do que o desgastado trio Serra, Alckmin e Aécio. Se o PSDB quiser chegar ao poder, é melhor lançar logo a candidatura do prefeito midiático. (C.N.)
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Este sentimento colhido pela pesquisa do PT existe no Brasil e em muitos outros países. Foi a aversão aos políticos profissionais que elegeu personagens como Trump e Doria. Se deixar a prefeitura em abril de 2018 e se candidatar, Doria será um concorrente fortíssimo, com muito mais chances do que o desgastado trio Serra, Alckmin e Aécio. Se o PSDB quiser chegar ao poder, é melhor lançar logo a candidatura do prefeito midiático. (C.N.)
06 de abril de 2017
Sérgio Roxo
O Globo
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