Para quem acredita nos efeitos benignos das privatizações e se desinteressa pela forma como elas são conduzidas, a boa notícia veio do presidente Michel Temer: seu governo estuda a privatização dos aeroportos de Congonhas e Santos Dumont. Numa estimativa grosseira, essas duas operações, somadas às concessões de quatro outros aeroportos, poderiam levar ao governo mais de R$ 10 bilhões ao longo de duas décadas.
No dia seguinte, outra notícia desafinou a orquestra. Maurício Quintella, o ministro dos Transportes do governo que planeja novas privatizações, informou que concorda em dar um refresco aos concessionários de sete aeroportos, que não pagaram as outorgas devidas à Viúva, coisa de pelo menos R$ 2,5 bilhões.
Chama-se “outorga” a prestação que o concessionário se comprometeu a pagar. Algo como aluguel. Em 2012, quando o governo petista privatizou os aeroportos de Guarulhos, Viracopos e Brasília, o leilão foi considerado um sucesso, e informou-se que ele renderia R$ 24,5 bilhões. Renderia, porque os três concessionários não pagaram os aluguéis. O mesmo aconteceu com os novos donos do Galeão e de Confins.
O ministro diz que os aluguéis serão pagos até o fim de dezembro. Acredita quem quiser. Pelo contrato de concessão dos aeroportos, como acontece com o aluguel de apartamentos, se o inquilino não paga, deve ir embora. O governo preferiu o caminho do refresco para não assustar o mercado. Talvez aí esteja o seu erro. O que assusta investidores é um governo que não cumpre contratos. Não foi por superstição que algumas grandes empreiteiras nacionais e operadoras mundiais de aeroportos resolveram ficar longe dos leilões petistas.
As privatizações de 2012 foram tratadas como um êxito porque parecia que a simples ideia de afastar o governo dos aeroportos resolveria o problema dos apagões. Quem olhou os leilões da privataria petista sentiu cheiro de queimado. A OAS ficou com Guarulhos; a Engevix, com Brasília; e a UTC, com Viracopos. Em quase todos os casos, entraram os fundos de pensão Petros, Previ e Funcef, bem como o velho e bom BNDES. Um ano depois, a Odebrecht levou o Galeão com um socorro das arcas do FGTS e conseguiu um milagre da privataria, o aeroporto foi privatizado e sua concessionária tinha 61% de participação estatal.
A permanência da Infraero nas operações dos aeroportos privatizados foi criticada internacionalmente como sendo um caso de permanência da raposa no novo galinheiro. Como os concessionários decidiram enxugar a folha de pagamentos do seus aeroportos, a estatal transferiu servidores para Congonhas, que continuou na sua jurisdição, e seu quadro passou de 336 funcionários para 573. Um deles era encarregado de vigiar o refeitório.
As privatizações não trouxeram o que prometeram (inclusive os aluguéis), mas as novas operadoras melhoraram alguns aspectos do negócio. Nenhum aeroporto brasileiro pode sonhar com a qualidade dos terminais de Amsterdã, mas Guarulhos pode ser mais confortável do que algumas áreas de embarque congestionadas do Charles De Gaulle. Já o Galeão, em 2015 continuava invicto na posição de pior aeroporto do mundo. Em abril passado, a Odebrecht atrasara o pagamento de R$ 934 milhões.
13 de julho de 2016
Elio Gaspari, O Globo
No dia seguinte, outra notícia desafinou a orquestra. Maurício Quintella, o ministro dos Transportes do governo que planeja novas privatizações, informou que concorda em dar um refresco aos concessionários de sete aeroportos, que não pagaram as outorgas devidas à Viúva, coisa de pelo menos R$ 2,5 bilhões.
Chama-se “outorga” a prestação que o concessionário se comprometeu a pagar. Algo como aluguel. Em 2012, quando o governo petista privatizou os aeroportos de Guarulhos, Viracopos e Brasília, o leilão foi considerado um sucesso, e informou-se que ele renderia R$ 24,5 bilhões. Renderia, porque os três concessionários não pagaram os aluguéis. O mesmo aconteceu com os novos donos do Galeão e de Confins.
O ministro diz que os aluguéis serão pagos até o fim de dezembro. Acredita quem quiser. Pelo contrato de concessão dos aeroportos, como acontece com o aluguel de apartamentos, se o inquilino não paga, deve ir embora. O governo preferiu o caminho do refresco para não assustar o mercado. Talvez aí esteja o seu erro. O que assusta investidores é um governo que não cumpre contratos. Não foi por superstição que algumas grandes empreiteiras nacionais e operadoras mundiais de aeroportos resolveram ficar longe dos leilões petistas.
As privatizações de 2012 foram tratadas como um êxito porque parecia que a simples ideia de afastar o governo dos aeroportos resolveria o problema dos apagões. Quem olhou os leilões da privataria petista sentiu cheiro de queimado. A OAS ficou com Guarulhos; a Engevix, com Brasília; e a UTC, com Viracopos. Em quase todos os casos, entraram os fundos de pensão Petros, Previ e Funcef, bem como o velho e bom BNDES. Um ano depois, a Odebrecht levou o Galeão com um socorro das arcas do FGTS e conseguiu um milagre da privataria, o aeroporto foi privatizado e sua concessionária tinha 61% de participação estatal.
A permanência da Infraero nas operações dos aeroportos privatizados foi criticada internacionalmente como sendo um caso de permanência da raposa no novo galinheiro. Como os concessionários decidiram enxugar a folha de pagamentos do seus aeroportos, a estatal transferiu servidores para Congonhas, que continuou na sua jurisdição, e seu quadro passou de 336 funcionários para 573. Um deles era encarregado de vigiar o refeitório.
As privatizações não trouxeram o que prometeram (inclusive os aluguéis), mas as novas operadoras melhoraram alguns aspectos do negócio. Nenhum aeroporto brasileiro pode sonhar com a qualidade dos terminais de Amsterdã, mas Guarulhos pode ser mais confortável do que algumas áreas de embarque congestionadas do Charles De Gaulle. Já o Galeão, em 2015 continuava invicto na posição de pior aeroporto do mundo. Em abril passado, a Odebrecht atrasara o pagamento de R$ 934 milhões.
13 de julho de 2016
Elio Gaspari, O Globo
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