A equipe de Temer recebeu duras críticas nas últimas semanas por – como noticiaram os jornais – ter possivelmente flertado com a frouxidão fiscal mais ampla e duradoura do que havia sinalizado. As críticas foram recebidas com reflexão, não com adjetivos como era a praxe no governo anterior. Anunciaram metas fiscais mais ambiciosas para os próximos anos, ainda que alguns pressupostos que as sustentem possam ser questionados. Disseram que farão o possível para apertar o torniquete das despesas discricionárias no ano que vem. Deram entrevistas esclarecedoras e se dispuseram a dialogar, por meio dos grandes jornais, com todos os que mostraram grande preocupação com os rumos fiscais do País e com a possibilidade concreta de que o Brasil não consiga escapar de uma crise fiscal ainda mais grave do que a atual. O Banco Central, sob nova tutela, tem aproveitado a janela que os fluxos externos nos têm proporcionado para diminuir o estoque de swaps cambiais – essas operações, mais ou menos equivalentes a uma venda de dólares no mercado futuro de divisas, custavam caro aos cofres públicos. Houve tempo em que chegaram a causar prejuízos superiores a 2% do PIB ao Banco Central. Estamos em boas mãos na área econômica, não há dúvida. Há dúvida, entretanto, sobre o que serão capazes de fazer perante as amarras políticas.
Dia desses li um artigo sobre a qualidade do debate da política econômica no Brasil. Embora a matéria tenha se restringido à ladainha “ortodoxos versus heterodoxos”, que, de fato, é picuinha tupiniquim, a pobreza do debate nacional repercute o que ocorre além de nossas fronteiras. O debate internacional, afinal de contas, não está lá essas coisas. Houve tempo, logo depois de terminar meu doutorado na London School of Economics e passar uns anos no Fundo Monetário Internacional, que acadêmicos e formuladores da política econômica eram tratados pela opinião pública com mais respeito.
Havia discordâncias, por certo, mas nos anos em que crises financeiras abatiam países emergentes em série, os políticos e a sociedade tratavam com mais seriedade as recomendações que vinham dos estudiosos e dos organismos internacionais. Foi assim com o debate sobre as crises fiscais e as reestruturações das dívidas soberanas dos anos 90 e início dos anos 2000 feitas por países como a Ucrânia e o Uruguai – dessa última tive a oportunidade de participar diretamente. Foi também assim com o debate sobre os regimes cambiais mais adequados para os emergentes – as crises de então fomentaram o consenso de que flutuar a moeda era melhor do que forçar uma paridade.
De meu posto de observação, hoje, como pesquisadora do Peterson Institute for International Economics e professora da School for Advanced International Studies da Johns Hopkins University, vejo que a coisa já não funciona mais assim. A opinião dos especialistas já não importa tanto, ou mesmo, simplesmente não importa. Tal situação agravou-se depois da crise de 2008 e intensificou-se nos últimos anos com as vicissitudes da política que tomaram conta de diversos países mundo afora. A política sempre foi uma amarra para a política econômica. Hoje, entretanto, ela é quase forca. Estão aí o Brasil, o Reino Unido, e os EUA para mostrar como é difícil manter um debate racional sobre o que deve ser a política econômica.
Diante disso, aplaudo os objetivos da equipe econômica. Aplaudo seus integrantes, mas continuo a achar muito difícil que o Brasil consiga escalar o muro de cacos de vidro que cerca o beco em que se encontra.
13 de julho de 2016
Monica de Bolle, Estadão
Economista, pesquisadora do Peterson Institute for Internacional Economics e professora da Sais/Johns Hopkins University
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