Seria improvável, no atual clima de vigilância da opinião pública, que tentativas explícitas no sentido de arrefecer o combate à corrupção fossem intentadas pelo Executivo ou pelo Congresso.
A Operação Lava Jato, afinal, paira como êxito indiscutível acima dos tropeços políticos e desastres econômicos dos últimos dois anos. Os dados totalizados por esta Folha impressionam: há, até o momento, 56 delatores, 75 réus condenados e R$ 2,9 bilhões a serem devolvidos ao erário.
Mas seria também implausível uma situação em que os principais afetados pela ofensiva policial e judicial —a saber, uma ampla parcela das autoridades brasileiras— não se esforçassem, nos bastidores, por desarmar tantos mecanismos que os ameaçam.
A reação começa a tomar a forma de debates legislativos inspirados em excessos supostos e reais da Lava Jato e operações congêneres.
Reconheça-se, de pronto, que o tema é meritório; princípios como os da presunção de inocência e do direito amplo à defesa não podem ser abandonados em favor de uma cruzada moralista.
O êxito e a eficiência das investigações correm riscos crescentes, entretanto, quanto mais se estendem suas malhas sobre os partidos e políticos beneficiados pela nova conjuntura pós-afastamento da presidente Dilma Rousseff (PT).
Vieram à tona, por exemplo, gravações em que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), defende mudanças na lei com o objetivo de limitar o instituto da delação premiada aos casos em que réus estejam em liberdade.
O assunto, a rigor, é dos mais polêmicos —havendo quem argumente que a prisão preventiva dos suspeitos sirva como uma pressão ilegítima para que assinem seus acordos com os investigadores.
Também da presidência do Senado se origina a decisão de recolocar em pauta projeto destinado a coibir abusos de autoridades, entre os quais o vazamento de dados de investigações. A proposta tem pertinência; não deixa de inspirar precauções, porém, o momento em que reaparece seu debate.
Enquanto isso, com aval da Presidência da República, retira-se na Câmara dos Deputados a urgência para o exame de um pacote de medidas anticorrupção—como a que criminaliza o uso do caixa 2 em campanhas eleitorais.
Ainda que defensáveis pontualmente, todas essas iniciativas vão num mesmo sentido, o de diminuir a pressão sofrida pelos próprios políticos que as propõem. Trata-se do bastante, sem dúvida, para que se redobre a vigilância quanto a seu conteúdo.
13 de julho de 2016
Editorial Folha de SP
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