Fragmentação impõe derrota a Temer em quaisquer cenários
Não havia como Michel Temer sair inteiro de uma disputa pelo comando da Casa que o colocou no poder, mas foi a associação com Eduardo Cunha e o desprezo pelo destino do seu próprio partido que elevou a fatura a ser paga depois da eleição da mesa. O presidente optou pela candidatura que julgou ter mais chances de manter unido o Centrão, seu maior credor, mas a implosão do bloco parecia inevitável desde a queda de Cunha, seu principal avalista. Nenhum outro presidente da Câmara será capaz de colar os nove pedaços em que o Centrão se desintegrou. Nenhum presidente da República será capaz de tramitar os interesses de seu mandato numa Câmara fatiada em 17 candidaturas, depois afuniladas para igualmente inéditas 14.
Foi a condição de candidato anti-Cunha que deu competitividade aos deputados Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Marcelo Castro (PMDB-PI), antigos cabos eleitorais do ex-presidente da Câmara e por ele escolhidos para presidente e relator da comissão de reforma política, uma das primeiras apostas de sua gestão. Perderam a condição de aliados preferenciais para novas adesões da corte de Eduardo Cunha, como Rogério Rosso (PSD-DF), deputado com estampa de lorde inglês que entrou na política pelas mãos de Joaquim Roriz e nela ascendeu à sombra de Cunha que lhe presenteou com a presidência da comissão do impeachment, passaporte para o cargo de candidato oficial.
Preterido por Temer em sua pretensão de se tornar líder do governo, função que viria a ser ocupada por um sentinela do ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia galvanizou a maior frente anti-Cunha. Consolidado no seu partido, no PSDB e no PPS, foi buscar no ex-ministro Aldo Rebelo (PCdoB), a quem havia apoiado na eleição deste ao posto em 2005, a costura com os partidos de oposição, a começar pelo PT. Na presidência da Câmara, viria a ser um parlamentar mais afinado com a pauta liberal do governo Temer do que o próprio candidato governista, sem alinhamento visível a não ser com os acordos de ocasião. A despeito da convergência ideológica com Maia, sua candidatura acendeu a luz amarela no Palácio do Planalto pela perspectiva de derrotar o Centrão, bloco que tanto elegeu quanto pode inviabilizar Michel Temer.
Maia encontrou campo aberto na ala petista Construindo Novo Brasil (CNB), que hoje soma 25 deputados, e viu na aliança a possibilidade de fazer acordos que lhe tirassem do isolamento parlamentar ao qual a eleição de Eduardo Cunha lhes havia relegado. O segundo partido da Casa ficara sem cargo na Mesa ou presidência de comissão. A aproximação, que não chegou a ser um acordo, teve o aval do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Contra o pragmatismo do CNB, se insurgiu a corrente adversária, Mensagem, que tem o mesmo número de deputados e se recusava em apoiar candidato que votara pelo impeachment de Dilma Rousseff. A posição principista seria definida pelo deputado Carlos Zarattini (SP) como fatal para as condições de o partido se posicionar nas batalhas parlamentares que estão por vir.
A divisão abriu espaço para o líder do grupo de dez deputados que age como tertius das disputas internas do PT, Arlindo Chinaglia (SP), arquitetar com o deputado Silvio Costa (PTdoB-PE), hoje um dos parlamentares mais próximos de Lula, a candidatura de um pemedebista capaz de angariar votos da oposição e de correligionários insatisfeitos com o governo. Os petistas apelaram ao velho divisionismo do PMDB. A estratégia, que comprometera, em grande parte, o mandato de Dilma Rousseff, contava agora com o desgaste de um partido alijado por um presidente correligionário e viciado nas práticas parlamentares de suas lideranças. Depois de duas décadas ocupando espaços dos partidos que encabeçaram a Presidência da República (PT e PSDB), o PMDB também passou a experimentar o desgaste da titularidade.
A busca por um pemedebista em desalinho já tinha alvo. Marcelo Castro, arquirrival de Cunha desde que fora destituído da relatoria da reforma política, estava disposto até a se lançar numa candidatura avulsa. Conseguiu 28 votos para representar o PMDB, contemplado em sua breve gestão no ministério da Saúde, a cobiçada pasta, hoje nas mãos do PP, de um país sem obras. O resultado do primeiro turno demonstrou que parte de seu eleitorado pemedebista jogou para negociar com o governo. Sua candidatura simbolizou a entropia de um partido que depois de tantos anos como avalista a projetos majoritários de poder, custa a puxar o comboio para além da praça de pedágio.
Os dois candidatos, além dos outros 14 que, num primeiro momento, se registraram, emergiram como ameaça ao Centrão porque se valeram dos métodos do bloco, de reinar sobre a fragmentação. O fim do loteamento petista não foi suficiente para o governo federal abrigar os cinquenta tons do Centrão. A candidatura que mais avançou sobre o baixo clero da Câmara, a do deputado paranaense Fernando Giacobo, partiu de uma dissidência do PR alijada da poderosa pasta dos Transportes reservada para o partido na gestão Temer.
O presidente interino avaliou ser capaz de se blindar das insatisfações contra a candidatura oficial de Rosso, a despeito de ambos serem caudatários do Centrão e daquele que ainda é seu principal expoente. Este texto é escrito sem o resultado final, mas Temer, com Rosso ou Maia, ganha perdendo. Encabeça um governo que é o refúgio dos interesses de Eduardo Cunha contra os quais duas frentes se insurgiram nesta disputa eleitoral. Paga o preço de ter mantido os laços com aquele que talvez seja o principal responsável pelo mandato que hoje exerce.
Se a ascensão do Centrão implodiu os dois principais polos da política nacional, sua desintegração não implica na recomposição de PT e PSDB nem indica um caminho claro para a governabilidade de um mandato ao qual serve como principal fiador. A brevidade do mandato do novo presidente da Câmara será inversamente proporcional à importância do avanço da pauta legislativa neste semestre crucial à continuidade da gestão Temer. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, principal âncora deste governo, informa a quem interessado estiver que não há ajuste sem a proposta de emenda constitucional que limita gastos. A escolha de um novo presidente numa disputa tão fragmentada sinaliza para um vácuo de liderança que, da Câmara dos deputados, ameaça invadir o Palácio do Planalto.
15 de julho de 2016
Maria Cristina Fernandes, Valor Econômico
Não havia como Michel Temer sair inteiro de uma disputa pelo comando da Casa que o colocou no poder, mas foi a associação com Eduardo Cunha e o desprezo pelo destino do seu próprio partido que elevou a fatura a ser paga depois da eleição da mesa. O presidente optou pela candidatura que julgou ter mais chances de manter unido o Centrão, seu maior credor, mas a implosão do bloco parecia inevitável desde a queda de Cunha, seu principal avalista. Nenhum outro presidente da Câmara será capaz de colar os nove pedaços em que o Centrão se desintegrou. Nenhum presidente da República será capaz de tramitar os interesses de seu mandato numa Câmara fatiada em 17 candidaturas, depois afuniladas para igualmente inéditas 14.
Foi a condição de candidato anti-Cunha que deu competitividade aos deputados Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Marcelo Castro (PMDB-PI), antigos cabos eleitorais do ex-presidente da Câmara e por ele escolhidos para presidente e relator da comissão de reforma política, uma das primeiras apostas de sua gestão. Perderam a condição de aliados preferenciais para novas adesões da corte de Eduardo Cunha, como Rogério Rosso (PSD-DF), deputado com estampa de lorde inglês que entrou na política pelas mãos de Joaquim Roriz e nela ascendeu à sombra de Cunha que lhe presenteou com a presidência da comissão do impeachment, passaporte para o cargo de candidato oficial.
Preterido por Temer em sua pretensão de se tornar líder do governo, função que viria a ser ocupada por um sentinela do ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia galvanizou a maior frente anti-Cunha. Consolidado no seu partido, no PSDB e no PPS, foi buscar no ex-ministro Aldo Rebelo (PCdoB), a quem havia apoiado na eleição deste ao posto em 2005, a costura com os partidos de oposição, a começar pelo PT. Na presidência da Câmara, viria a ser um parlamentar mais afinado com a pauta liberal do governo Temer do que o próprio candidato governista, sem alinhamento visível a não ser com os acordos de ocasião. A despeito da convergência ideológica com Maia, sua candidatura acendeu a luz amarela no Palácio do Planalto pela perspectiva de derrotar o Centrão, bloco que tanto elegeu quanto pode inviabilizar Michel Temer.
Maia encontrou campo aberto na ala petista Construindo Novo Brasil (CNB), que hoje soma 25 deputados, e viu na aliança a possibilidade de fazer acordos que lhe tirassem do isolamento parlamentar ao qual a eleição de Eduardo Cunha lhes havia relegado. O segundo partido da Casa ficara sem cargo na Mesa ou presidência de comissão. A aproximação, que não chegou a ser um acordo, teve o aval do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Contra o pragmatismo do CNB, se insurgiu a corrente adversária, Mensagem, que tem o mesmo número de deputados e se recusava em apoiar candidato que votara pelo impeachment de Dilma Rousseff. A posição principista seria definida pelo deputado Carlos Zarattini (SP) como fatal para as condições de o partido se posicionar nas batalhas parlamentares que estão por vir.
A divisão abriu espaço para o líder do grupo de dez deputados que age como tertius das disputas internas do PT, Arlindo Chinaglia (SP), arquitetar com o deputado Silvio Costa (PTdoB-PE), hoje um dos parlamentares mais próximos de Lula, a candidatura de um pemedebista capaz de angariar votos da oposição e de correligionários insatisfeitos com o governo. Os petistas apelaram ao velho divisionismo do PMDB. A estratégia, que comprometera, em grande parte, o mandato de Dilma Rousseff, contava agora com o desgaste de um partido alijado por um presidente correligionário e viciado nas práticas parlamentares de suas lideranças. Depois de duas décadas ocupando espaços dos partidos que encabeçaram a Presidência da República (PT e PSDB), o PMDB também passou a experimentar o desgaste da titularidade.
A busca por um pemedebista em desalinho já tinha alvo. Marcelo Castro, arquirrival de Cunha desde que fora destituído da relatoria da reforma política, estava disposto até a se lançar numa candidatura avulsa. Conseguiu 28 votos para representar o PMDB, contemplado em sua breve gestão no ministério da Saúde, a cobiçada pasta, hoje nas mãos do PP, de um país sem obras. O resultado do primeiro turno demonstrou que parte de seu eleitorado pemedebista jogou para negociar com o governo. Sua candidatura simbolizou a entropia de um partido que depois de tantos anos como avalista a projetos majoritários de poder, custa a puxar o comboio para além da praça de pedágio.
Os dois candidatos, além dos outros 14 que, num primeiro momento, se registraram, emergiram como ameaça ao Centrão porque se valeram dos métodos do bloco, de reinar sobre a fragmentação. O fim do loteamento petista não foi suficiente para o governo federal abrigar os cinquenta tons do Centrão. A candidatura que mais avançou sobre o baixo clero da Câmara, a do deputado paranaense Fernando Giacobo, partiu de uma dissidência do PR alijada da poderosa pasta dos Transportes reservada para o partido na gestão Temer.
O presidente interino avaliou ser capaz de se blindar das insatisfações contra a candidatura oficial de Rosso, a despeito de ambos serem caudatários do Centrão e daquele que ainda é seu principal expoente. Este texto é escrito sem o resultado final, mas Temer, com Rosso ou Maia, ganha perdendo. Encabeça um governo que é o refúgio dos interesses de Eduardo Cunha contra os quais duas frentes se insurgiram nesta disputa eleitoral. Paga o preço de ter mantido os laços com aquele que talvez seja o principal responsável pelo mandato que hoje exerce.
Se a ascensão do Centrão implodiu os dois principais polos da política nacional, sua desintegração não implica na recomposição de PT e PSDB nem indica um caminho claro para a governabilidade de um mandato ao qual serve como principal fiador. A brevidade do mandato do novo presidente da Câmara será inversamente proporcional à importância do avanço da pauta legislativa neste semestre crucial à continuidade da gestão Temer. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, principal âncora deste governo, informa a quem interessado estiver que não há ajuste sem a proposta de emenda constitucional que limita gastos. A escolha de um novo presidente numa disputa tão fragmentada sinaliza para um vácuo de liderança que, da Câmara dos deputados, ameaça invadir o Palácio do Planalto.
15 de julho de 2016
Maria Cristina Fernandes, Valor Econômico
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