Mas, a meu ver, Michel Temer não conseguirá separar suas contas. Por uma razão bastante simples: se ambos foram vitoriosos com os mesmos votos, como dividir as contas da campanha e seus efeitos nas urnas? Se as doações foram provenientes da corrupção desenfreada que submergiu o país num mar de escândalos, como dividir as feitas para o PMDB das que se destinaram ao PT? Só os 120 milhões de eleitores seriam capazes de responder tal questão.
É só considerar que, pela Constituição Federal, os votos conquistados pela presidente são exatamente os mesmos alcançados pelo vice. Mas nem sempre foi assim. Antes poder-se-ia estabelecer a diferença. Agora não. Vamos recorrer e percorrer o passado. A figura do vice foi criada pela Carta de setembro de 46.
Nas eleições de 2 de dezembro de 45, a primeira depois da redemocratização que sucedeu a ditadura Vargas, implantada em novembro de 37, o general Eurico Dutra foi eleito sem vice. A Constituinte criou o cargo a ser preenchido com eleição, a partir de 50. Estabeleceu que o vice de Dutra seria o presidente do Senado, Nereu Ramos. Assim, de fato, a eleição do vice pelas urnas começou em 50.
VOTOS SEPARADOS
Mas em 50, o presidente era votado separadamente do vice. Getúlio Vargas foi eleito com 48% dos votos, Café Filho ganhou a eleição de vice, por uma diferença sobre Odilon Braga. Em 55, JK elegeu-se em aliança, mas separadamente de João Goulart. Na sucessão de 60, Jânio foi eleito por firme maioria, João Goulart reelegeu-se vice por pequena diferença sobre Milton Campos, que, em 55, já havia perdido para o político gaúcho.
Aliás, a respeito das eleições de 60, Jânio Quadros concorreu na realidade com três candidatos a vice: Milton Campos, Fernando Ferrari, dissidente do PTB, e o próprio João Goulart. Jânio e Jango lançaram em vários estados a chapa Jan-Jan. A manobra teve sucesso em São Paulo e no Paraná, principalmente. A ideia partiu do senador Souza Neves, do PTB do Paraná, que a chamou de operação canguru. Goulart, inclusive, foi o primeiro caso de reeleição no Brasil antes da emenda de 97, governo FHC. Sofreu impugnação por parte da UDN, mas, representado por Santiago Dantas, um gênio que não tinha medo de ser simples, teve o direito reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal.
VICE ATRELADO
Deixemos a estrada do passado e retornemos ao presente. A partir das eleições de 89, a Constituição foi alterada, e o vice passou a ser eleito automática e conjuntamente com o presidente. Collor e Itamar Franco. Fernando Henrique e Marco Maciel, Lula e José Alencar. Dilma e Temer. Não pode haver separação de contas, já que não existe separação dos votos. No Congresso, não, o impeachment atinge apenas a presidente. Mas no TSE, a chapa Dilma Rousseff & Michel Temer é indivisível. Esta questão, iluminada pelo O Globo, pode se tornar fundamental. Dependerá dos rumos e do teor do processo de impeachment.
09 de abril de 2016
Pedro do Coutto
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