A casa caiu quando Marco Aurélio Mello afirmou que, sendo o STF “o último bastião da cidadania”, o processo de impeachment, ainda que aprovado no julgamento do Senado, poderá passar ao crivo do Supremo – “caso haja dúvida sobre o cometimento de crime pela presidente da República”.
O site do PT festejou a declaração.
O bem falante ministro Marco Aurélio Mello me faz lembrar muitos petistas que conheço. Diminutivos e aumentativos variam conforme a conveniência. Probleminhas e problemões mudam de lado segundo a retórica do momento. Sérgio Moro (símbolo nacional de uma justiça como a nação deseja) tanto lhe serve como bom exemplo do que denomina "promissora conduta das instituições nacionais", quanto de justiça servida “em cambulhada”. Sérgio Moro é conveniente quando o ministro quer elogiar o poder cuja cúpula ele, Marco Aurélio, integra e que está longe de representar a Justiça que a nação deseja. Mas deixa de ser bom, o juiz de Curitiba, quando o ministro pretende isentar o STF de responsabilidades pela lentidão dos processos em sua longa dormição nas gavetas, onerosa longevidade e intoleráveis prescrições. Para o ministro, a demora serviria à boa justiça...
Quem acompanha com interesse cívico os fatos que se desenrolam nos mais altos escalões do poder não pode, em sã consciência, negar o que vê: um poder judiciário mais do que politizado. Politicamente alinhado em sua cúpula. Nele, as cortesias de praxe escondem das vistas do público as dissenções e as desconfianças internas. Um exemplo foi brilhantemente apresentado pelo jornalista José Nêumanne. Acumulam-se ações contra o presidente da Câmara e do Senado. Ambos repugnam à nação. Os procedimentos para afastar Eduardo Cunha avançam e isso é ótimo, mas servem ao governo que quer vê-lo pelas costas. Os procedimentos para afastar Renan Calheiros se arrastam e isso é péssimo, mas servem ao governo que precisa dele como do ar que respira, até a conclusão do processo de impeachment no Senado. Acho que não preciso desenhar tal assimetria.
Inquirido sobre o ato falho do colega Roberto Barroso no comentário que fez sobre essa gente do PMDB como alternativa de poder, Marco Aurélio foi para o púlpito dos advogados defender o ministro que falou ignorando a transmissão externa. Ora, o próprio Barroso cuidou de deixar estampada a gravidade do erro quando recomendou que apagassem a fita!
Indagado sobre o inegável desvio de finalidade presente na nomeação de Lula para a Casa Civil, Marco Aurélio Mello deu uma volta na frase, parecendo concordar, e apresentou a ideia de que, por outro lado, não se poderia desconhecer a hipótese de que a presidente estivesse, de fato, precisando de Lula como tábua de salvação. “Me tira os tubos”, como diria aquele personagem de Jô Soares.
Logo após sua exibição de vaidade em rede nacional, o ministro Marco Aurélio voltou ao serviço, subiu nas tamancas e determinou que o presidente da Câmara desse continuidade a inaudito pedido de impeachment contra o vice-presidente, impetrado um petista tão delirante quando burro porque reconhece em Temer o crime que o PT nega em Dilma. Cunha disse que ia recorrer, mas perante o próprio rabo preso, obedeceu. Eu não entendo: os ministros despacham o que querem, quando querem, mas obrigam os demais poderes e despachar quando eles querem. Quem disse que querer não é, necessariamente, poder, desconhece Marco Aurélio e o STF.
Na minha perspectiva, a casa caiu quando ele afirmou que, sendo o STF “o último bastião da cidadania”, o processo de impeachment, ainda que aprovado no julgamento do Senado, poderá passar ao crivo do Supremo – “caso haja dúvida sobre o cometimento de crime pela presidente da República”. Ou seja, a decisão de 594 deputados e senadores pode cair por seis a cinco no STF. E até mesmo, quem sabe, por uma liminar monocrática... Nesse caso, que terão feito Câmara e Senado ao deliberarem exatamente sobre tal questão? O site do PT festejou a declaração. No meu léxico, o nome da pretensão exposta pelo ministro é Ditadura através do Judiciário.
09 de abril de 2016
Percival Puggina
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