A ameaça de insolvência em que se encontram fundos como o Postalis, dos Correios, e Funcef, da Caixa, deve-se não apenas a gestões negligentes, imprudentes ou imperitas, mas também à má-fé
São imensas as frestas abertas da corrupção no Brasil. Poucos ou até mesmo inexistentes são os setores infensos à ação de malfeitores ávidos em avançar sobre o patrimônio público, ora em benefício do patrimônio pessoal, ora direcionando-o para políticos ou partidos que, em troca de vantagens, os protegem. São chocantes os exemplos que, neste sentido, nos foram oferecidos pelo mensalão e agora, mais recentemente, pelo petrolão – casos em que se conluiaram servidores públicos de alto escalão, grandes empreiteiras, parlamentares e siglas políticas, todos envolvidos num mesmo objetivo, o de apoderar-se de dinheiro alheio para obter lucros escusos.
Em meio à repercussão centralizada naqueles dois maiores e mais conhecidos escândalos, por frestas pouco menores – mas não menos importantes do ponto de vista da moralidade – esvaem-se também recursos de pequenos contribuintes que recolhem parcelas de seus salários na esperança de garantir futura aposentadoria. A corrupção também pega em cheio alguns dos mais ricos fundos de pensão de estatais federais, como se revela nos casos do Postalis e do Funcef, respectivamente dos servidores dos Correios e da Caixa Econômica. Não escapam da mesma sanha o Petros (da Petrobras) e o Previ (Banco do Brasil).
A ligá-los há uma primeira coincidência: são todos administrados por gestores indicados pelo PT, PMDB e outros partidos. Uma segunda coincidência: todos se tornaram deficitários e incapazes de garantir a perpetuidade da seguridade prometida aos seus milhares de associados. E terceira: a ameaça de insolvência em que se encontram deve-se não apenas a gestões negligentes, imprudentes ou imperitas, mas também à má-fé. A ponto de se cometer fraudes documentais em que tintas corretoras de uso escolar foram utilizadas para adulterar cifras e cifrões.
O Postalis apresenta rombo de R$ 5,7 bilhões e, para tapá-lo, sua diretoria pretende recorrer ao mais usual artifício: obrigar aqueles que em nada contribuíram para o descalabro a pagar a conta mediante desconto, por longos 15 anos, de 26% de seus salários. O “furo” no Funcef é também superior a R$ 5,5 bilhões e o remédio encontrado para cobri-lo é semelhante, isto é, aumentar por 12 anos a alíquota de contribuição previdenciária dos empregados. Claro que nos dois casos as entidades de representação dos servidores movem medidas judiciais para que eles não sejam punidos com o corte de um quarto de seus salários.
Como os fundos de pensão movimentam cifras gigantescas, em boa parte oriundas diretamente também dos cofres públicos, sua crise administrativa e moral passa a ser assunto de interesse coletivo e que precisa ser investigada a fundo. Daí a iniciativa de alguns senadores de partidos de oposição visando à criação da CPI dos Fundos, mas o governo – por razões óbvias, mas nunca declaradas – se esforça para impedi-la. Já conseguiu, por exemplo, que a bancada do PSB retirasse suas assinaturas de um requerimento de instalação e articula outras medidas para enterrá-la de vez, embora a oposição siga tentando: na sexta-feira, dia 17, o líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima, disse ter as assinaturas necessárias para protocolar o pedido, e vai fazê-lo na próxima quarta-feira, dia 22.
Podemos nos espantar com a atitude do governo de querer empurrar para debaixo do tapete a necessária investigação dos fundos? Não. Pelo contrário, a sabotagem apenas expõe à luz do dia a hipocrisia de quem afirma que se deve ao atual governo o combate rigoroso à corrupção no país. Na verdade, não se deve ao governo, mas a instituições do Estado que, com independência, têm sido assertivas na tarefa de selar algumas das incontáveis frestas – como o que vêm fazendo, no caso emblemático da Operação Lava Jato, o Ministério Público Federal, a Polícia Federal e o Judiciário.
21 de abril de 2015
Editorial Gazeta do Povo, PR
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