Muitas vezes as pessoas dirigem-se a mim, dizendo: «você, que é independente». Não sou assim; continuamente devo ceder a pequenas fórmulas sofisticadas que corrompem, que dão um sentido inverso à nossa orientação, que fazem com que a transparência do coração se turve. Continuamente a nossa insegurança, o egoísmo, o espírito legalista, a mesquinhez, a vaidade, toda a espécie de circunstâncias que tomam o partido da vida como desfrute à sensação se sobrepõem à luz interior. Só a fé é independente. Só ela está para além do bem e do mal.
Estar para além do bem e do mal aplica-se a Cristo. «Perdoa ao teu inimigo, oferece a outra face» - disse Ele. Não é um conselho para humilhados, não é um preceito para mártires. Nisso aparece Cristo mal interpretado, a ponto de o cristianismo ter sido considerado uma religião de escravos. Mas esquecemos que Cristo, como Homem, teve a experiência-limite, uma visão do inconsciente absoluto, o que quer dizer que a sua consciência foi saturada, para além do bem e do mal. Esse homem que perdoa ao seu inimigo não o faz por contrariedade do seu instinto, por reparação dos seus pecados; mas porque não pode proceder de outra maneira.
A sua natureza simplificou-se; nada o pode abalar, porque ele desesperou para sempre da sua controvérsia e, possivelmente, da sua humanidade. A agonia do Homem é isto - a sua conversão à luz interior. Qualquer doutrina que professe a luta, seja doutrina social ou religiosa, impõe-se facilmente às massas, porque a luta bloqueia a evolução profunda do homem, a qual é motivo da sua angústia. Um sábio, grande figura bíblica, disse: «A causa do temor não é outra coisa senão a renúncia aos auxílios que procedem da reflexão».
Estar para além do bem e do mal aplica-se a Cristo. «Perdoa ao teu inimigo, oferece a outra face» - disse Ele. Não é um conselho para humilhados, não é um preceito para mártires. Nisso aparece Cristo mal interpretado, a ponto de o cristianismo ter sido considerado uma religião de escravos. Mas esquecemos que Cristo, como Homem, teve a experiência-limite, uma visão do inconsciente absoluto, o que quer dizer que a sua consciência foi saturada, para além do bem e do mal. Esse homem que perdoa ao seu inimigo não o faz por contrariedade do seu instinto, por reparação dos seus pecados; mas porque não pode proceder de outra maneira.
A sua natureza simplificou-se; nada o pode abalar, porque ele desesperou para sempre da sua controvérsia e, possivelmente, da sua humanidade. A agonia do Homem é isto - a sua conversão à luz interior. Qualquer doutrina que professe a luta, seja doutrina social ou religiosa, impõe-se facilmente às massas, porque a luta bloqueia a evolução profunda do homem, a qual é motivo da sua angústia. Um sábio, grande figura bíblica, disse: «A causa do temor não é outra coisa senão a renúncia aos auxílios que procedem da reflexão».
Ligados todos por uma igual cadeia de trevas, os homens julgam superar os factos por meio duma acção violenta. Dispersam os seus fantasmas prodigiosos durante algum tempo, mas logo são surpreendidos por inesperados terrores. A melhoria das suas condições de trabalho, o direito ao lazer e à cultura, a protecção à saúde e à velhice, tudo isso foi uma necessidade imposta pelos factos, mas só actua como lei se for manifestado pela reflexão.
A doutrina perfeita nem ofende a multidão nem se arroja a seus pés. Não é feita de belas palavras nem dum folclore de atitudes. A natureza combate pelos justos. Essa natureza é a fé.
11 de janeiro de 2015
Agustina Bessa-Luís, pseudónimo literário de Maria Agustina Ferreira Teixeira Bessa, é uma escritora portuguesa de 92 anos - nascida em 15 de outubro de 1922. Originalmente publicado in 'Contemplação Carinhosa da Angústia'.
Agustina Bessa-Luís, pseudónimo literário de Maria Agustina Ferreira Teixeira Bessa, é uma escritora portuguesa de 92 anos - nascida em 15 de outubro de 1922. Originalmente publicado in 'Contemplação Carinhosa da Angústia'.
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