Após vinte anos de terminada a casa, os azulejos da cozinha estavam soltos e ameaçando cair na minha cabeça. As paredes pareciam grávidas com a bolha que formavam. Causa? Espaçamento menor que o especificado. Com a dilatação nos verões e contração nos invernos, sem espaço para expansão, tinham de empenar. Ou espernear.
Parece até que estou falando dos presídios superlotados de Banânia. Mas não nos dispersemos. Estou contando do purgatório em que este engenheiro se encontra – para chegar à remissão dos pecados. Quem já reformou um banheiro ou uma cozinha – sem sair de casa – sabe do que estou falando.
Acredito que tudo na vida acontece para que paguemos nossas dívidas ou aprendamos (descubramos) alguma coisa.
O que descobri? Que a melhor coisa que já me aconteceu foi ter escolhido o magistério e não a construção civil. Não sei mandar. Não tenho paciência para corrigir o erro de um pedreiro, repetir a correção no outro dia e ao fim do terceiro dia voltar do almoço e ver que a mesma bobagem foi cometida – e de uma forma que o conserto vai custar caro e demorar a ser executado. É sempre assim com o erro: trabalho triplo: faz, desfaz, faz de novo. Pelo menos para uma coisa este sofrimento serviu: inspirou o artigo de utilidade pública que após essa longa introdução – começo agora.
O que caracteriza um bom pedreiro?
É preciso que o sujeito saiba usar direito o nível de mangueira, a linha, o fio de prumo e a régua, e tenha noção de o que é e para que serve o esquadro. Com um pouco de prática, isso faz a diferença entre ajudante e pedreiro. Bem, daí a ser um bom pedreiro, vai légua e meia de distância. O bom pedreiro sabe usar esse conhecimento – e o usa – de maneira correta e honesta – SEMPRE.
O mau pedreiro sabe mas não o usa sempre. Só com isso, você pode escolher o pedreiro e descartar o ajudante, que não sabe usar todos os instrumentos, mas só a observação constante do trabalho é que permite a identificação do bom pedreiro. Não me venha com argumentos sobre “intuição”, é balela. Quase todas as vezes que confiei nela, me ferrei.
Engraçado… ocorreu-me agora que isso vale para todas as profissões. Cada uma usa uns poucos “instrumentos” regulares. Quem os identifica, sabe usar e os usa de forma correta (honesta) – sempre – é um bom profissional. Quem os usa só de vez em quando – um mau trabalhador. A correção (honestidade) é a ferramenta principal, obrigatória em toda e qualquer profissão (você pergunta: e os políticos? Respondo: também!).
Raciocine comigo: um banqueiro que é honesto em 95% do dia é confiável? Um advogado “de princípios” que segue a mais pura ética em 97% de seus casos é honesto? Um político que fala quase sempre a verdade e só minta quando acha conveniente, merece seu voto? E um assaltante que só assalta e mata em 5% do seu tempo acordado seria um bom cidadão?
Aonde quero chegar? À uma conclusão radical. Ou tudo – ou nada.
Quem não é totalmente honesto é um desonesto e nisso não existem nuances. Preto ou branco, qualquer meio termo corte-se a mão direita. É preferível lidar com o completo canalha do que com o que é canalha só de vez em quando.
Com o primeiro todos sabemos lidar. E o outro? Sempre encontrará um advogado que tentará compensar os seus 5% de crime ou canalhice com aquele tempo em que é bom pai ou vizinho ou até quem sabe “assobiava tão bem”.
Cecília Meireles escreveu: “o que merece ser feito, merece ser bem feito” ao que alguém acrescentou: “e o que merece ser bem-feito – merece ser perfeito”.
Em algum ponto da Bíblia, citando de memória, existe a frase: “Seja quente ou seja frio, o morno eu vomito”. E “Seja o vosso falar: sim, Sim – não, Não. Tudo o que disso passa provem do maligno”.
Não é tudo a mesma coisa? Ora bolas, seja tudo ou seja nada. Ser bonzinho enquanto está dormindo não te torna só meio mau se você dorme muito…
Se v. não gostou desse artigo, certamente gostará do que escreveu Fábio Porchat, aqui: http://cultura.estadao.com.br/noticias/geral,errar-e-proibido-imp-,1603429 – Com boa argumentação, ele chega à conclusões radicalmente opostas ao que escrevi acima. Prá você ver que neste mundo há lugar para as diferenças, e neste blog também.
18 de dezembro de 2014
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