"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 24 de junho de 2014

POUCA MUDANÇA

Discursos na convenção do PT não ocultam contradições do partido e repetem visão estereotipada sobre o debate político brasileiro

Continuidade e mudança: este seria o eixo que, nominalmente, orienta a campanha pela reeleição de Dilma Rousseff à Presidência da República. Não sem habilidade, o lema procura dar conotação positiva às atuais dificuldades da postulação petista.

Com a popularidade em baixa, num clima de pessimismo econômico, Dilma não tem como se apresentar ao eleitorado sem acenar com alguma correção de rumos.

Ao mesmo tempo, busca reassegurar os que a apoiam --e a manutenção das políticas sociais aprofundadas a partir do governo Lula constitui, por assim dizer, o marco mínimo a partir do qual traçar o discurso de campanha.

Embora o binômio da continuidade e da mudança expresse um equilíbrio retórico delicado, não se trata, em tese, de nenhuma quadratura do círculo. Mas os problemas dessa formulação se amplificam quando se tenta concretizá-la.

Vieram acrescidos de sérias contradições, aliás, na cerimônia de oficialização da candidatura Dilma, ocorrida neste sábado (21).

Mudanças, por certo, são necessárias; mas quais? Além de promessas requentadas sobre desburocratização, universalização da banda larga e reforma política, em torno de que prioridades se aglutina o heterogêneo espectro de alianças partidárias que, agora com a exceção do PTB, supostamente daria base parlamentar aos projetos legislativos de Dilma?

Quanto à "continuidade", tampouco é claro o que significa. Até mesmo os setores mais entusiastas do petismo sabem que a lista das demandas sociais tende a ser inesgotável, e que a pauta de benefícios agora colocada pela sociedade é de outra natureza.

A bandeira da continuidade só se sustenta, em termos eleitorais, por meio de outro recurso: o da demonização do adversário. Seria para evitar uma "volta ao passado" --com o fantasma de um declínio no nível de renda dos mais pobres-- que valeria a pena manter tudo como está.

Surge a partir daí um outro binômio, este sim perverso, na orientação da campanha petista. Enquanto a candidata Dilma Rousseff aposta num perfil mais simpático e aberto ao diálogo com outros setores da sociedade, em especial o empresariado, Lula e outras figuras do PT alimentam a sede de maniqueísmo da militância.

Na convenção de sábado, alternou-se a atitude vitimizante que atribui a conspirações de direita o "ódio" contra o PT e o discurso inverso, o do ataque indiscriminado. Nesse mar de contradições em que o partido navega, o dedo apontado contra as "elites brancas" não impede a mão estendida a antigos defensores do regime militar.

 
24 de junho de 2014
Editorial Folha de SP

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