"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 15 de abril de 2014

TEMERIDADE FISCAL

Congresso ignora riscos de revisar dívida de Estados e municípios em meio à deterioração das contas públicas; Planalto se omite
É um tanto estranha a passividade recente do governo federal na tramitação do Projeto de Lei complementar que muda os encargos financeiros das dívidas dos Estados e municípios.
Aprovado pela Câmara dos Deputados no ano passado, o projeto passou nesta semana por comissões do Senado e segue para o plenário. A alteração principal, e a mais polêmica, é a redução dos juros de forma retroativa.

No ano passado o Planalto chegou a patrocinar a iniciativa, para aliviar em especial a Prefeitura de São Paulo, com óbvio objetivo eleitoral. A deterioração das contas públicas, porém, forçou um recuo.

Agora, novamente, o Congresso se move sem que se perceba objeção do Executivo. À luz da baixa credibilidade atual da política econômica, é temerário passar a impressão de que se aceita um afrouxamento da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Entre 1997 e 2000, a União assumiu as dívidas de Estados e municípios, que se comprometeram com várias metas fiscais. O pagamento do débito seria em 30 anos, com reajuste pelo IGP-M mais juros que variam de 6% a 9% ao ano.

Se aprovado, o projeto mudará o indexador, a partir de janeiro de 2013, para IPCA mais 4% ao ano, ou para a taxa básica Selic -o que for menor. Ademais, o saldo devedor será recalculado desde o início dos contratos com base na Selic.

O resultado será um belo desconto no valor principal, para alguns casos. Estima-se que a dívida da Prefeitura de São Paulo, que paga juros de 9% ao ano além da correção monetária, cairia de R$ 54 bilhões para R$ 30 bilhões. Haveria, assim, espaço para a tomada de novos empréstimos.

A redução dos juros tem sua razão de ser, pois são muito elevados para o padrão atual da economia. É correta, portanto, sua revisão -daqui para a frente.

A mudança retroativa, contudo, é preocupante, pois estimula endividamento adicional. A dívida consolidada do setor público crescerá. A mensagem de frouxidão nas contas torna-se clara.

A despeito dos méritos eventuais do projeto, o momento não é propício. Além da insegurança que reina na economia, o ano é de eleições, e ajustes protelados cobrarão seu preço em 2015. Será necessário um forte aperto orçamentário, e não apenas do governo federal.

Estão pendentes, ainda, outras matérias que envolvem relações entre os entes da Federação, como a reforma do ICMS e os critérios de partilha, o que certamente demandará recursos da União.

O ideal é considerar esses assuntos de forma integrada. Quanto às dívidas, o melhor é aguardar e voltar ao tema após o pleito.

15 de abril de 2014
Editorial Folha de SP

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