Congresso ignora riscos de revisar dívida de Estados e municípios em meio à deterioração das contas públicas; Planalto se omite
É um tanto estranha a passividade recente do governo federal na tramitação do Projeto de Lei complementar que muda os encargos financeiros das dívidas dos Estados e municípios.
Aprovado pela Câmara dos Deputados no ano passado, o projeto passou nesta semana por comissões do Senado e segue para o plenário. A alteração principal, e a mais polêmica, é a redução dos juros de forma retroativa.
No ano passado o Planalto chegou a patrocinar a iniciativa, para aliviar em especial a Prefeitura de São Paulo, com óbvio objetivo eleitoral. A deterioração das contas públicas, porém, forçou um recuo.
Agora, novamente, o Congresso se move sem que se perceba objeção do Executivo. À luz da baixa credibilidade atual da política econômica, é temerário passar a impressão de que se aceita um afrouxamento da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Entre 1997 e 2000, a União assumiu as dívidas de Estados e municípios, que se comprometeram com várias metas fiscais. O pagamento do débito seria em 30 anos, com reajuste pelo IGP-M mais juros que variam de 6% a 9% ao ano.
Se aprovado, o projeto mudará o indexador, a partir de janeiro de 2013, para IPCA mais 4% ao ano, ou para a taxa básica Selic -o que for menor. Ademais, o saldo devedor será recalculado desde o início dos contratos com base na Selic.
O resultado será um belo desconto no valor principal, para alguns casos. Estima-se que a dívida da Prefeitura de São Paulo, que paga juros de 9% ao ano além da correção monetária, cairia de R$ 54 bilhões para R$ 30 bilhões. Haveria, assim, espaço para a tomada de novos empréstimos.
A redução dos juros tem sua razão de ser, pois são muito elevados para o padrão atual da economia. É correta, portanto, sua revisão -daqui para a frente.
A mudança retroativa, contudo, é preocupante, pois estimula endividamento adicional. A dívida consolidada do setor público crescerá. A mensagem de frouxidão nas contas torna-se clara.
A despeito dos méritos eventuais do projeto, o momento não é propício. Além da insegurança que reina na economia, o ano é de eleições, e ajustes protelados cobrarão seu preço em 2015. Será necessário um forte aperto orçamentário, e não apenas do governo federal.
Estão pendentes, ainda, outras matérias que envolvem relações entre os entes da Federação, como a reforma do ICMS e os critérios de partilha, o que certamente demandará recursos da União.
O ideal é considerar esses assuntos de forma integrada. Quanto às dívidas, o melhor é aguardar e voltar ao tema após o pleito.
15 de abril de 2014
Editorial Folha de SP
Aprovado pela Câmara dos Deputados no ano passado, o projeto passou nesta semana por comissões do Senado e segue para o plenário. A alteração principal, e a mais polêmica, é a redução dos juros de forma retroativa.
No ano passado o Planalto chegou a patrocinar a iniciativa, para aliviar em especial a Prefeitura de São Paulo, com óbvio objetivo eleitoral. A deterioração das contas públicas, porém, forçou um recuo.
Agora, novamente, o Congresso se move sem que se perceba objeção do Executivo. À luz da baixa credibilidade atual da política econômica, é temerário passar a impressão de que se aceita um afrouxamento da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Entre 1997 e 2000, a União assumiu as dívidas de Estados e municípios, que se comprometeram com várias metas fiscais. O pagamento do débito seria em 30 anos, com reajuste pelo IGP-M mais juros que variam de 6% a 9% ao ano.
Se aprovado, o projeto mudará o indexador, a partir de janeiro de 2013, para IPCA mais 4% ao ano, ou para a taxa básica Selic -o que for menor. Ademais, o saldo devedor será recalculado desde o início dos contratos com base na Selic.
O resultado será um belo desconto no valor principal, para alguns casos. Estima-se que a dívida da Prefeitura de São Paulo, que paga juros de 9% ao ano além da correção monetária, cairia de R$ 54 bilhões para R$ 30 bilhões. Haveria, assim, espaço para a tomada de novos empréstimos.
A redução dos juros tem sua razão de ser, pois são muito elevados para o padrão atual da economia. É correta, portanto, sua revisão -daqui para a frente.
A mudança retroativa, contudo, é preocupante, pois estimula endividamento adicional. A dívida consolidada do setor público crescerá. A mensagem de frouxidão nas contas torna-se clara.
A despeito dos méritos eventuais do projeto, o momento não é propício. Além da insegurança que reina na economia, o ano é de eleições, e ajustes protelados cobrarão seu preço em 2015. Será necessário um forte aperto orçamentário, e não apenas do governo federal.
Estão pendentes, ainda, outras matérias que envolvem relações entre os entes da Federação, como a reforma do ICMS e os critérios de partilha, o que certamente demandará recursos da União.
O ideal é considerar esses assuntos de forma integrada. Quanto às dívidas, o melhor é aguardar e voltar ao tema após o pleito.
15 de abril de 2014
Editorial Folha de SP
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