"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 5 de abril de 2014

REMÉDIO AMARGO

 

O aprendizado da democracia é longo e difícil em países subdesenvolvidos, mesmo nos que se orgulham de ser chamados de emergentes. Demanda paciência para, em nome da liberdade de expressão, que precisa ser respeitada, dar espaço não apenas para manifestações que revelam ignorância, como para as que afrontam a verdade e atropelam o conhecimento em nome de algum propósito político. É assim com as decisões das autoridades encarregadas de evitar a disparada da inflação, flagelo que assolou este país por décadas, até o lançamento do Plano Real, em 1994.
Se o Banco Central reduz a taxa de juros, não faltam os que - orientados por uma escola voluntarista e autoritária, que esteve em alta nos tempos do regime militar e nos primeiros anos depois dele - festejam, como se isso fosse uma heroica vitória sobre banqueiros e rentistas (gente que tem dinheiro para aplicar). Pouco se importam se a medida é sustentável, se foi tomada na hora certa, ou apenas mais uma aventura orientada pelo marketing político-eleitoral.

Mas se a decisão vai no sentido oposto e, pior ainda, se repetindo por meses, o discurso costuma focar nos efeitos colaterais negativos da medida, como se ninguém soubesse que juros altos inibem a expansão da produção e tendem a retardar o crescimento da economia. Pior é tolerar "especialistas" que apregoam que juros altos não barram a inflação, fingindo não saber que há um descompasso natural entre as decisões de política monetária e seus efeitos no dia a dia das pessoas, e que o aperto na taxa de juros é só a segunda parte do dever de casa. A primeira tem a ver com a gastança governamental.

Na quarta-feira, o BC aprovou mais uma elevação (a nona consecutiva em 12 meses) da taxa básica de juros (Selic), que passou a ser de 11% ao ano. Ou seja, durou pouco a redução forçada dessa taxa em 2012. Não faltaram aplausos em agosto daquele ano, quando a Selic baixou a históricos 7,25% ao ano. Mas, como em economia nada acontece por simpatia ou reza, a inflação logo deu o troco, demonstrando que ainda era cedo para colocá-la em segundo plano.

O governo manteve e até ampliou os gastos. Prova disso é que o superavit primário (economia de verbas públicas para abater o saldo da dívida) despencou de 3,73% do PIB para apenas 1,76% em fevereiro de 2014. E também é verdade que o BC demorou mais do que devia para se libertar da aventura da frouxidão monetária. Reagiu com atraso e a conta-gotas. A taxa alcançada esta semana já deveria estar valendo desde a virada do ano.

Ainda é cedo para apostar que a escalada dos juros já pode parar. O desgaste da credibilidade do governo em relação à contenção de gastos não autoriza expectativas otimistas. O BC, ao que tudo indica, continuará lamentavelmente sozinho na luta contra a perda de poder de compra dos salários do trabalhador. Resta a esperança de que o governo perceba que o eleitorado está sentindo que o aumento dos preços não ocorre só por culpa dos hortigranjeiros e passe a levar a sério seu dever de casa.

05 de abril de 2014
Editorial Correio Braziliense

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