Transações que implicaram prejuízos para a estatal têm o fio condutor do tráfico de influência. Os fatos são graves e o país cobra sua apuração
Presos à quase monocórdica argumentação de que a convocação de uma CPI para investigar obscuras transações na Petrobras, a poucos meses das eleições, se trata de jogo político da oposição, o PT e seus aliados no Congresso e no governo federal escamoteiam a questão central do caso. O foco, que tentam esmaecer, está no fato de que diretores da estatal foram apanhados em “malfeitos”. Um deles sugerido pela própria presidente Dilma Rousseff, em nota que julgou necessária para explicar como foram aprovadas as inusitadas condições de compra de uma refinaria em Pasadena (Texas). O fato ocorreu em 2006, no governo Lula, quando ela acumulava a chefia da Casa Civil e a presidência do Conselho de Administração da estatal. Segundo Dilma, a decisão foi tomada com base em relatório “tecnica e juridicamente falho”.
Há evidências de que negócios nebulosos resultaram em prejuízos bilionário aos acionistas. Falta no mínimo bom senso quando se procura dar como positiva a compra da refinaria no Texas: primeiro, a Petrobras pagou US$ 360 milhões por metade de uma empresa que, pouco antes, fora adquirida, inteira, por US$ 42, 5 milhões, pelo grupo belga Astra Oil; depois, adquiriu o controle, pagando US$ 1,2 bilhão. É questão que precisa ser esclarecida, porque põe em jogo a credibilidade da estatal. Mas não é caso único e isolado.
Estão à espera de explicações negócios igualmente exóticos, por obscuros, como a operação para a construção, em curso, da refinaria Abreu e Lima (PE). Orçada em US$ 2 bilhões, a obra prospecta hoje uma sangria de US$ 18 bilhões — nove vezes o orçamento de partida. O GLOBO publicou recentemente reportagem sobre outra compra, uma refinaria no Japão, pela qual pagou-se, em 2008, US$ 71 milhões, e onde já se enterraram US$ 200 milhões — sorvedouro do qual a estatal procura se livrar, sem sucesso.
Por essas transações perpassa o fio do tráfico de influência, outro aspecto a ser seriamente enfrentado nessa sucessão de negócios mal explicados na empresa controlada pelo Estado. Para variar, este é um ponto também escamoteado pelo PT e aliados, por eles tratado como “interesses eleitoreiros da oposição”. Mas as evidências são inquestionáveis. Na compra de Pasadena estavam as digitais de Nestor Cerveró, à época diretor da área internacional da empresa, ungido por lideranças do PMDB e do PT. O ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa, ligado à operação da Abreu e Lima, hoje recolhido à prisão por lavagem de dinheiro, foi outro protegido pelo PP, PMDB e PT.
O discurso lulopetista em defesa dessas ações, desqualificando qualquer crítica à Petrobras como parte de supostas campanhas “neoliberais” para “privatizar” a empresa-símbolo da recente industrialização brasileira, é tanto previsível quanto irreal, e até risível. É, sim, velho truque eleitoreiro, por sinal já usado pelo PT. O que importa são os fatos. Eles estão aí, são graves, e o país cobra sua apuração.
05 de abril de 2014
Editorial O Globo
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