Num tempo que hoje nos parece antediluviano, nosso messias, recém-eleito deputado federal, debochou da Câmara Federal dizendo que ela abrigava 300 picaretas.
O passar do tempo cuidou de aparar as arestas. Bastou que a necessidade surgisse para que nosso pitoresco personagem fizesse as pazes com os parlamentares. Afagou a cabeça de todos e chegou até a beijar a mão de algum deles.
Quem te viu, quem te vê! ― como diria o outro.
No fim de agosto 2013, os mesmos picaretas da mesma Câmara foram convocados a se exprimir, em votação secreta, sobre a cassação do mandato de um colega deputado. O homem tinha sido acusado, julgado e já condenado definitivamente. Estava preso por crime de peculato e formação de quadrilha.
Dos 513 deputados, 108 gazetearam ― simplesmente não compareceram à sessão. Dos 405 que votaram, 172 se posicionaram pela manutenção do mandato do deputado criminoso.
Somando-se os 172 que negaram a cassação aos 108 que se esgueiraram, chegamos ao total de 280. São os que não enxergam nenhum mal em continuar a ser colegas de um presidiário condenado a 13 anos de cárcere.
De lá para cá, o clamor popular cresceu. A Câmara foi pressionada a mudar as regras. Nunca mais ― prometem de pés juntos ― um caso de quebra de decoro será decidido pelo voto secreto.
O deputado que havia sido salvo pelo sigilo corporativo no ano passado voltou a passar pelo crivo de seus colegas. Desta vez, o voto foi aberto. Com exceção de um deputado ― unzinho só! ― os 280 que, escondidos atrás do voto anônimo, tinham votado pela manutenção do mandato do deputado criminoso, desapareceram. São todos pela cassação. Desde criancinhas, ora vejam só.
O dicionário ensina:
Picareta = pessoa aproveitadora, que utiliza meios condenáveis para obter o que deseja.
Covarde = quem age com temor; quem não apresenta valentia.
A visão que nosso guia tinha da Câmara passou da data de validade, está vencida. É impensável que, depois de 8 anos de convivência amistosa com 3 em cada 4 parlamentares, ele repetisse hoje a bravata segundo a qual aquela Casa acolhe 300 picaretas.
Quanto a mim, ainda fico com a definição originária. A conta do antigo presidente da República não está nada exagerada. Pior ainda: os 300 indigitados, além de picaretas, são covardes.
Valei-nos São Judas Tadeu, o advogado das causas impossíveis!
13 de fevereiro de 2014
José Horta Manzano
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