"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

ENTREVISTA: AÉCIO NEVES

Senador mineiro, pré-candidato à Presidência da República, diz que as manifestações desfizeram a imagem, construída pelo governo, de um país sem problemas, de superação da miséria, de eficiência

Texto: Sueli Cota | Fotos:                            


Como principal candidato das oposições, segundo as pesquisas, o presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves, acredita que o favoritismo da presidente Dilma ficará abalado assim que começar o horário eleitoral gratuito.
O monólogo terá fim e, na defensiva, a presidente terá que responder às críticas, com isso, o PSDB vai avançar. “No segundo turno, os favoritos somos nós, e não o governo”, diz Aécio, que será o primeiro palestrante do ano, no dia 14 de fevereiro, no Conexão Empresarial, evento promovido pela VB Comunicação.
Conhecido pela sua habilidade em transitar tanto no campo adversário quanto entre os aliados do governo, ele já se articula para formar uma forte aliança em torno do seu projeto de governo e para fortalecer os palanques nos estados. Guiado pelas muitas pesquisas que analisam o comportamento do eleitorado, entende que há um forte sentimento de mudança, observado nas manifestações de rua que surpreenderam pelo caráter suprapartidário, que não foi entendido pelo governo.
“Os movimentos das ruas rasgaram a fantasia do PT.”  Com palavras de ordem como tolerância zero para a inflação e herança maldita da administração petista, Aécio pretende tornar-se candidato oficial do PSDB em solo paulista, em março.
“Quem sabe, após 60 anos, Minas tenha um presidente da República eleito pelo voto.”
 
Há algum simbolismo na escolha de São Paulo para o lançamento da sua candidatura à Presidência?
Foi um convite da direção do PSDB de São Paulo, feito pelo presidente Duarte Nogueira, que considera que seria um gesto de reciprocidade, já que a campanha de Geraldo Alckmin, quando se candidatou em 2006, foi lançada em Belo Horizonte. Essa é a primeira eleição, desde a redemocratização, em que o PSDB não terá um candidato de origem paulista e por ser o maior colégio eleitoral do Brasil. 
 
A estratégia é a de concentrar as ações em São Paulo e estados do Nordeste?
Não há como você ter prioridades em uma caminhada como essa. Em primeiro lugar, não sou ainda o candidato do partido. A ideia é a de que essa definição ocorra até o final de março. Mas, mesmo antes disso, como presidente nacional do PSDB, estive, desde julho do ano passado, em mais de 20 estados, de todas as regiões, realizando encontros extremamente densos e discutindo as bases do nosso programa de governo, política ambiental na Amazônia, políticas regionais no Nordeste, questões do agronegócio no Sul e no Centro-Oeste. Inúmeros encontros em São Paulo, com foco na preocupação com a desindustrialização. Não é um processo que se inicia agora. O que vamos fazer a partir de fevereiro é retomar a agenda de viagens, caminhando pelo Brasil inteiro. Pretendo intercalar essas visitas a outros estados com (visitas) a várias regiões de Minas.
 
Marina Silva virou um problema para o senhor na negociação com o PSB em alguns estados, inclusive em Minas?
Não, de forma alguma. Acho que a presença da Marina na disputa, ao lado do Eduardo Campos, é saudável. A Marina traz temas importantes para o debate eleitoral, oxigena essa disputa. Da mesma forma, o Eduardo. Quem tentou, como pôde, inibir outras candidaturas foi o PT. Seja do ponto de vista congressual, quando atuou para impedir a criação do partido da Marina, seja do político, quando tentou inviabilizar a candidatura de Eduardo através da cooptação de seus aliados, e acabou levando alguns deles, como é o caso do Ceará. Mas nós achamos que era importante que outras forças políticas participassem do processo eleitoral. O PSDB nunca temeu essa participação. Ao contrário, a minha expectativa é de que, no momento em que forças políticas que militavam no governo, como é o caso da Marina e do próprio Eduardo, que foi ministro do Lula, passam a militar no campo da oposição, isso tem que ser saudado por nós como algo extremamente positivo. Mas eu tenho confiança plena de que o PSDB, pela clareza do seu discurso, pela estrutura que tem em todo o Brasil, pela força das suas lideranças, é quem representará a mudança de verdade, pela qual quase 70% da população brasileira clama. Estou extremamente confiante em que o PSDB tem todas as condições de chegar ao segundo turno e, aí, o jogo se inverte, os favoritos somos nós, e não o governo.
 
O senhor sempre reclamou, nas eleições passadas, de que o PSDB precisava de um projeto claro de governo. Já tem claro o que é preciso fazer?
Nós fizemos, no final do ano passado, no dia 13 de dezembro, o lançamento das diretrizes básicas desse projeto, que foi fruto de tudo aquilo que nós buscamos ou nós elegemos nesses debates, seminários e encontros regionais, e que serão a base da construção do nosso plano de governo. Ele será coordenado pelo governador Anastasia, a partir do final do mês de março, quando ele deve deixar o governo do estado, no prazo final de desincompatibilização. 
 
Quais são elas?
Passa por questões que, para nós, sempre foram muito claras. A eficiência da gestão pública para combater a crônica deficiência do atual governo do PT. A meritocracia como antítese a esse aparelhamento perverso e absurdo da máquina pública feita pelo PT. Uma visão de mundo muito mais atual e pragmática do que essa atrasada visão ideológica do Brasil, que tem nos levado a alianças que em nada têm ampliado os nossos mercados e contribuído para o crescimento da economia. Uma visão muito mais solidária de estados e municípios para nos contrapormos a esse centralismo absurdo do governo  federal, que vem transformando o Brasil não mais em uma Federação, mas em um estado unitário, com estados e municípios cada vez mais dependentes da União. Uma ação firme e decisiva na coordenação de política de segurança nacional para nos contrapormos à absoluta omissão do governo federal nessa questão, inclusive com um esforço maior no financiamento da segurança pública. Hoje, 87% de tudo o que se gasta em segurança vêm dos estados e dos municípios e apenas 13% da União. O Fundo Penitenciário, aprovado no Congresso, nos últimos 3 anos de governo da atual presidente, teve apenas 10,5% do seu valor executado, o que mostra o descaso e a omissão nessa questão. Em relação à saúde, houve, durante um período do governo do PT, queda de 54% de participação do governo federal no total de financiamento da saúde para apenas 45% hoje, o que mostra, também, nessa gravíssima questão, a grande omissão do governo federal. Nós temos que resgatar a Federação no Brasil, estabelecermos a meritocracia e, no campo econômico, uma política fiscal transparente, que resgate a credibilidade perdida do Brasil, com tolerância zero à inflação, e que nos permita crescer de forma mais sustentável para sairmos do final da fila. O Brasil cresceu no ano passado apenas mais do que a Venezuela, na América do Sul. A equação econômica do governo que a presidente Dilma nos deixará, essa sim uma herança maldita, se resume em crescimento pífio, inflação alta e maquiagem dos dados fiscais, que tem como consequência a enorme perda de credibilidade do Brasil. 
 
O governo tem conseguido se manter bem perante a opinião pública, mesmo com esses indicativos que o senhor está citando. Parece que nada atinge o governo do PT?
Ao contrário. Aparece em todas as pesquisas um dado que é relevante. Dois terços da população querem mudanças profundas. Só que o que existe hoje é quase um monólogo. Hoje os grandes veículos de comunicação de massa não falam no governo, falam na presidente apenas. Isso não permanecerá durante o processo eleitoral. Portanto, estou convencido de que o governo terá que fazer uma campanha na defensiva. A inflação já é, sim, um problema para boa parte das famílias brasileiras. Estamos com a inflação no teto da meta, existindo há muitos anos. Isso porque nós temos preços controlados de combustíveis, de energia e de transportes públicos. Na hora em que destampar a tampa dessa panela, vamos ter a inflação média chegando a em torno de 9%.  A cesta básica nos últimos 12 meses, em 16 capitais pesquisadas, está acima de 10%. Em Salvador, chega a 17%. Uma inflação na vida cotidiana das pessoas, porque o governo geriu mal a economia, flexibilizou os pressupostos básicos dos pilares fundamentais que foram herdados do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso.
   
A eleição deste ano terá componentes diferentes motivados pelos protestos. O senhor entendeu o recado das ruas?
É um recado claro para toda a classe política. A população está cansada da ineficiência dos serviços, do desleixo com o dinheiro público, das sucessivas denúncias de corrupção. Ela clama por valores, por novas oportunidades. As respostas que o governo federal buscou dar, com uma agenda absolutamente descolada da realidade do Brasil e desse sentimento das pessoas, como a pífia reforma política, que foi a mais eloquente delas, não respondeu em absolutamente a essas expectativas. Nós não trabalhamos esses eventos como um ativo eleitoral. Se ocorrerem, os governantes, todos eles, têm que estar prontos para dar as respostas. Mas é algo que nós, democratas, temos que compreender. As pessoas hoje estão inquietas, insatisfeitas com o que está acontecendo. Agora, o governo federal, que vendeu aos brasileiros um nirvana, um país onde só existiam virtudes, que não tinha problemas, que superou a miséria, que tem suas empresas públicas geridas com a maior eficiência, esse país da fantasia se desfez. Esses movimentos rasgaram a fantasia do PT. 
 
Que alianças o senhor vai buscar nessas eleições? O PMDB, por exemplo, demonstra insatisfação com o governo.
Essas alianças são consequência da capacidade que você tenha ou não de apresentar um projeto viável. A nossa preocupação neste momento é apresentar ao Brasil um projeto exequível, que recomponha a credibilidade da nossa economia e aponte para cenário de crescimento sustentável por um bom período. As alianças são consequência disso. O que posso antecipar é que cada estado é uma realidade, e nós teremos, certamente, apoios em vários deles, de forças políticas, mesmo estando em nível nacional, de alguma forma, alinhadas a este governismo de cooptação, porque não tem nada de coalisão, tem é de cooptação através de cargos públicos. Mas não se consegue cooptar todos. 
 
O senhor acha que vai ser possível se aliar ao PSB em Minas Gerais? Existe a possibilidade de palanque duplo?
O PSB é aliado do PSDB em muitos estados, inclusive em Minas, desde o meu primeiro mandato. Essa é uma aliança absolutamente natural, e eu acredito que ela possa ser mantida, sim, como será em outros estados. Tenho conversado com o governador Eduardo Campos, e o nosso entendimento é o de que vamos deixar que as situações regionais, locais caminhem sem qualquer intervenção nossa. O que eu percebo é que o PSB terá, em muitos estados, alianças com o PSDB e pouquíssimas com o PT, o que é uma sinalização importante em relação ao segundo turno.
 
A eleição terá um capítulo à parte na internet. O PT está lançando, inclusive, cartilha para a militância e o PSDB, como vai trabalhar com as mídias sociais?
O PT sempre utilizou a internet para fazer uma guerrilha que foge aos padrões éticos que deveriam orientar a disputa política e vai continuar nesse mesmo caminho, não é nenhuma novidade. Agora talvez mais, com financiamento maior e parte até com financiamento público, já estão montando um verdadeiro exército na internet. Obviamente, nós temos que estar atuando. Vamos usar a internet para difundir ideias, debater o nosso programa, mobilizar as nossas forças. O PT costuma usar a internet para fazer, como fez recentemente com o Eduardo Campos, como faz permanentemente em relação aos seus opositores, o jogo da calúnia, da difamação, da desconstrução. Mas eu acredito muito no bom senso das pessoas. Se não acreditasse, não estaria na política. Esse esforço hercúleo que é feito na internet, da difamação permanente, acaba tendo um resultado absolutamente inócuo. As pessoas têm capacidade de discernir o que é certo e o que é errado. 
 
A atuação do senhor na televisão também pode fazer a diferença?
A nossa campanha será a da verdade. A presidente da República fará uma campanha na defensiva porque falharam na condução da economia. Falharam na gestão do estado, porque o Brasil é hoje um grande cemitério de obras inacabadas. Demonizaram por mais de 10 anos as concessões e as fazem agora de forma açodada, envergonhada e com absoluta falta de planejamento. Mesmo no campo social, onde se apregoam os grandes construtores de uma nova realidade no Brasil,  os efeitos são muito  limitados, daquelas antigas ações, na verdade,  herdadas do governo do presidente Fernando Henrique. Não houve nada novo. A saúde é trágica para grande parte da população. A segurança pública aflige brasileiros de todas as regiões, de todas as classes sociais. Na educação, também estamos no final da fila nos principais institutos de avaliação internacionais. No caso especificamente de Minas, a presidente tem muitas explicações a dar, porque o estado foi absolutamente preterido ao longo desses 12 anos de governo do PT. 
 
Como?
Seja em relação a investimentos programados, seja pelo setor automotivo que foram para outros estados. O metrô não terá no governo da presidente Dilma um centímetro sequer de expansão. Nas prometidas obras da BR–381, o governo apresenta um programa que atende a apenas 25% . O Anel Rodoviário prometido lá atrás, ainda pelo presidente Lula, foi transferido para o estado devido à incapacidade do governo. 
 
O senhor já definiu quem vai ser o marqueteiro? 
Nós não temos o candidato ainda, só depois de março. O que posso adiantar é que nós não teremos, aí, um marqueteiro, um salvador da pátria, como o PT. O marqueteiro do PT tem status de primeiro-ministro de estado. Se ele ligar para o ministro da Fazenda, é atendido no primeiro toque, tamanha a importância dele para o atual governo. Mas por que isso? Porque é o governo do marketing. Tem poucos resultados a apresentar e precisa privilegiar o marketing. Nós teremos pessoas competentes na área de comunicação, que nos permitam difundir nossas ideias, dar a elas visibilidade. 
 
Acredita que essa será uma campanha cara, mas também difícil para se arrecadar recursos devido às denúncias de corrupção e caixa 2?
Para o governo, certamente não será difícil, já que o PT, ao longo dos últimos anos, não tem tido qualquer dificuldade para se financiar, haja vista a movimentação não só dos candidatos majoritários, mas os parlamentares do PT em Minas. Nós vamos ter o apoio daqueles que querem mudar o Brasil. Eu tenho muita confiança, mas não sei dimensionar quanto custa uma campanha presidencial. Mas vamos fazer uma campanha dentro da lei, oficialmente, como sempre fizemos em Minas. Nós vamos contar com financiamentos também dos cidadãos brasileiros. 
 
O mensalão mineiro pode atrapalhar o senhor?
A mim, de forma alguma, porque não tenho com ele qualquer vinculação. O que eu sempre digo em relação a essas denúncias e acho até com um nome inadequado, porque mensalão pressupõe pagamentos mensais e, ali, há denúncia em relação à parte do financiamento do ex-governador Eduardo Azeredo, que sequer venceu as eleições. Mas o que eu defendo é que todas as denúncias sejam investigadas e que possamos dar a ele o direito à defesa. 
 
Como o senhor está se sentindo com a notícia que será pai de novo?
Muito feliz. Esse é o lado bom. Eu sou alguém de bem com a vida. Estou na política porque acredito na transformação da sociedade. Mas ela não é toda a minha vida. Diferentemente de alguns que estão na política para ascender socialmente ou a tem como único objetivo de suas vidas e, aí, quando perdem, se frustram. Eu vou cumprir o meu papel. Se couber a mim a responsabilidade de conduzir essa candidatura, vou fazê-la inspirado na minha história pessoal, nos mineiros e, quem sabe, depois de 60 anos, Minas tenha um presidente da República eleito pelo voto.  
 
14 de fevereiro de 2014

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