Com medo de que a impopularidade do aumento do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) proposto pelo prefeito Fernando Haddad provocasse deserções na bancada governista, a liderança do PT antecipou a apreciação da matéria em segunda votação e conseguiu aprová-la pouco antes da meia-noite de terça-feira pelo apertado placar de 29 votos a 26.
Apesar de um recuo em relação à proposta original, o aumento - que teve por base a revisão da Planta Genérica de Valores (PGV) dos imóveis - foi considerável, muito acima da inflação e sem relação com o crescimento da renda da população.
O aumento máximo para os imóveis residenciais baixou de 30% para 20% e o dos comerciais, de 45% para 35%. O Executivo cedeu também no caso dos aposentados, que ficariam numa situação particularmente difícil. Os que ganham até quatro salários mínimos terão desconto de 50% e para os que recebem até 5 salários ele será de 30%. Continuam isentos os que ganham até 3 salários. Esse recuo, à primeira vista importante, na verdade é bem pequeno, considerando-se o quanto o atual governo vai ganhar com o IPTU até o final de seu mandato, já que o aumento não se restringe ao próximo ano.
Depois de 2014, os tetos do aumento serão de 10% para os imóveis residenciais e de 15% para os comerciais até 2017, portanto acima da inflação, que é estimada pela própria Prefeitura em 6% para cada ano. Em 2017 será feita uma nova revisão da PGV para determinar os aumentos de 2018. Praticamente metade dos proprietários de imóveis da capital (49,7%) - ou 1,5 milhão, de um total de 3,1 milhões - será afetada por esses aumentos sucessivos até 2017.
Em resumo, esse caso lembra a velha história do bode malcheiroso colocado na sala para mostrar que sempre pode acontecer algo pior. Depois que ele é retirado, todos respiram aliviados, sem perceber que foram logrados, porque terão de suportar uma coisa apenas um pouco menos desagradável. Ou seja, o aumento proposto no projeto original de Haddad era ruim, mas com o que acabou sendo aprovado a situação melhorou muito pouco, embora o prefeito e seus aliados tenham tentado parecer conciliadores, capazes de ceder aos reclamos dos contribuintes.
Essas concessões enganadoras não livraram, evidentemente, o aumento do IPTU de seus graves vícios de origem. O primeiro, confessado pelo próprio Haddad - por inadvertência ou arrogante autossuficiência, pouco importa -, é o da sua utilização para cobrir em parte o subsídio ao serviço de ônibus, que disparou, chegando a R$ 1,6 bilhão, para garantir o congelamento da tarifa de R$ 3. Subsídio que, a julgar pelo histórico do problema, tem tudo para continuar a crescer. Não tem cabimento atualizar a PGV de olho nisso, porque não há nenhuma razão para os proprietários de imóveis ajudarem a pagar essa conta.
O segundo é a tentativa de repassar inteiramente a valorização dos imóveis para a PGV e, consequentemente, para o IPTU. Tem toda razão Jaime Vasconcelos, assessor econômico da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomércio), quando afirma: "Não se paga imposto com valorização (de imóveis), mas com renda. E a renda das pessoas e o faturamento das empresas não cresceram nessa proporção". Alguém acredita que a renda dos proprietários cresceu tanto quanto a valorização dos imóveis que, como afirmam os defensores do aumento do IPTU, foi de 100% desde 2009, quando foi feita a última revisão da PGV? A valorização só se transforma em renda quando o proprietário vende o imóvel, e não é preciso dizer que a imensa maioria deles não vive a fazer isso. E mais: quem vende já tem de pagar Imposto de Renda sobre a valorização.
Não surpreende, por tudo isso, que nada menos que 89% dos moradores da capital tenham se declarado contra o aumento, de acordo com pesquisa feita pelo Datafolha. E que a Associação Comercial de São Paulo tenha reagido com indignação à manobra para aprovar o projeto às pressas. Segundo seu presidente, Rogério Amato, a antecipação da votação foi "um golpe", dado com o objetivo de evitar "debate e pressão democrática da sociedade".
31 de outubro de 2013
Editorial do Estadão
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