Por que você gasta? Por que compra coisas, úteis ou inúteis? Por que você gasta o que não tem? Estas perguntas, de respostas mais ou menos óbvias, são agora objeto de uma ciência, a neuroeconomia.
Você gasta porque pode gastar, ora bolas. Ou porque se pendura no crédito, o que também significa poder gastar. Se gasta o que não tem, é por ser um irresponsável, com forte vocação para caloteiro. Se compra coisas úteis, é porque delas precisa. Se compra as inúteis, é porque deixou-se levar pela lábia dos publicitários.
Ocorre que, enunciando assim de maneira simples as respostas a perguntas simples, você não vai muito longe. Melhor dar uma aura científica ao banal. Nada melhor que uma teoria complexa, o que pode lhe dar renome e, conseqüentemente, dividendos.
Leio na Zero Hora reportagem sobre Paul Zak, o cientista – ou sei lá como defini-lo – que vê o impacto dos hormônios na tomada de decisões econômicas. Você não é mais livre quando decide se compra isto ou aquilo. Muito menos escravo do consumismo, disto você está absolvido. A culpa é da perversa oxitocina.
Diz Paul Zak: “Os seres humanos são criaturas emocionais e isso afeta a nossa tomada de decisão e a dos mercados. Também somos criaturas biológicas, temos necessidades e desejos que são movidos por fisiologia. O que minha pesquisa tem mostrado é que pequenas mudanças na química do cérebro podem ter profundos efeitos comportamentais. Se vamos colaborar com os outros ou tentar tomar o dinheiro deles, se escolhemos investimentos seguros ou de risco, e se agiremos de forma ética ou se nos comportaremos como psicopatas”.
Ou seja, ninguém mais é ladrão, nem fere a lei e muito menos a ética. O repórter pergunta:
— Alguma decisão pode ser totalmente racional?
Zak é taxativo:
— Não. Nem uma sequer. O cérebro é um órgão integrado e apesar de conseguirmos contar para os outros e para nós mesmos as razões de uma determinada escolha, ambas — emoção e cognição — afetam as decisões. Ao longo de 10 anos de pesquisa, os resultados mostraram que a maioria das decisões tem um componente emocional.
Cientistas buscam todos os dias causas genéticas para comportamentos e opções de cada indivíduo. Já se buscou o gene do alcoolismo. Não me consta que tenha sido encontrado. Se o fosse, seria muito oportuno. Qualquer pinguço poderia justificar-se cientificamente: "Que posso fazer? É genético. Garçom, dose dupla, por favor". Nada mais confortável que atribuir a uma predestinação biológica o que depende de uma decisão.
Buscou-se depois um gene bem mais conveniente, o do homossexualismo. Mas os engenheiros genéticos parecem ser avessos a leituras históricas. No Ocidente, o homossexualismo era um comportamento normal e até mesmo desejável, antes que o cristianismo contaminasse a cultura helênica com a camisa-de-força de seu conceito de amor, como algo único e direcionado ao sexo oposto. Aliás, este poderoso mito literário ocidental, o amor, nasce na Grécia, com os poemas de Safo de Lesbos, e é antes de tudo homossexual. Em todo caso, uma causa biológica para esta opção facilitaria a vida de muitos efebos sem maior cultura histórica. “É genético, querido”.
O que está sendo cada vez mais insólito de admitir é que alguém é homossexual porque decidiu ser homossexual, porque gosta de relacionar-se com o mesmo sexo, em suma, porque é livre de decidir com quem quer se relacionar.
Buscou-se também o gene da inteligência. Epa! Terreno minado. Imagine se este gene fosse politicamente incorreto, com preferência por certas raças. Encontrá-lo seria um desastre. Deixa pra lá, melhor não insistir nesta pesquisa.
De acordo com Zak – em reportagem da Veja do ano passado - é a oxitocina quem nos diz em quem confiar e quando ficar desconfiado, quando gastar e quando poupar. "O nível de confiança dentro de uma sociedade determina se essa sociedade prospera ou se mantém na miséria", escreve. Para o neuroeconomista, são as sociedades nas quais os indivíduos conseguem reforçar contratos, confiar no profissionalismo alheio e acreditar que o outro não vai roubá-lo que têm mais potencial para o desenvolvimento econômico. E a oxitocina está diretamente envolvida nessa confiança mútua.
Quer dizer, tanto o desenvolvimento econômico das nações como a confiança em contratos depende não de trabalho ou honestidade, mas de um reles hormônio.
- Com medições dos níveis de oxitocina no sangue, conseguimos prever se o sentimento de empatia, que nos conecta a outras pessoas, e nos faz ajudá-las, vai se manifestar num indivíduo em relação àqueles que estão à sua volta. É a empatia que nos faz morais.
Temos agora uma molécula que determina a moral de cada um. Não por acaso, Zak é autor de um livro intitulado A Molécula da Moralidade.
De onde concluímos não ser por desonestidade que os mensaleiros cometeram seus “feitos”, como diz Dona Dilma. Deve ter sido carência de oxitocina. Nada que alguns comprimidos não resolvam.
Os coitados estão prestes a serem encarcerados em função de um código penal medieval, quando bem poderiam ser recuperados com um tratamento intensivo de oxitocina, propiciado por estes novos cientistas, os neuroeconomistas.
31 de outubro de 2013
janer cristaldo
Você gasta porque pode gastar, ora bolas. Ou porque se pendura no crédito, o que também significa poder gastar. Se gasta o que não tem, é por ser um irresponsável, com forte vocação para caloteiro. Se compra coisas úteis, é porque delas precisa. Se compra as inúteis, é porque deixou-se levar pela lábia dos publicitários.
Ocorre que, enunciando assim de maneira simples as respostas a perguntas simples, você não vai muito longe. Melhor dar uma aura científica ao banal. Nada melhor que uma teoria complexa, o que pode lhe dar renome e, conseqüentemente, dividendos.
Leio na Zero Hora reportagem sobre Paul Zak, o cientista – ou sei lá como defini-lo – que vê o impacto dos hormônios na tomada de decisões econômicas. Você não é mais livre quando decide se compra isto ou aquilo. Muito menos escravo do consumismo, disto você está absolvido. A culpa é da perversa oxitocina.
Diz Paul Zak: “Os seres humanos são criaturas emocionais e isso afeta a nossa tomada de decisão e a dos mercados. Também somos criaturas biológicas, temos necessidades e desejos que são movidos por fisiologia. O que minha pesquisa tem mostrado é que pequenas mudanças na química do cérebro podem ter profundos efeitos comportamentais. Se vamos colaborar com os outros ou tentar tomar o dinheiro deles, se escolhemos investimentos seguros ou de risco, e se agiremos de forma ética ou se nos comportaremos como psicopatas”.
Ou seja, ninguém mais é ladrão, nem fere a lei e muito menos a ética. O repórter pergunta:
— Alguma decisão pode ser totalmente racional?
Zak é taxativo:
— Não. Nem uma sequer. O cérebro é um órgão integrado e apesar de conseguirmos contar para os outros e para nós mesmos as razões de uma determinada escolha, ambas — emoção e cognição — afetam as decisões. Ao longo de 10 anos de pesquisa, os resultados mostraram que a maioria das decisões tem um componente emocional.
Cientistas buscam todos os dias causas genéticas para comportamentos e opções de cada indivíduo. Já se buscou o gene do alcoolismo. Não me consta que tenha sido encontrado. Se o fosse, seria muito oportuno. Qualquer pinguço poderia justificar-se cientificamente: "Que posso fazer? É genético. Garçom, dose dupla, por favor". Nada mais confortável que atribuir a uma predestinação biológica o que depende de uma decisão.
Buscou-se depois um gene bem mais conveniente, o do homossexualismo. Mas os engenheiros genéticos parecem ser avessos a leituras históricas. No Ocidente, o homossexualismo era um comportamento normal e até mesmo desejável, antes que o cristianismo contaminasse a cultura helênica com a camisa-de-força de seu conceito de amor, como algo único e direcionado ao sexo oposto. Aliás, este poderoso mito literário ocidental, o amor, nasce na Grécia, com os poemas de Safo de Lesbos, e é antes de tudo homossexual. Em todo caso, uma causa biológica para esta opção facilitaria a vida de muitos efebos sem maior cultura histórica. “É genético, querido”.
O que está sendo cada vez mais insólito de admitir é que alguém é homossexual porque decidiu ser homossexual, porque gosta de relacionar-se com o mesmo sexo, em suma, porque é livre de decidir com quem quer se relacionar.
Buscou-se também o gene da inteligência. Epa! Terreno minado. Imagine se este gene fosse politicamente incorreto, com preferência por certas raças. Encontrá-lo seria um desastre. Deixa pra lá, melhor não insistir nesta pesquisa.
De acordo com Zak – em reportagem da Veja do ano passado - é a oxitocina quem nos diz em quem confiar e quando ficar desconfiado, quando gastar e quando poupar. "O nível de confiança dentro de uma sociedade determina se essa sociedade prospera ou se mantém na miséria", escreve. Para o neuroeconomista, são as sociedades nas quais os indivíduos conseguem reforçar contratos, confiar no profissionalismo alheio e acreditar que o outro não vai roubá-lo que têm mais potencial para o desenvolvimento econômico. E a oxitocina está diretamente envolvida nessa confiança mútua.
Quer dizer, tanto o desenvolvimento econômico das nações como a confiança em contratos depende não de trabalho ou honestidade, mas de um reles hormônio.
- Com medições dos níveis de oxitocina no sangue, conseguimos prever se o sentimento de empatia, que nos conecta a outras pessoas, e nos faz ajudá-las, vai se manifestar num indivíduo em relação àqueles que estão à sua volta. É a empatia que nos faz morais.
Temos agora uma molécula que determina a moral de cada um. Não por acaso, Zak é autor de um livro intitulado A Molécula da Moralidade.
De onde concluímos não ser por desonestidade que os mensaleiros cometeram seus “feitos”, como diz Dona Dilma. Deve ter sido carência de oxitocina. Nada que alguns comprimidos não resolvam.
Os coitados estão prestes a serem encarcerados em função de um código penal medieval, quando bem poderiam ser recuperados com um tratamento intensivo de oxitocina, propiciado por estes novos cientistas, os neuroeconomistas.
31 de outubro de 2013
janer cristaldo
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