A força-tarefa da Operação Lava Jato apresentou à Justiça uma cópia das planilhas do ‘amor’ e da ‘briga’, da Odebrecht, em denúncia por cartel e fraude à licitação no Rodoanel Sul e em obras viárias paulistanas, apresentada nesta sexta-feira, 3. Segundo o Ministério Público Federal, como o cartel corria riscos, a empreiteira elaborou uma planilha do “amor” (conluio completo com as dez construtoras do cartel, mais as demais habilitadas) e outra da “briga”, para o caso de haver disputa real nos preços entre as empresas conluiadas e as demais.
Segundo a Lava Jato, com ‘amor’, a obra saía mais cara. Cada lote foi avaliado pela Odebrecht com preços entre R$ 496 e R$ 567 milhões se houvesse sucesso no esquema. Em caso de ‘briga’, com concorrência parcial, as propostas oscilariam entre R$ 410 e R$ 518 milhões.
ALCKMIN E SERRA – O cartel teria operado entre 2004 e 2015 (governos Alckmin e Serra, do PSDB), segundo a Lava Jato em São Paulo. Os ex-governadores de São Paulo não são citados na denúncia, que relata crimes supostamente ocorridos durante o período em que ambos governaram o Estado.
Foram denunciados 33 investigados pelo cartel das construtoras com o aval de agentes públicos lotados nas empresas Dersa (estadual) e Emurb (municipal) e na Secretaria Municipal de Infraestrutura e Obras. A atuação dos acusados, entre 2004 e 2015, mediante ajuste prévio firmado entre as empresas e o poder público, eliminou, segundo a Lava Jato, a concorrência nas obras do trecho sul do Rodoanel e em sete grandes obras do Programa de Desenvolvimento do Sistema Viário Metropolitano (avenidas Roberto Marinho, Chucri Zaidan, Cruzeiro do Sul, Sena Madureira, Marginal Tietê e Jacu Pêssego e o córrego Ponte Baixa).
PAULO PRETO E OUTROS – São acusados o ex-diretor da Dersa Paulo Vieira de Souza (o “Paulo Preto”) e três agentes públicos: o atual Secretário de Aviação Civil do Ministério dos Transportes, Dario Rais Lopes, que, na época dos fatos denunciados, foi presidente da Dersa e secretário estadual de transportes; o diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Mario Rodrigues Júnior, que foi diretor de engenharia na Dersa entre 2003 e 2007; e Marcelo Cardinale Branco, que ocupou a presidência da Empresa Municipal de Urbanização de São Paulo (Emurb) e foi secretário municipal de Infraestrutura e Obras entre 2006 e 2010.
O cartel foi delatado por oito executivos da construtora Odebrecht, que dele participava, por meio de dois acordos de leniência firmados com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), em 2017 – um sobre o Rodoanel Sul e outro sobre o Sistema Viário Metropolitano. Os acordos foram firmados na sede da Procuradoria da República em São Paulo, que, desde então, conduziu as investigações criminais relativas ao caso.
CARIOCA CONFIRMA – O Ministério Público Federal também utilizou como elemento probatório um acordo de leniência feito pela construtora Carioca e homologado pela Justiça Federal em São Paulo. A denúncia contou ainda com o depoimento espontâneo de dois executivos da Queiroz Galvão, que são denunciados como réus colaboradores e poderão ter o benefício da redução da pena em caso de condenação. No caso dos executivos que fizeram leniência, a legislação impede que sejam denunciados.
Segundo a denúncia da Lava Jato em São Paulo, o cartel teve seis fases distintas e começou a ser organizado em 2004 com a cessão de material sigiloso da Dersa à Andrade Gutierrez, seguida de uma reunião entre as “cinco líderes” (Andrade Gutierrez, Camargo Correa, OAS, Odebrecht e Queiroz Galvão) no antigo canteiro de obras da Camargo Correa onde hoje se encontra o Parque do Povo, na zona sul da Capital.
UNIÃO E BID – O trecho sul do Rodoanel contava com recursos da União e do Banco Interamericano de Desenvolvimento e teria a concorrência lançada no ano seguinte. Uma série de reuniões, em diferentes locais, passou a ser organizada entre as cinco grandes, ou G5, entre junho de 2004 e maio de 2005, para tratar do projeto, que seria dividido em cinco lotes.
Paralelamente às reuniões do G5, representantes da Dersa atendiam emissários de cada construtora separadamente. Uma dessas reuniões foi entre Mario Rodrigues Júnior e a Odebrecht. Mario posteriormente foi nomeado coordenador da comissão especial de licitação do Trecho Sul do Rodoanel. Numa reunião no primeiro semestre de 2005, em um hotel perto da sede da Dersa, o trabalho inicial do G5 foi apresentado ao executivo da estatal.
04 de agosto de 2018
Julia Affonso, Luiz Vassallo e Fausto Macedo
Estadão
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