Investigações conduzidas pelo Ministério Público Federal (MPF), em parceria com autoridades e instituições financeiras americanas e europeias, rastrearam parte do “caminho do dinheiro” usado pelo grupo criminoso do ex-governador Sérgio Cabral no esquema dos desvios da saúde e trazem à tona a participação da mulher de Sérgio Côrtes, Verônica Vianna, na ocultação e movimentação de valores no exterior, com despesas vinculadas a cartões pré-pagos e de crédito em seu nome no valor de US$ 1,4 milhão, com objetivo de converter o dinheiro oriundo de crimes em ativos com aparência legal.
Os gastos confirmam que, além da ex-primeira-dama Adriana Ancelmo e a mulher do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, Verônica é a terceira mulher de políticos flagrada na Lava-Jato que se beneficiou de propinas desviadas por seus companheiros, com despesas nababescas em lojas de artigos de luxo, hotéis e restaurantes cinco estrelas. De acordo com as investigações, Claudia gastou US$ 1 milhão em despesas com cartões de crédito. Já Adriana, gastou só na joalheria H.Stern R$ 6 milhões.
CONDENAÇÃO – Além do ex-secretário Sérgio Côrtes e os empresários Miguel Iskin e Gustavo Estellita, a força-tarefa da Lava-Jato pede agora a condenação da mulher de Côrtes, a também médica Verônica Fernandes Vianna, acusada de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão de divisas na movimentação de ao menos US$ 4,3 milhões em contas na Suíça, e posteriormente, transferidos para uma offshore nas Bahamas, entre 2011 e 2017.
Para chegar aos valores rastreados, o MPF também contou com as colaborações do ex-presidente da Odebrecht Benedicto Júnior e do ex-subsecretário de Côrtes, Cesar Romero.
Além de demonstrar contradições nos depoimentos de Côrtes e sua mulher sobre valores mantidos no exterior, a petição que o MPF protocolou nesta segunda-feira sustenta a ciência das contas abertas em bancos estrangeiros e paraísos fiscais – negada antes por ambos. Chama a atenção para os gastos de Verônica com cartões de crédito em valores estimados em US$ 745 mil durante cinco anos, em compras de artigos de marcas como Chanel, Christian Louboutin, Dolce & Gabbana, Gucci, Prada,Burberry, Salvatore Ferragamo, Ermenegildo Zegna, Hermès, entre outros), hotéis, restaurantes, grandes redes de conveniência (Amazon, Target, Bloomingdale’s, Sak’s), tanto nos Estados Unidos quanto na Europa (Reino Unido, Itália, Áustria e Alemanha).
EM LAS VEGAS – Os investigadores descobriram, em apenas um extrato mensal da fatura de um dos cartões de crédito usado por Verônica em maio de 2014, gastos de US$ 90 mil em Las Vegas. Nas demais compras identificadas no período de 2011 a 2015 em Nova York, verificou-se despesas na Prada (US$ 9,1 mil), Hugo Boss (US$ 3,4 mil), Torneau (US$ 7,7 mil) e Bulgari (US$ 5,2 mil).
Já em outro extrato referente ao mês de agosto de 2011, na Europa, a força-tarefa destaca os gastos com hospedagens no Hotel Cipriani, em Veneza, no valor de US$ 20 mil.
CONTRADIÇÕES – O esquema denunciado pelo MPF pode prejudicar a colaboração do casal Côrtes e Verônica, que em depoimento em 2017, afirmou desconhecer o gerente de sua conta no exterior, bem como a existência da conta bancária, tendo assinado diversos documentos, o que por meio de quebra de mensagens telemáticas a força-tarefa comprova agora o contrário. Mesmo tendo devolvido à Lava-Jato os valores mantidos no exterior como propina, o que ainda poderia reduzir as penas a eles impostas, o MPF pode rever o benefício.
Revelado nas operações Fatura Exposta e Ressonância, o grupo criminoso teria movimentado R$ 1,5 bilhão em contratos com o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into).
Com base nos documentos obtidos em colaboração com as autoridades e instituições financeiras estrangeiras, o MPF descobriu que durante o período em que era secretário de Saúde, Côrtes, Iskin e Estellita movimentaram o valor de US$ 2,4 milhões por meio de duas transferências bancárias ocorridas em 06/05/11 e 15/08/11 a título de propina. Tais recursos foram recebidos na conta n.º 0618760, mantida no banco Crédit Agricole (Suisse) SA, atualmente CA Indosuez (Switzerland) SA, na Suíça em nome da offshore Casius Global, que tem Verônica como única beneficiária.
NO EXTERIOR – De acordo com o MPF, as vantagens indevidas no exterior, originalmente no banco Crédit Agricole (Suisse) SA, foram depois transferidas para a conta de Verônica mantida no CBH Bahamas LTD, nas Bahamas, assim como os fatos criminosos relacionados ao esquema de evasão de divisas e lavagem de capitais, com o auxílio da mulher de Côrtes.
Com base nos documentos que serão apresentados à Justiça, o MPF vai pedir a condenação de Verônica e Côrtes pelos crimes de corrupção passiva e ativa, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Se condenados, podem pegar uma pena de até 88 anos pelos crimes continuados.
Já Iskin e Estellita serão denunciados pelos crimes de corrupção ativa e lavagem de dinheiro. O MPF pede ainda, além de multa para os denunciados, o ressarcimento aos cofres públicos do dobro dos valores lavados e recebidos a título de propina por cada um dos denunciados, para reparação dos danos morais e materiais causados pela infração. O pedido de condenação leva em conta ainda o confisco dos valores repatriados pelo casal Côrtes e Verônica no valor de US$ 4,3 milhões.
09 de agosto de 2018
Chico Otávio e Daniel Biasetto
O Globo
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