A professora de inglês havia acabado de passar no concurso para dar aulas na rede municipal do Rio. Com 25 anos, ela foi trabalhar numa escola dentro de uma favela na Zona Norte do Rio, sem imaginar que iria conviver com um cotidiano hostil. Mas não demorou muito a descobrir. No dia em que repreendeu uma aluna, que demonstrava um comportamento agitado dentro de sala de aula, a menina, de apenas 10 anos, a ameaçou com uma tesoura. Além das intimidações e agressões verbais, que se revelariam corriqueiras, a jovem ainda sentiria na pele a violência ao ter a mão prensada na porta de um armário por outro aluno, o que a levou a ser socorrida em um hospital. Dois anos depois de dar início à carreira cheia de sonhos, a jovem professora viu seu otimismo vencido por uma licença psiquiátrica.
— Não tinha experiência em sala de aula, muito menos em escola pública. Logo no início, precisei lidar com crianças que não aceitavam ser repreendidas. Diziam que iam pedir aos traficantes que me matassem — conta a professora, hoje com 33 anos, que, com medo, pede para não ser identificada.
UMA ROTINA – Os episódios relatados pela professora não são exceção. Segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), obtidos pelo Globo via Lei de Acesso à Informação, a cada três dias, um professor é ameaçado dentro de escolas no Estado do Rio. Ao todo, em 624 ocasiões, de 2014 a 2017, professores denunciaram à Polícia Civil ameaças dentro de estabelecimentos de ensino no estado. O levantamento não informa se as escolas são da rede pública ou particular.
A licença da professora de inglês durou três meses. Após se recuperar, ela foi realocada pela Secretaria municipal de Educação em outra escola, no Complexo da Maré, onde, segundo ela, não teve mais problemas.
— Com o tempo, percebi que o ambiente violento nas escolas tem a ver com a ausência da família da criança no ambiente escolar. Antes, isso não acontecia. Nessa nova escola, vejo os pais mais inseridos na vida escolar dos filhos, e o diálogo com o professor é melhor — afirma.
17 de julho de 2018
Rafael Soares
O Globo
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