É constrangedor afirmar que a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, mentiu ao afirmar nesta terça-feira (dia 15) que não está em pauta no Supremo a possibilidade de mudança no entendimento que legalizou a prisão de condenados em segunda estância. “Não há nada pautado sobre isso. Não há nada cogitado”, disse ela, após um evento da Rádio JovemPan em São Paulo, no qual o juiz Sergio Moro, responsável pelos processos da Lava Jato na primeira instância, manifestou “grande preocupação” com movimentações no sentido de alterar a jurisprudência.
A resposta da presidente do Supremo foi surpreendente, instigante e equivocada. Por que motivo ela disse que “não há nada cogitado” sobre a prisão de segunda instância? Nem Freud explicaria esse comportamento, porque a ministra está farta de saber que, especificamente sobre prisão em segunda instância, existem duas ações judiciais e uma decisão de relator que estavam previstas para ocorrer em agosto, e já estamos no dia 16.
MORO TEM RAZÃO – Não há a menor dúvida de que o juiz federal Sérgio Moro tem motivos para se preocupar com o próximo julgamento em que o Supremo poderá alterar a jurisprudência sobre o tema, fixada por 7 votos a 4 em fevereiro de 2016. Naquela histórica sessão, ficaram contra a prisão em segunda instância apenas os ministros Ricardo Lewandowski, Celso de Mello, Marco Aurélio Mello e Rosa Weber.
Mas de lá para cá as coisas mudaram muito. No início de julho de 2016, o ministro Celso de Mello alegou que a decisão de fevereiro não tinha “efeito vinculante” a outros casos, e mandou soltar um réu sentenciado a 16 anos de cadeia por homicídio qualificado e ocultação de cadáver. Lewandowski fez o mesmo. Quer dizer, a jurisprudência do plenário simplesmente não está valendo nada.
Em maio deste ano, Gilmar Mendes sinalizou que pode acompanhar Dias Toffoli, que já mudou de ideia sobre o tema. Disse que a segunda instância deve ser uma possibilidade jurídica, não uma obrigação. “Manifesto, desde já, minha tendência em acompanhar o ministro Dias Toffoli no sentido de que a execução da pena com decisão de segundo grau deve aguardar o julgamento do recurso especial pelo STJ”, escreveu num voto.
DUAS AÇÕES – Com a mudança no entendimento do STF, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Partido Ecológico Nacional (PEN) ajuizaram ações, porque entendem que o princípio da “presunção da inocência” foi ferido com a mudança de jurisprudência dos ministros. E com frequência réus da Lava Jato e de outros processos entram com recursos, alegando a indefinição do Supremo. Portanto, não é por falta de pauta…
Moro tem razão em estar preocupado. Quando ocorrer um desses julgamento, e isso não vai demorar, o Brasil pode voltar a ser único país no mundo em que um criminoso só pode ser preso se tiver condenação confirmada por quatro instâncias — ou seja, só depois de um longo caminho até o Supremo, o que fará muitas punições serem extintas por prescrição. Ou os ministros podem apenas mitigar e só autorizar a prisão após a terceira instância, o Superior Tribunal de Justiça. De todo forma, essa impunidade prolongada é uma vergonha para o país.
5 VOTOS A 5 – Cármen Lúcia, Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin são quatro votos certos pela prisão após a segunda instância, além de Alexandre Moraes, que disse ser favorável durante a sabatina do Senado. Sabe-se que Celso de Mello, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes e Dias Toffoli vão se manifestar a favor da impunidade, com o placar de 5 a 5. Portanto, o voto decisivo será de Rosa Weber, que em fevereiro de 2016 foi contra, mas pode mudar de posição, contrapondo-se a Dias Toffoli e Gilmar Mendes, que trocaram de lado.
Em tradução simultânea, neste tema da maior importância para o país a famosa deusa Minerva atende pelo nome de Rosa Weber. O julgamento deverá ser decidido pelo voto dela.
###
P.S. – Se o Supremo revogar a prisão após condenação em segunda instância, é melhor nos mudarmos para uma país mais sério, como Paraguai, Venezuela ou Bolívia. (C.N.)
P.S. – Se o Supremo revogar a prisão após condenação em segunda instância, é melhor nos mudarmos para uma país mais sério, como Paraguai, Venezuela ou Bolívia. (C.N.)
16 de agosto de 2017
Carlos Newton
Nenhum comentário:
Postar um comentário