O governo inventou um modo de aumentar impostos em 2017, um jeito quase sem custos. De quebra, seria um tributo sobre grandes fortunas, para dizer a coisa de modo sarcástico.
Renan Calheiros (PMDB), presidente do Senado, anunciou nesta terça (1º) que vai propor projeto de lei a fim de reabrir o programa de "repatriação", a declaração de dinheiros mantidos ilegalmente no exterior.
O prazo da primeira "repatriação" terminou na segunda-feira (31). Nesta rodada, o governo arrecadou R$ 50,9 bilhões em multas e impostos, cobrados de uma base de R$ 169,9 bilhões declarados à Receita.
Calheiros diz que apresenta o projeto na semana que vem. De acordo com um senador envolvido no assunto e com gente do Ministério da Fazenda, a nova chance de regularizar o dinheiro vai custar mais caro.
O plano é aumentar imposto e multa de 15% para 17,5%, "para a nova chance não sair de graça para os atrasados". Não está certo ainda se o novo programa começa em janeiro ou fevereiro. Não haveria gambiarra para permitir que políticos regularizem dinheiro clandestino. Esse era um lobby que movia o projeto de reabertura do prazo de "repatriação" na Câmara, que gorou.
Deve haver modificação na lei de modo a "tornar mais claro" que não haverá risco de os contribuintes agora arrependidos se sujeitarem a processos criminais. Em escritórios de advocacia que assessoram interessados na "repatriação", se diz que esse risco teria "inibido clientes".
Calheiros disse que podem vir mais R$ 50 bilhões. Escritórios de advocacia chutam que R$ 25 bilhões seria um número razoável. Para gente do governo, o valor pode ser um pouco maior, mas ainda não haveria estimativa confiável. Advogados dizem que já têm gente na fila, clientes que se atrasaram, esperavam mudanças de regras na Câmara ou "não estavam atentos" para os riscos de não regularizar o patrimônio.
O risco é o de ser flagrado com dinheiro irregular no exterior, que vai aumentar com a troca de informações entre os fiscos de vários países.
Para o governo, esse "imposto sobre grandes fortunas" pode ser um alívio. A perspectiva de fechar as contas no ano que vem é no mínimo nebulosa.
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse outra vez na segunda-feira que, com a aprovação do "teto" para os gastos do governo, não seria necessário aumentar impostos. Não é possível afirmar tal coisa, a não ser que o governo não esteja nem aí para a meta de saldo primário que anunciou para 2017. Não está?
O "teto" limita despesas, mas não garante receitas. Se a receita for insuficiente, não se cumpre a meta, aumenta o deficit primário (receitas menos despesas, afora gastos com juros da dívida pública), aumenta a dívida.
Até setembro, a receita nominal (sem descontar a inflação) vinha crescendo apenas 1,1% ao ano. Para atingir a meta fiscal de 2017, o governo parece contar com um aumento de 9,9% da arrecadação. Com R$ 25 bilhões de impostos e multas da "repatriação", teria pelo menos 2,3% extras.
Sim, trata-se de dinheiro extraordinário, que não vai entrar de novo em 2018. Mas, na pindaíba medonha de agora, é um alívio na dívida. Sem o custo econômico e político de aumentar impostos.
03 de novembro de 2016
Vibnicius Torres Freire, Folha de SP
Renan Calheiros (PMDB), presidente do Senado, anunciou nesta terça (1º) que vai propor projeto de lei a fim de reabrir o programa de "repatriação", a declaração de dinheiros mantidos ilegalmente no exterior.
O prazo da primeira "repatriação" terminou na segunda-feira (31). Nesta rodada, o governo arrecadou R$ 50,9 bilhões em multas e impostos, cobrados de uma base de R$ 169,9 bilhões declarados à Receita.
Calheiros diz que apresenta o projeto na semana que vem. De acordo com um senador envolvido no assunto e com gente do Ministério da Fazenda, a nova chance de regularizar o dinheiro vai custar mais caro.
O plano é aumentar imposto e multa de 15% para 17,5%, "para a nova chance não sair de graça para os atrasados". Não está certo ainda se o novo programa começa em janeiro ou fevereiro. Não haveria gambiarra para permitir que políticos regularizem dinheiro clandestino. Esse era um lobby que movia o projeto de reabertura do prazo de "repatriação" na Câmara, que gorou.
Deve haver modificação na lei de modo a "tornar mais claro" que não haverá risco de os contribuintes agora arrependidos se sujeitarem a processos criminais. Em escritórios de advocacia que assessoram interessados na "repatriação", se diz que esse risco teria "inibido clientes".
Calheiros disse que podem vir mais R$ 50 bilhões. Escritórios de advocacia chutam que R$ 25 bilhões seria um número razoável. Para gente do governo, o valor pode ser um pouco maior, mas ainda não haveria estimativa confiável. Advogados dizem que já têm gente na fila, clientes que se atrasaram, esperavam mudanças de regras na Câmara ou "não estavam atentos" para os riscos de não regularizar o patrimônio.
O risco é o de ser flagrado com dinheiro irregular no exterior, que vai aumentar com a troca de informações entre os fiscos de vários países.
Para o governo, esse "imposto sobre grandes fortunas" pode ser um alívio. A perspectiva de fechar as contas no ano que vem é no mínimo nebulosa.
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse outra vez na segunda-feira que, com a aprovação do "teto" para os gastos do governo, não seria necessário aumentar impostos. Não é possível afirmar tal coisa, a não ser que o governo não esteja nem aí para a meta de saldo primário que anunciou para 2017. Não está?
O "teto" limita despesas, mas não garante receitas. Se a receita for insuficiente, não se cumpre a meta, aumenta o deficit primário (receitas menos despesas, afora gastos com juros da dívida pública), aumenta a dívida.
Até setembro, a receita nominal (sem descontar a inflação) vinha crescendo apenas 1,1% ao ano. Para atingir a meta fiscal de 2017, o governo parece contar com um aumento de 9,9% da arrecadação. Com R$ 25 bilhões de impostos e multas da "repatriação", teria pelo menos 2,3% extras.
Sim, trata-se de dinheiro extraordinário, que não vai entrar de novo em 2018. Mas, na pindaíba medonha de agora, é um alívio na dívida. Sem o custo econômico e político de aumentar impostos.
03 de novembro de 2016
Vibnicius Torres Freire, Folha de SP
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