"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

TRUMP: COMO A DIREITA PODE COLHER FRUTOS TANTO SE ELE GANHAR COMO SE PERDER?



A direita brasileira decerto amadureceu nos últimos anos. Mas, em alguns setores, ainda demonstra a maturidade de uma criança. Isso se vê principalmente na reação explosiva e irracional diante de críticas táticas.

Uma crítica tática não é focada em aspectos morais, mas em resultados. Queremos saber se algo vai funcionar ou não. Quase sempre quando fazemos uma crítica moral, uma parte da direita parece entrar em surto. Vale lembrar que alguns gurus não estão enganados, mas agem desonestamente.

Um exemplo vem à mente de imediato: critiquei duramente Marco Feliciano por sua reação lenta diante das acusações de Patrícia Lélis. Embora ele não fosse um de meus parlamentares favoritos, eu torcia por seus resultados na CPI da UNE. Por isso, era importante se preocupar com seu desempenho, assim como nos preocupamos com o desempenho do técnico de futebol do time para o qual torcemos. Mas teve gente que andou dizendo: “o que você tem contra Feliciano?”. Outro espertão bradou: “Você está tomando as afirmações de Lélis como verdadeiras”. Pura mentira. Mas o fato é que confundiam, como sempre, uma crítica tática como uma crítica moral. E, em alguns casos, teve gente que se fez de besta e agiu desonestamente.

Como resultado desse padrão comportamental, muitos grupos – especialmente alguns ligados mais fortemente ao conservadorismo e até ao neoconservadorismo – perderam a capacidade de avaliar criticamente suas táticas. Nesses grupos, as pessoas tem medo de dizer coisas como “esse discurso não vai funcionar” ou “essa tática não está indo no caminho certo”. Possuem medo de fazer correções de rota, uma vez que as críticas táticas são encaradas como ofensa.

Felizmente, eu escrevo para meus leitores, os quais costumam gostar de críticas táticas, pois tudo aqui é baseado na criação de conscientização sobre o jogo político. A maioria das críticas táticas não são feitas para os candidatos – até porque nesse ponto entramos quase sempre “tarde demais”, quando é difícil fazer correções de rota -, mas para que possamos aprender futuramente com os erros.

O fato é que há muita gente que confunde quase tudo que escrevo sobre Donald Trump.

Comecemos: é obviamente melhor para nós que ele vença seu embate com Hillary. Já tivemos a evidência da deleção dos 33.000 e-mails e de diversas outras ações que deveriam colocá-la na cadeia. Por mais que rejeitemos as ideias e comportamentos de Trump, não dá para compará-lo com Hillary. Para piorar, ela é autoritária e até totalitária. Ademais, poderá nomear mais três juízes da Suprema Corte. Em suma: a vitória de Hillary significa o inferno na Terra, não apenas para os Estados Unidos, como também para o mundo.

Creio que minha posição está bem clara aqui, não? Não é nem uma posição pró-Trump, mas uma posição anti-Hillary. Novamente ressalto o quanto deixo claro que é bem melhor que Trump vença, pelos motivos já apresentados.

Mas precisamos olhar para os fatos: Trump é um candidato ruim demais. O Partido Republicano merece um puxão de orelha por não ter feito um background checkadequado de seu passado. Será que a divulgação de todos esses áudios não estava prevista? Ou o Partido Republicano se deixou seduzir tanto pelos 100 milhões de dólares doados pelo próprio candidato para a campanha que “deixou isso pra lá”? Seja lá como for, é claro que tratamos de um candidato fraco.

Ademais, Trump tem o costume de não moderar sua linguagem e nem mesmo de planejar seus discursos estrategicamente. Com exceção do segundo debate presidencial, ele também é frouxo e toma surras de rótulos a ponto de ficarmos com pena. A certo momento, parece até uma criança política tomando rótulo atrás de rótulo de um adulto que está morrendo de rir do outro lado.

A verdade nua e crua é que em termos de guerra política Donald Trump é uma negação. No fundo, é um Jair Bolsonaro com uma conta corrente muitíssimo mais recheada.

Vemos a todo momento pessoas reclamando “ah, mas a mídia favorece Hillary”. Ué, mas ele não estava contando com esse fator adverso antes? E quais foram seus planos para passar por cima desta barragem de propaganda? Pensando bem, para que planos se alguém está sempre com a razão, não é mesmo?

Esse é talvez o aspecto mais incômodo da postura de Donald Trump: ele está sempre certo em “suas táticas”. E se não der certo, ele culpará aqueles que não o apoiaram – como se não fosse sua obrigação, pela posição de candidato representante, conquistar esse apoio -, ou então transferir a responsabilidade para a mídia e, quem sabe, até para o “julgamento errado do povo”. Pessoas assim são incorrigíveis. Tudo pode funcionar bem em uma empresa onde ele pode controlar o que quase todos pensam. Mas no território aberto? Não funciona.

Assim, mesmo que o melhor mesmo para a direita seria que Trump vencesse, a realidade mostra que essa vitória é quase impossível. Pois é aí que deve ser tirado algo de útil dessa adversidade: a derrota de Trump pode servir como um símbolo dizendo que a frouxidão na guerra política – em suma, o “não jogo” – precisa ser enterrada.

No Brasil, já tivemos exemplos infinitos de que o “não jogo” só serve para criar desastres políticos. Vimos Aécio perder uma eleição ganha para Dilma, bem como Eduardo Cunha – se recusando a rotular o adversário – conseguindo se tornar até mais rejeitado que a ex-presidente cassada. Vimos Marco Feliciano sumir do cenário político, mesmo que ele tivesse toda a razão no caso contra Lélis. Mas se não jogou o jogo, perdeu e foi para o ostracismo. Jair Bolsonaro não cometeu nenhum crime de calúnia contra Maria do Rosário. Na realidade, ele foi vítima de um crime de difamação. Mas como só ela jogou o jogo, ele terminou denunciado pelo STF e ela está morrendo de rir até hoje.

Nos Estados Unidos, as derrotas de John McCain e Mitt Romney para Barack Obama já deveriam entrar para o catálogo de fracassos conquistados pelo “não jogo”. Mas se Trump perder essa eleição, será uma derrota ainda mais imperdoável, pois sua obrigação era vencer por no mínimo 20 pontos de diferença, dado existirem muitos aspectos negativos a serem explorados contra Hillary. Se ele não vencer, será em parte por não ser um bom candidato mesmo (ter um passado muito vulnerável), mas, principalmente, por não ter jogado o jogo.

As lições dadas por aqueles que se recusam a jogar o jogo se resumem a isso: lições dizendo “está vendo o resultado da escolha por não jogar o jogo?”. Se aprendermos com essa decisiva lição que pode ser dada pela teimosia de Trump (se ele perder), poderemos pensar em uma maior maturidade política.


17 de outubro de 2016
ceticismo político

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