Chico Buarque e Lula, antes do apartamento em Paris, do triplex no Guarujá e do sítio em Atibaia |
O antissemitismo de Richard Wagner incomoda, assim como a alienação política de Prokofiev, que se submeteu passivamente ao comunismo soviético, também incomoda. A irresponsabilidade e o antiprofissionalismo de Tim Maia incomoda. A morte precoce de Amy Winehouse, vitimada pelo crack, incomoda.
Artistas, em sua maioria, não são analistas políticos, não são economistas, não são filósofos, não são santos; artistas são apenas artistas.
No século XIX, os artistas foram alçados a uma categoria especial de seres humanos, pairando acima dos reles mortais e, graças a esse fenômeno sócio-cultural, suas opiniões sobre os mais diversos assuntos passaram a ser consideradas dogmas irrefutáveis e seguidas como paradigmas, ainda que completamente equivocadas ou eivadas de vícios culturais e preconceitos de época.
Isso ganhou ainda mais peso com o advento da indústria cultural e da comunicação de massas, que proporcionou a reverberação de tais opiniões a milhões de pessoas instantaneamente. Dessa forma, o artista popular, seja ele músico ou ator, que são as formas de arte com maior alcance entre o grande público, pôde extrapolar o seu meio de atuação e se transformar numa espécie de palpiteiro profissional, protegido justamente por essa aura de genialidade supra-humana da qual fora presenteado ainda no século retrasado.
“O judeu”, escreveu Richard Wagner em 1850, seria por si próprio “incapaz de se expressar artisticamente”. Tal expressão artística não funcionaria “nem pela aparência [do judeu], nem pela sua linguagem, e muito menos através de seu repertório musical”.
Poucos hoje em dia seriam capazes de abalizar tal opinião, a não ser alguns elementos da esquerda mequetrefe nacional, como talvez o cidadão de vulgo “Babá”, do PSOL, que se regozija queimando bandeiras de Israel, ou os esquerdistas adeptos do socialismo nacionalista (a.k.a. “neonazistas”).
Socialistas nacionalistas queimando a bandeira de Israel |
Um dos maiores dilemas da Humanidade é justamente esse: como separar o artista de sua obra? É possível fazer isso? Seria o artista cooptado pelo sistema político vigente como Artax, o cavalo de Atreyu no filme “Neverending History”, afundando mais e mais na areia movediça de suas pseudo-certezas? Não seria ao menos interessante que tais artistas, já que alegam ser profundos conhecedores da ciência política, sejam convidados ao franco debate?
Trazendo essa questão para o contexto do Brasil atual, podemos citar os casos de três figuras do cancioneiro popular: Caetano, Chico e Gil. Todos imbuídos desse “ethos” socialista que nada mais é que o resultado da hegemonia político-ideológica vigente há praticamente meio século. Todos viveram a flor da idade nos anos 60, naquele momento em que todo jovem era favorável à luta contra a ditadura, por mais que tenham sido usados como massa de manobra por grupos comunistas que não buscavam exatamente a democracia republicana, mas a implantação de um regime comunista aos moldes cubanos.
E então chegamos à grande divergência de narrativas que apenas atualmente, meio século depois, começa a desanuviar. A esquerda afirma que lutava contra a ditadura pela democracia, mas era financiada, orientada e inspirada pela URSS, China e Cuba, todas ditaduras genocidas. E essa foi a narrativa que venceu e prevalece nos livros de História, nos jornais e no meio cultural. A narrativa esquerdista, vencedora, associou todo e qualquer crítico do socialismo aos defensores da ditadura militar, enquanto os comunistas foram associados aos mais belos ideais democráticos.
É isso que aprendemos na escola, nas TVs, na música popular, nas novelas e filmes, é isso o que boa parte do clero afirma e que 100% da imprensa confirma. “Anticomunistas são de direita – portanto maus – e comunistas são de esquerda – portanto bonzinhos e cuti-cuti.” Esta é a grande falácia que corrói a política nacional desde o século passado.[1]
Quando toda e qualquer crítica à esquerda passou a ser erroneamente considerada como uma apologia à ditadura militar, e tal informação foi difundida nas escolas para as crianças e jovens desde tenra idade, criticar a esquerda virou um tabu, um pecado imperdoável e inaceitável. E, evidentemente, esse fenômeno influenciou os artistas da época.
Contaminados pela propaganda socialista e protegidos por uma redoma de prestígio e fama, esses e outros artistas mantiveram-se resolutos em seus ideais socializantes. Tendo a mídia, as redações, a academia, parte do clero e a maior parte dos poderes do governo comungando dos mesmos ideais, tais artistas sentem-se seguros dentro da areia movediça do governismo mais chinfrim no qual chafurdam.
No dia 27 de março de 2016, o programa Altas Horas da Rede Globo exibiu Caetano e Gil, dois desses artistas lamentavelmente envolvidos com a ideologia sinistra[2]. Caetano, ao ser indagado sobre a realidade política da atualidade, apelou aos chavões simplórios e lugares-comuns, como “o Brasil é um país desigual”, basicamente[3]. Gil pouco falou, para a sorte da audiência, tão maltratada ultimamente pelos discursos em dilmês proferidos pela mulher-sapiens.
Curiosamente, a despeito de hoje ser a favor do status quo governista, o discurso de Caetano no Festival Internacional da Canção em 1968 continua atualíssimo:
“É essa a juventude que diz que quer tomar o poder? Se vocês forem em política como são em estética, estamos feitos!”
Caetano estava certo e seu discurso foi, de certa forma, profético: estamos feitos, mesmo. A juventude de hoje está justamente matando amanhã o velhote inimigo que morreu ontem.[4]
“Se vocês, em política, forem como são em estética, estamos feitos!” |
É aí que entra a figura do Lobão, um ex-militante petista que teve a grandeza de reconhecer que lutava pelas coisas erradas, levantando a bandeira branca e convidando os três compositores ao diálogo. Acarta aberta do Lobão é um gesto de acolhimento, benevolência e misericórdia. Quem se opõe ao regime petista não pode se igualar aos camisas vermelhas, eles sim os verdadeiros fascistas, violentos e uniformizados, pedindo mais estado e lutando por um “grande líder”. São eles que invadem plantações, depredam empresas e prédios públicos, vandalizam e ameaçam. São eles que buscam sempre o confronto, e nunca o diálogo.
É urgente que haja um contraponto a toda essa violência. E tal contraponto virá não somente em palavras, mas em exemplos. O convite ao diálogo é um desses exemplos. Seis milhões de pessoas reunidas pacificamente nas ruas em prol de uma demanda (o impeachment) é outro.
Caetano, no Altas Horas, afirmou que “não reconheceu a Passeata dos Cem Mil nas manifestações de Treze de Março”. Talvez não tenha reconhecido mesmo, pois enquanto naquela estavam presentes artistas famosos, políticos poderosos e organizações comunistas, nas manifestações atuais está apenas o povo, sem o aparato partidário, sem apoio da mídia, do establishment cultural e sem defender ditaduras.
Mais do que uma tentativa misericordiosa de converter os colegas cooptados pelo governo, o convite ao diálogo de Lobão foi um gesto que, se aceito pelos interlocutores, poderia enriquecer enormemente o debate político e cultural brasileiro.
É lamentável que tal convite esteja sendo ignorado pelos três compositores, ridicularizado pela esquerda (logo ela, que se diz tão democrática e aberta ao diálogo) e considerado um sinal de fraqueza por setores menos pacientes da direita.
Vale lembrar o ensinamento de Sun Tzu: “Se o seu oponente é de temperamento colérico, procure irritá-lo. Finja ser fraco, que ele vai se mostrar arrogante, e vulnerável”.
Se esses três compositores, nascidos e crescidos como ícones da esquerda, ainda pensem ter suas razões para continuarem a ser comunistas, mesmo ao custo da decepção de milhões de ex-admiradores, vá lá. O que mais assusta na realidade brasileira é percebermos o quanto essa falsa relação do socialismo com a arte se cristalizou no imaginário coletivo.
Exemplo de obra de arte socialista |
O artista deveria, pela própria natureza de sua atividade, que lida com a expressão de sua criatividade, prezar por tudo o que o socialista não preza: a liberdade. Artistas socialistas são um grande contra-senso. A cada dia, mais e mais gerações de novos artistas são formados com base nesse preceito equivocado de que haveria algum tipo de relação mágica de causa e conseqüência entre ser artista e ser socialista. Ver jovens artistas nascidos em ambiente democrático pensando assim é inaceitável.
O convite ao diálogo público é a melhor maneira de desfazer a aura de infalibilidade desses artistas comunistas que desfrutam como ninguém das benesses do capitalismo e das liberdades republicanas. De fato, o Lobo não é bobo.
[1] O grande cisma que divide o mundo atualmente se dá entre quem defende uma maior e quem defende uma menor interferência estatal na vida dos cidadãos. As divergências referem-se à natureza dos direitos humanos, à origem do poder do estado, ao conceito de “supremacia do grupo”, à “coação versus liberdade” e à igualdade versus desigualdade perante a lei. Verhttp://comediaglobale.blogspot.com.br/2008/10/o-cisma-duas-ticas-dividindo-o-mundo.html
Dessa forma, quem defende conceder um poder supremo aos militares é tão coletivista quanto quem defende dar esse mesmo poder supremo a um partido de esquerda. De fato, a ditadura militar brasileira teve muitos pontos em comum com os regimes de esquerda. Os militares eram coletivistas, contrários ao livre mercado, criaram inúmeras empresas estatais, dirigiam completamente a economia, censuravam, etc. Exatamente igual ao que os foquistas pró-Cuba preconizavam. A única diferença é que eram anticomunistas.
[2] Chico Buarque, mesmo não estando presente, também se mantém firme e forte na defesa da ditadura cubana, do grupo terrorista MST e do pior governo da História.
[3] Sobre a questão da “desigualdade”, que é um dos postulados máximos das esquerdas, verhttp://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1892
[4] Também há profecias nas canções do Chico: “Hoje você é quem manda, falou tá falado, não tem discussão”, “Quando vi todo mundo na rua de blusa amarela batendo panela”, etc.
09 de julho de 2016
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