"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

segunda-feira, 20 de junho de 2016

LÍDERES PALESTINOS E O SACRIFÍCIO DE CRIANÇAS


INTERNACIONAL - ORIENTE MÉDIO

Homens mascarados do Hamas posam para a mídia no funeral dos filhos de Abu Hindi em Gaza em 7 maio de 2016. 

A trágica morte de três irmãos palestinos, em um incêndio que destruiu a casa deles na Faixa de Gaza em 6 de maio, demonstra mais uma vez até que ponto os líderes palestinos estão dispostos a ir na exploração de suas crianças por motivos políticos e interesses mesquinhos.

Os três filhos da família de Abu Hindi -- Mohamed de 3 anos, seu irmão Nasser de 2 e sua irmã Rahaf, um bebê de apenas dois meses, morreram em um incêndio causado pelo fogo de velas que estavam sendo usadas devido a recorrentes quedas de energia elétrica na Faixa de Gaza.

A crise de energia na Faixa de Gaza é a consequência direita da incessante disputa pelo poder entre as duas forças rivais palestinas, o Hamas e a Autoridade Palestina (AP).

Nos últimos meses a crise se aprofundou, deixando boa parcela da Faixa de Gaza sem energia na maior parte do dia. O Hamas acusa a Autoridade Palestina pela crise por ela não cobrir os custos necessários do combustível para operar as usinas de energia na Faixa de Gaza. A AP revidou jogando a culpa na "corrupção" e "incompetência do Hamas".

A família de Abu Hindi reside no campo de refugiados Shati, onde o líder do Hamas Ismail Haniyeh e outros líderes do movimento islamista também residem. Mas diferentemente da liderança do alto escalão do Hamas, a família de Abu Hindi não dispunha de recursos para ter seu próprio gerador de energia. Assim sendo, a família atingida pela tragédia, bem como a maioria das famílias na Faixa de Gaza recorreu à alternativa mais barata – velas .

Naquela noite terrível, os três filhos de Abu Hindi foram dormir enquanto as velas ainda estavam ardendo. Horas mais tarde os corpos carbonizados dos três irmãos foram retirados da casa enquanto ela ainda ardia em chamas, envolvida em fumaça.

Em qualquer outro país este incidente seria reportado como uma tragédia comum – do tipo que poderia ocorrer em qualquer cidade como Nova Iorque, Londres ou Paris.

Aqui, contudo, a morte das três crianças não é simplesmente mais uma tragédia pessoal. Foi sim um caso de sacrifício infantil: as crianças de Abu-Hindi foram sacrificadas no altar de uma guerra que já dura uma década, travada entre a Autoridade Palestina e o Hamas. E estas crianças estão longe de serem as primeiras ou as últimas vítimas.

Em igual medida, tanto a AP quanto o Hamas estão explorando a tragédia da família Abu Hindi, para travarem uma campanha suja um contra o outro. Não é que esses dois rivais viveram em paz até o presente momento. Mas o lamaçal político envolvido às custas das três crianças mortas atingiu um nível repugnante.

As crianças ainda nem tinham sido enterradas e os líderes do Hamas já acusavam o Presidente da Autoridade Palestina Mahmoud Abbas e seu Primeiro Ministro Rami Hamdallah, como pessoalmente responsáveis pela crise de energia na Faixa de Gaza.

O porta-voz do Hamas Sami Abu Zuhri alegou que a crise energética faz parte da campanha da liderança da AP em manter toda a Faixa de Gaza sob bloqueio. O objetivo maior da AP, segundo ele, é desgastar e remover o Hamas do poder na Faixa de Gaza.

Outros representantes do Hamas disseram que a crise é a consequência direta da insistência da Autoridade Palestina em impor um imposto sobre o combustível que ela fornece para as usinas de energia da Faixa de Gaza — um fardo que o Hamas não tem condições de arcar por causa do já alto preço do combustível. Eles disseram que o imposto é injustificável porque a AP, por meio de um acordo com Israel (de quem ele compra o combustível), recebe a restituição de imposto. Além disso, eles destacam que a AP se recusou a fazer um pedido para que Israel aumente o fornecimento de eletricidade para a Faixa de Gaza.

Tradução: O Hamas não assume a responsabilidade no tocante ao fato de dois milhões de palestinos na Faixa de Gaza ficarem cerca de 12 horas por dia sem energia elétrica. Mas sob o ponto de vista do Hamas, isso é de responsabilidade única de Mahmoud Abbas e de seu primeiro-ministro, cujo único interesse é afastar o Hamas do poder.

Mas onde foram parar os milhões de dólares de doações internacionais? Quanto custam os túneis, aqueles que o Hamas usa para lançar ataques terroristas contra Israel? Financiar terroristas e suas famílias? Esses recursos não seriam melhor aplicados se evitassem que crianças morressem queimadas por causa de velas acesas?

Os líderes do Hamas encenaram um mar de lama. Em uma medida sem precedentes, membros mascarados do braço armado do Hamas, o Ezaddin Al-Qassam, foram despachados para participarem do funeral das três crianças. Líderes do Hamas como Ismail Haniyeh também estavam presentes, prestando condolências à família. As câmeras registraram tudo, demonstrando a filiação da família ao Hamas, indicando que Abbas e a Autoridade Palestina eram responsáveis pela tragédia.

A Autoridade Palestina também está querendo tirar proveito da situação, travando uma guerra de difamação contra o Hamas. Yusuf Al-Mahmoud, porta-voz do governo da Autoridade Palestina, repudiou as acusações do Hamas. "Aqueles que continuam sequestrando pessoas na Faixa de Gaza são os responsáveis por esta tragédia", segundo ele, referindo-se aos dirigentes do Hamas em Gaza. "A tragédia das crianças na Faixa de Gaza é a tragédia de todos os palestinos. O Hamas é responsável pela continuada ruptura (entre a Cisjordânia e a Faixa de Gaza)". A facção governista Fatah de Abbas chegou a ponto de apresentar o sofrido e enlutado pai como membro das suas fileiras.

A Autoridade Palestina já nutre a esperança de que a tragédia da família de Abu Hindi dará um empurrãozinho aos palestinos na Faixa de Gaza para que se revoltem contra o Hamas.

Já o Hamas nutre a esperança que a tragédia deteriore ainda mais a credibilidade da Autoridade Palestina entre os palestinos, apresentada como cúmplice no bloqueio da Faixa de Gaza para impedir que o Hamas receba armamentos.

Essas ameaças e contra ameaças constituem assim mais uma demonstração de que tanto a AP quanto o Hamas estão determinados a prosseguir em sua luta até a última criança palestina.

Nesse ínterim Abbas procura persuadir o mundo a apoiar seu plano para estabelecer um estado palestino soberano na Cisjordânia e Faixa de Gaza. É difícil até de se imaginar como ele conseguirá por os pés em Gaza depois desse funeral.

O que aconteceu na casa de Abu Hindi é uma indescritível tragédia familiar. O que está acontecendo com o povo palestino, que sempre foi governado por líderes que não dão a mínima pelo seu bem-estar, é uma tragédia de proporções nacionais.



20 de junho de 2016
KHALED ABU TOAMEH


Publicado no site do The Gatestone Institute.
Khaled Abu Toameh é um jornalista premiado radicado em Jerusalém.
Tradução: Joseph Skilnik

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