"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 10 de maio de 2016

CRIATIVIDADE EXCESSIVA DO SUPREMO CRIA UM PROBLEMA ATRÁS DO OUTRO



Charge do Pataxó, reprodução do Arquivo Google


A excessiva criatividade do Supremo Tribunal Federal, pincelada com doses de surpreendente irresponsabilidade institucional, está causando uma polêmica atrás da outra. Primeiro, a corte errou por 9 a 2, ao inventar um novo rito para o impeachment, criando uma presidente-zumbi, que saiu, mas continua, e um novo presidente-zumbi, que não assume até segunda ordem. Depois, errou novamente, ao passar por cima da legislação para afastar Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Câmara e do mandato parlamentar, criando a figura do deputado-zumbi, a percorrer os longos corredores da Câmara em horário de expediente.

E agora a grande novidade, segundo o Estadão, é que o processo contra a presidente Dilma Rousseff será mesmo conduzido no Senado pelo ministro Ricardo Lewandowski, embora a legislação determine que o presidente do Supremo somente comande a sessão final, quando os senadores decidirão sobre a perda definitiva do mandato, vejam a que ponto pode chegar a esculhambação institucional.

O CASO DE CUNHA

Sobre o afastamento do deputado Eduardo Cunha, decidido quinta-feira pelo Supremo mediante analogia jurídica, pode-se aceitar que exista fundamento para retirar da linha sucessória da Presidência da República um cidadão que seja réu de processo criminal no Supremo. Realmente, faz sentido.

Mas acontece que Cunha ainda nem é réu, pois o acórdão do STF não foi publicado e cabe recurso. Mas o Supremo, ao invés de publicar antes o acórdão que fundamenta a decisão, decidiu atropelar os trâmites jurídicos para afastar Cunha, de maneira ilegal e sem a menor preocupação de tomar idêntica postura em relação ao senador Renan Calheiros (PMDB-AL). Aliás, o Supremo tem o hábito de manter engavetados os inquéritos a que responde o parlamentar alagoano, que recentemente foi beneficiado com a prescrição de um deles, muito antigo e que envolvia corrupção com a empreiteira Mendes Junior, notas frias e tudo o mais.

FATO CONCRETO

No rastro dessas lambanças do Supremo, ressalta um fato concreto – Cunha não foi cassado, porque isso é prerrogativa da Câmara. O tribunal apenas o afastou da presidência da Câmara e seu mandato está suspenso. Mas até quando?

A decisão está cheia de falhas e provocará uma discussão infinda. O Supremo podia até afastar o deputado da linha sucessória, porém jamais deveria atingir o mandato popular, rigidamente protegido pela Constituição que todo cidadão têm dever de acatar.

Agora, os unânimes ministros têm de se olhar ao espelho e responder a essas inquietantes questões:

1) Até quando o mandato de Cunha continuará suspenso?

2) Por acaso, será até a decisão final da Câmara sobre a cassação dele?

3) A representação popular também foi suspensa? Até quando?

4) A Câmara ficará com menos um deputado?

5) Quais são as prerrogativas de um deputado suspenso?

6) Qual a diferença entre Cunha e Renan, no tocante à linha sucessória?

7) Na próxima semana, o substituto do novo presidente Temer será Waldir Maranhão ou Renan?


INSEGURANÇA JURÍDICA

E por aí vamos, cheios de dúvidas, porque os doutos ministros, sem a menor cerimônia, estão mergulhando o país numa situação de insegurança jurídica. Parodiando o ex-presidente Lula da Silva, nunca antes, na história deste país, se viu nada igual em relação ao Supremo.

É por isso que surgem as teorias conspiratórias envolvendo a mais alta corte. A principal delas, exposta pela jornalista Eliane Cantanhêde no Estadão, dá conta de uma manobra dos ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello para impedir o impeachment presidencial. Seria um “golpe judicial”, oportunamente desfeito pelo relator Teori Zavascki, que se viu obrigado a varar a noite em claro para aceitar, na solidão da madrugada, um pedido de liminar que andava dormindo em sua gaveta.

E agora Lewandowski vai comandar ilegalmente o julgamento de Dilma Rousseff no Senado, por deferência especial do presidente do Senado, Renan Calheiros, uma situação que reforça a possibilidade da teoria conspiratória. A propósito, convém lembrar um velho provérbio romano: “Se non è vero, è ben trovato”. Em tradução livre, algo como “se não for verdade, parece ser”. E essa situação, sem dúvida, decepciona e envergonha as pessoas de bem que ainda existem neste país.



09 de maio de 2016
Carlos Newton

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